sexta-feira, 15 de março de 2013

‘Tirar a criança da exploração sexual não resolve o problema; é preciso ter apoio’


"Muitas vezes as pessoas acham que a ação de tirar uma criança da exploração resolve tudo, mas essa criança precisa ser apoiada, precisa ter um apoio terapêutico, precisa ter um acompanhamento, precisa reorganizar a sua vida, precisa aprender a se expressar, a gostar de si mesma, ou seja, tem todo um trabalho focado na subjetividade da criança". 


Participante do Seminário "Adolescentes e Jovens conectad@s por uma Copa sem violência sexual”, que começou hoje (11) em Olinda, Pernambuco, Mario Volpi, que há 12 anos está à frente de projetos e do Programa de Cidadania dos Adolescentes do UNICEF Brasil (Fundo das Nações Unidas para a Infância) conversou com a AgênciaAdital e falou sobre como o organismo da Organização das Nações Unidas (ONU) atua no enfrentamento da violência sexual infanto-juvenil.

Ele disse que o Unicef tem apoiado os municípios a desenvolverem políticas tanto de prevenção quanto de atendimento às crianças e adolescentes, e citou a importância de trabalhar a proteção das vítimas, a responsabilização do agressor e o fortalecimento da participação e mobilização dos jovens na conscientização para sua própria autoproteção.

O Seminário é uma realização da Rede Ecpat Brasil, do Comitê Nacional de Enfrentamento à Violência Sexual Contra Crianças e Adolescentes e Coletivo Mulher Vida e segue até amanhã (12). Confira a entrevista:

ADITAL – Como o Unicef tem acompanhado esse processo de enfrentamento à violência sexual contra crianças e adolescentes?

Mario Volpi – O tema do enfrentamento à exploração sexual no Unicef sempre foi conduzido de forma a trabalhar com três aspectos. O primeiro é a proteção da criança. Muitas vezes as pessoas acham que a ação de tirar uma criança da exploração resolve tudo, mas essa criança precisa ser apoiada, precisa ter um apoio terapêutico, precisa ter um acompanhamento, precisa reorganizar a sua vida, precisa aprender a se expressar, a gostar de si mesma, ou seja, tem todo um trabalho focado na subjetividade da criança que é muito importante que os programas, as políticas públicas, os projetos aperfeiçoem, e esse é um tema que sempre preocupa muito o Unicef porque tem a ver com o desenvolvimento integral da criança. Um segundo conjunto de questões é a responsabilização do agressor, isso também é um tema que envolve todo um sistema de justiça, a responsabilização do agressor é um passo para enfrentar o tema da impunidade, ele é um passo importante porque sem a responsabilização você naturaliza isso, essa questão, e tem até uma certa tendência das pessoas de dizer que o cara [agressor] é um doente, um animal, querendo excluir da sociedade humana aquela pessoa como se fosse um caso isolado, como se não fosse um ser humano e ele é, ele precisa ser responsabilizado, ele precisa responder juridicamente e socialmente pelo crime que ele cometeu. E um terceiro campo é de fazer um trabalho de fortalecimento da participação, da presença, de ouvir a voz dos adolescentes, das crianças no trabalho de prevenção e de conhecimento do próprio corpo, dos próprios limites pra criança também e para o adolescente saber se proteger. Então, são três campos de atuação que ajudam a posicionar a criança no centro deste processo, tanto pra ser apoiada, pra ser assistida, quanto pra serem sujeitos pra ser aquela que faz a prevenção, que faz os projetos de educação entre pais e adolescentes, dialogando com adolescentes, então é nesse universo que a gente situa a atuação do Unicef nesse tema.

ADITAL – Quantos projetos no Brasil vocês apoiam de alguma forma nessa área?

Mario Volpi – Na verdade a gente não tem apoiado projetos isoladamente, nós temos apoiado muito os municípios a desenvolverem políticas tanto de prevenção quanto de atendimento. Eu acho que depois da aprovação do Estatuto (da Criança e do Adolescente) em 1990, e passados já esses 23 anos, o Brasil constituiu uma rede de serviços. Hoje nós temos um sistema único da assistência social, com serviços especializados inclusive para a proteção da criança, então a ideia é muito mais fortalecer esses serviços para que o Estado cumpra o seu papel, e o apoio a projetos, alguns projetos que a gente apoia no país, a perspectiva é a de mostrar que é possível produzir novas abordagens, novas metodologias, inovar, mas, o mais importante é que esses projetos têm um caráter mais pedagógico de educar a sociedade de que é possível enfrentar esse tema e também demonstrar para o governo que existem soluções. Mas a solução passa mesmo pelos serviços de saúde mental, serviços de assistência social e para uma grande tarefa educativa que está no sistema de ensino do país que precisa incorporar esses temas no conjunto de conteúdos e materiais que se aprende na escola.

ADITAL – Vocês estão apoiando esse Seminário. Vocês acompanharam ou estão acompanhando a Campanha ANA?

Mario Volpi – Eu acho que esse tema aqui é muito importante, nós apoiamos e achamos extraordinária essa ideia de os próprios jovens estarem se mobilizando para criar uma consciência sobre a necessidade de a gente prevenir processos de exploração sexual antes que eles aconteçam, que é essa ideia de que todo mundo sabe que em espaço de grande circulação de pessoas, de grandes obras que o país está desenvolvendo dos grandes eventos. Essa grande mobilização de pessoas cria um espaço mais propício para a exploração sexual, para a exploração do trabalho infantil e essa iniciativa da ANA de fazer esse trabalho de mobilizar os próprios adolescentes, chamar a atenção do governo, criar os mecanismos de proteção, capacitar os conselhos tutelares para atuarem de uma forma específica nesse momento, criar um fluxo de procedimentos dentro do Executivo, do Legislativo, do Judiciário, de todo o sistema de garantias, acho que essa é uma tarefa muito importante, e esse encontro de hoje aqui vem sistematizar todo esse trabalho que vem sendo feito. Acho que agora aqui é a oportunidade de a gente dizer o que já está pronto para esses grandes evento e o que falta ainda resolver e aqui discutir as soluções para esses temas que ainda precisam ser abordados.

Fonte: Adital

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