Andar pelas instalações da Linha 4-Amarela do Metrô e se deparar
com uma mulher entre os funcionários da manutenção virou rotina na ViaQuatro.
Hoje, a equipe de agentes de atendimento e manutenção conta com 17 mulheres que
trabalham em campo, desempenhando funções técnicas. O número pode parecer
pequeno a princípio, porém, reflete uma nova etapa na ocupação de espaços pela
força de trabalho feminina e na postura das empresas.
Formada no curso técnico de sistemas eletroeletrônicos,
cinco anos atrás, Roberta Lima passou quase dois anos desempregada. Nesse
período, participou de diversos processos seletivos porém, não conseguiu
nenhuma vaga. Das empresas ela ouvia sempre a mesma justificativa. A de que não
havia estrutura (vestiários e banheiros femininos) para contratar uma mulher
para a equipe de manutenção. Ela conta que em uma empresa onde estagiou tinha
de atravessar uma planta inteira só para ir ao banheiro. Hoje, ela atua na área
de manutenção da ViaQuatro, realizando análises de vibração eletroeletrônica e
termologia dos equipamentos das estações.
Situação semelhante viveu Gardênia Freire, também
funcionária da concessionária, quando dez anos atrás se tornou a primeira
eletricista de manutenção em uma siderúrgica, em Cubatão. Ela conta que nem
vestiários e nem uniformes para mulheres existiam na época. “Naquele tempo
mulher só entrava na fábrica para fazer faxina”, lembra ela, que se orgulha de
realizar todo tipo de serviço ligado à sua área (manutenção de equipamentos
eletromecânicos). “Eu subo em andaime, faço toda atividade pesada que for
necessária. Mulher pode fazer qualquer coisa”, diz.
Com planos de cursar engenharia, Gardênia enxerga mais
espaço para as mulheres em atividades onde hoje predomina a presença de homens.
“Cada vez mais as mulheres percebem que podem desempenhar
essas funções e vão ao mercado em busca dessas oportunidades”, diz a gerente de
Recursos Humanos da ViaQuatro, Cristiane Adad. Ela conta que a empresa sempre
pensou na presença feminina. Por isso, a estrutura física, a disponibilidade de
uniformes e equipamentos não foi problema. “Queremos essa diversidade em nosso
quadro, pois a mulher agrega suavidade ao ambiente, além de ser mais atenta aos
detalhes”, diz.
A indústria também passa por essa transição na visão do
diretor de operações do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai),
Gustavo Leal.
Segundo ele, nos últimos anos a presença feminina nas salas
de aula em cursos nas áreas automotiva, de mineração, petróleo e gás tem
crescido. “A industria é cada vez mais demandante de um perfil tecnológico,
mais robusto em termos de conhecimento. Então a seleção é o nível de
conhecimento e não pelo gênero”, afirma. Ele frisa que a adoção de novas
tecnologias nas unidades tornou o chão de fábrica mais moderno, dispensando a
força física.
“Vejo isso como uma evolução natural. E as empresas não
estão abrindo esse espaço por simbolismo, mas porque elas enxergam que essa
inclusão gera resultados”, diz a gerente geral da Refinaria Henrique Lage
(Revap), unidade da Petrobrás em São José dos Campos, Elza Kallas, primeira
mulher a ocupar um cargo deste porte na empresa. Formada em engenharia química
ela ingressou na Petrobrás 29 anos atrás e foi atuar na área de exploração de
petróleo, campo predominantemente masculina. Ela conta que durante toda
carreira na empresa teve de conviver com a realidade de ser a única mulher, e
que isso nunca a incomodou (apesar da falta de estrutura nas plantas). Mas
ressalta que hoje, devido a um programa criado pela empresa para promover a
equidade de gêneros nas plantas (veja abaixo) a situação está muito mais
favorável ao público feminino.
“A participação feminina, com seu estilo de ser mais
ponderado, detalhista, sensível se soma ao estilo masculino e isso é bom para a
empresa. Ter um quadro composto só por homens, com um único estilo, um único
pensamento torna a empresa pobre. Estamos em busca desse alinhamento”, diz a
gerente. Ela ressalta que agora, depois de firmar sua presença na área técnica,
a mulher precisa é buscar compartilhar mais espaço nos processos decisórios.
Na Petrobras público
feminino dobrou
De 2003 para cá a Petrobrás mais que dobrou a quantidade de
mulheres em seu quadro de funcionários. Hoje o público feminino corresponde por
15,3% (9.041 funcionárias) do efetivo total da empresa. “Ainda somos minoria,
mas em termos relativos, a presença feminina por aqui cresceu 105% nos últimos
oito anos, ao passo que a taxa de crescimento relativo da força de trabalho
masculina, de 56,1%”, diz a gerente de Orientações e Práticas de
Responsabilidade Social da empresa, Janice Dias. Segundo ela, o crescimento é
fruto de um programa criado para promover a equidade de gêneros dentro da
companhia, criado há nove anos. Ao longo deste período Janice Conta que
diversas ações foram tomadas no intuito de permitir a presença de mulheres em
todas as unidades de exploração da empresa.
Além da adequação das estruturas contemplando a presença
feminina (com a instalação de alojamentos e banheiros) a empresa também criou
uma normatização específica para uniformes (com a criação de uma tabela de
medidas adequada ao corpo da mulher) e também dos equipamentos de proteção
individual (EPI). “A cada período vamos aprofundando a discussão sobre o tema”,
conta Janice. Além da adequação das condições de trabalho o programa também
visa a discutir assuntos como capacitação, cargos, salários.
“O mercado já compreendeu que a diversidade agrega sabedoria
e consequentemente valor. As mulheres passam a se compreender como sujeitos de
direito dessas posições e querendo ocupar esses espaços”, diz Janice que nota
uma crescente na quantidade de mulheres se candidatando às seleções públicas
anuais realizadas pela empresa.
Para a gerente, no entanto, ainda há um longo caminho a ser
trilhado para que determinadas funções nas organizações deixem de ter o estigma
de ‘coisa de homem’. Na visão de Janice as raízes da questão são profundas e
extrapolam os limites das companhias. “Essa associação dos gêneros a
determinadas carreiras é reflexo de uma cultura sexista. É claro que hoje a
mulher está em outro patamar, é claro que houve evolução. Mas ao entrar num
site para comprar um brinquedo você ainda tem o helicóptero descrito como algo
para meninos. E desde criança as meninas são orientadas a gostarem de bonecas.
Ou seja, a família, a escola e o mercado são sexistas”, conclui Janice, dizendo
que essa inclusão não depende apenas das empresas mas de políticas públicas e
mobilização por parte da sociedade./L.C.
Cresce a procura por cursos
De olho nas oportunidades de trabalho com o crescimento da
indústria naval Maria Aparecida Silva Santos se matriculou no curso técnico de
construção naval. Ao conhecer um pouco mais sobre o mercado se matriculou em
mais dois cursos para se especializar em soldagem de tubulações navais e
inspeção de soldas (estudou em Itajaí – SC). Agora, busca oportunidades nos
estaleiros da região sul.
Sobre ter escolhido seguir carreira em um setor amplamente
dominado por homens ela diz que se guia pela satisfação profissional e que vê o
mercado menos resistente ao ingressos de mulheres. “Os estaleiros já estão
mudando de postura, alguns até já me procuraram”,diz.
Assim como Maria muitas mulheres têm procurado os cursos
oferecidos pelo Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai) e que até
pouco tempo eram frequentados unicamente por homens. “A noção de que o mercado
está mais aberto à elas faz com que as mulheres se sintam motivadas a buscar
essas formações”, diz o diretor de operações da entidade, Gustavo Leal.
De acordo com ele, entre 2009 e 2011 o número de mulheres
matriculadas cresceu em diversos cursos, como o de mineração, onde o porcentual
de mulheres já chega a 27%. Nos cursos ligados à construção 18% do total de
alunos são mulheres. Nesse sentido, segundo Leal destacam-se também os setores
de Petróleo e gás (13%) e eletroeletrônica (11%), onde a presença feminina nas
salas de aula era praticamente inexistente. \L.C.
Leandro Costa
Fonte: O Estadão
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