terça-feira, 1 de março de 2011

Uma em 4 mulheres relata maus-tratos durante parto


Agressões vão de exames dolorosos a xingamentos e gritos; secretário diz que situação é intolerável



Chorando em um hospital, agulhada pelas dores das contrações do parto, mulheres brasileiras ainda têm de ouvir maus-tratos verbais como: ``Na hora de fazer não chorou, não chamou a mamãe. Por que tá chorando agora?``; ou ``Não chora não que no ano que vem você está aqui de novo``; ou ainda ``Se gritar, eu paro agora o que estou fazendo e não te atendo mais``.

Uma em cada quatro mulheres que deram à luz em hospitais públicos ou privados relatou algum tipo de agressão no parto, perpretada por profissionais de saúde que deveriam acolhê-la e zelar por seu bem-estar.

São agressões que vão da recusa em oferecer algum alívio para a dor, xingamentos, realização de exames dolorosos e contraindicados até ironias, gritos e tratamentos grosseiros com viés discriminatório quanto a classe social ou cor da pele.

Os dados integram o estudo ``Mulheres brasileiras e gênero nos espaços público e privado``, realizado em agosto de 2010 pela Fundação Perseu Abramo e pelo Sesc e divulgado agora.

A Folha obteve com exclusividade o capítulo ``Violência no Parto``, que pela primeira vez quantificou à escala nacional, a partir de entrevistas em 25 unidades da Federação e em 176 municípios, a incidência dos maus-tratos contra parturientes.

Coordenado pelo sociólogo Gustavo Venturi, professor da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP, o estudo constatou uma situação que Janaina Marques de Aguiar, doutora pela Faculdade de Medicina da USP, já tinha captado em estudos qualitativos. ``Quanto mais jovem, mais escura, mais pobre, maior a violência no parto.``

O estudo mostra, por exemplo, que as queixas são mais frequentes no caso de o local do parto ser a rede pública, com 27% das mulheres reportando alguma forma de violência. Em 2009, foram quase 2 milhões de partos feitos nas unidades do Sistema Único de Saúde. Quando a mulher dá à luz em um serviço privado, as queixas caem a 17%.

Ressalta no estudo a diferença de tratamento em municípios pequenos, médios e grandes. Quanto maior o município, maior a incidência de queixas.

Segundo Sonia Nussenzweig Hotimsky, docente da Escola de Sociologia e Política de São Paulo, a diferença pode ser atribuída à ``industrialização`` do parto nos grandes hospitais. ``Em uma cidade pequena, as pessoas acabam se conhecendo e o tratamento tende a ser mais humanizado``.

Desde 2004, o Ministério da Saúde tem entre suas prioridades a humanização do parto. Mesmo assim, até hoje não conseguiu nem sequer universalizar o direito das parturientes a um acompanhante de sua confiança, conforme lei de 2005.

Segundo Helvécio Magalhães Jr., secretário de Atenção à Saúde do ministério, a situação ``é intolerável``. Segundo ele, ``a humanização do parto está no centro da política de saúde do governo``. Sobre a lei do acompanhante, o secretário diz que é essencial seu cumprimento até para ``coibir os abusos``.

Fonte:  Folha de S.Paulo

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