Acolher a Deus no nosso interior
quer dizer pelo menos duas coisas. A primeira: não colocar Deus sempre longe e
fora de nós, quer dizer, aprender a escutá-lo no silêncio do coração. A
segunda: descer Deus da nossa cabeça até ao profundo do nosso ser, quer dizer,
deixar de pensar em Deus só com a mente e aprender a percebê-Lo no mais íntimo
de nós.
A leitura que a Igreja propõe
neste domingo é o Evangelho segundo João capítulo 20, 19-23 que corresponde ao Domingo
da Pentecostes, ciclo A do Ano Litúrgico. O teólogo espanhol José Antonio
Pagola comenta o texto.
Há alguns anos, o grande teólogo
alemão Karl Rahner atrevia-se a afirmar que o principal e mais urgente problema
da Igreja do nosso tempo era a sua «mediocridade espiritual». Estas eram as
suas palavras: o verdadeiro problema da Igreja é «continuar com uma resignação
e um tédio cada vez maior pelos caminhos habituais de uma mediocridade
espiritual».
O problema tem-se agravado nestas
últimas décadas. De pouco serviram as tentativas de reforçar as instituições,
salvaguardar a liturgia ou vigiar a ortodoxia. No coração de muitos cristãos,
está-se a apagar a experiência interior de Deus.
A sociedade moderna apostou no
«exterior». Tudo nos convida a viver desde fora. Tudo nos pressiona para nos
movermos depressa, sem pararmos em nada nem em ninguém. A paz já não encontra
resquícios para penetrar até ao nosso coração. Vivemos quase sempre na crosta
exterior da vida. Estamos a esquecer o que é saborear a vida a partir de
dentro. Para ser humana, à nossa vida falta-lhe hoje uma dimensão essencial: a
interioridade.
É triste observar que tampouco
nas comunidades cristãs sabemos cuidar e promover a vida interior. Muitos não
sabem o que é o silêncio do coração, não se ensina a viver a fé desde dentro.
Privados de experiência interior, sobrevivemos esquecendo a nossa alma:
escutando palavras com os ouvidos e pronunciando orações com os lábios enquanto
o nosso coração está ausente.
Na Igreja, fala-se muito de Deus,
mas, onde e quando escutamos, os crentes, a presença silenciosa de Deus no mais
fundo do coração? Onde e quando acolhemos o Espírito do Ressuscitado no nosso
interior? Quando vivemos em comunhão com o Mistério de Deus desde dentro?
Acolher a Deus no nosso interior
quer dizer pelo menos duas coisas. A primeira: não colocar Deus sempre longe e
fora de nós, quer dizer, aprender a escutá-lo no silêncio do coração. A
segunda: descer Deus da nossa cabeça até ao profundo do nosso ser, quer dizer,
deixar de pensar em Deus só com a mente e aprender a percebê-Lo no mais íntimo
de nós.
Esta experiência interior de
Deus, real e concreta, pode transformar a nossa fé. Surpreendemo-nos de como
temos podido viver sem descobri-la antes. É possível encontrar Deus dentro de
nós no meio de uma cultura secularizada. É possível também hoje conhecer uma
alegria interior nova e diferente. Mas parece-me muito difícil manter por muito
tempo a fé em Deus no meio da agitação e frivolidade da vida moderna sem
conhecer, mesmo que seja de forma humilde e simples, alguma experiência
interior do Mistério de Deus.
Fonte: Ihu
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