Espaço difuso é inaugurado com
mostra de trabalhos de artistas após imersão em hotel que abriga profissionais
do sexo.
Uma série de trabalhos de
diferentes linguagens e formatos – vídeo, performance, fotografia, grafite,
rádio-novela, lambe-lambes, entre outros – que estão sendo exibidos até a
próxima quarta-feira marca o lançamento oficial do Museu do Sexo das Putas, uma
iniciativa da Associação de Prostitutas de Minas Gerais (Aprosmig) contemplada
com recursos do 12º Programa Funarte de Artes Visuais.
Os trabalhos que estão sendo
apresentados resultam de uma residência que reuniu, desde o dia 12 de setembro,
no hotel Stylus, um dos muitos da região da Guaicurus que abrigam as
profissionais do sexo, dez artistas e pesquisadores. A partir dessa imersão, os
residentes desenvolveram trabalhos artísticos, especialmente por meio da
convivência com as prostitutas. Nesse sentido, tanto os trabalhos do museu
quanto sua circulação, online e física, pretendem ampliar o conceito
museológico, para que não fiquem restritos a grupos sociais mais
intelectualizados.
“O Museu do Sexo das Putas faz
parte de um processo de reinvenção do próprio caráter do museu na sociedade
contemporânea, invertendo os papéis que geralmente são designados nesses
espaços a artistas, como sujeitos, e às prostitutas, reduzidas a tema, ou como
objeto. Estamos vivendo um momento de descolonização do museu, das práticas
artísticas hierarquizadas”, destaca Camila Melchior, produtora do projeto.
Ela explica que desde sua
criação, em 2009, a Aprosmig tem sido agenciadora e colaboradora de trabalhos
desenvolvidos em muitas áreas do conhecimento e da expressão, como saúde
pública, psicologia, antropologia, estudos de gênero, fotografia e música. “Nos
últimos anos, o Carnaval e a Virada Cultural na Guaicurus têm mostrado o
potencial agregador da Aprosmig. O Museu do Sexo das Putas surge do
desdobramento dessas ações que vêm aproximando a associação de tantos outros
agentes de campos legitimados socialmente”, diz, destacando que os residentes
passaram por um processo seletivo a partir do material que enviaram em resposta
à publicação de um edital convocatório para a residência do Museu do Sexo das
Putas.
Estratégias. Uma das artistas
selecionadas, Ana Moravi ressalta a riqueza da experiência. “É uma oportunidade
ímpar, porque é um espaço onde não teríamos um trânsito mais aberto, é um
espaço onde mulheres não entram a não ser para trabalhar como profissionais do
sexo. Isso já estabelece um caráter privilegiado de entendimento do lugar.
Morar no Stylus permitiu conhecer de forma mais aprofundada as relações que se
estabelecem ali. Nos interessou a forma como essas mulheres criam estratégias
para driblar o estigma que existe”, diz. Ela aponta que cada residente adotou
um modo particular para lidar com aquele contexto e criar sua obra.
Junto com a inauguração do Museu
do Sexo das Putas, foi lançado um abaixo-assinado que pleiteia a transformação
da região em patrimônio imaterial da cidade. Historiadora entre os artistas
residentes, Beatriz Brusantin se ocupou de fazer um levantamento de dados sobre
a zona boêmia de BH. Ela destaca a importância do título. “Existe essa proposta
de fazer o registro como patrimônio imaterial da rua, como lugar que traz uma
memória, traz a história da cidade. Ali na Guaicurus tem a questão relativa aos
hotéis, às pessoas que trabalham neles, enfim, a todo um contexto”, aponta,
destacando que, no período que empreendeu sua pesquisa, praticamente não
encontrou documentos relativos à Guaicurus. “Isso mostra que a história da
Guaicurus está praticamente só na oralidade. É uma rua muito importante, que,
apesar do estigma, não é uma coisa periférica, liga a rodoviária à praça da
Estação. A história da rua tem a ver com a história da cidade e com a história
da prostituição”, diz.
Êxito na ação da Aprosmig
Cida Vieira, presidente da
Aprosmig, ressalta a importância da criação do museu como a consolidação de um
trabalho que já vem sendo feito há alguns anos. “É a primeira vez que a Funarte
reconhece um trabalho de associação de prostitutas em nível nacional. Tem os
debates, toda a questão do histórico social, que tem tudo a ver com a arte, a cultura,
com o espaço, que já é um patrimônio imaterial, faltando apenas o registro. É o
nosso reconhecimento enquanto pessoas, mulheres, artistas. A criação do museu
contribui para acabar com o estigma, e contribui para abrir um diálogo sobre a
autonomia das mulheres que trabalham com isso”, aponta. Está no ar o site da
entidade, museudasputas.wixsite.com/museu.
Museu do Sexo
Quando: 7 a 12 de outubro
Onde: Rua Guaicurus, Benfeitoria,
centoequatro e Teatro Espanca, em Belo Horizonte, MG
Quanto: Gratuito
Programação completa:
http://museudasputas.wixsite.com/museu/programacao
Classificação etária: 14 anos
Fonte: O Tempo
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