quarta-feira, 20 de abril de 2011

A última ceia: o amor é uma força criadora

Carlos Mesters, Mercedes Lopes, Orofino 



1. Situando o texto


a) Os capítulos 24 e 25 do Evangelho de Mateus apresentaram o quinto e último Sermão da Nova Lei de Deus. Os capítulos 26 a 28 descrevem a sua promulgação. De fato, desde o Sermão da Montanha, inúmeras vezes, Mateus já vinha afirmando que o objetivo da Nova Lei é o amor e a misericórdia (Mt 5,43-48; 7,12; 9,13; 12,7; 22,34-40). Agora, nesta parte final dos capítulos 26 a 28 que narram a paixão, morte e ressurreição, ele descreve como Jesus praticou o amor, levando a Lei ao seu pleno cumprimento (Mt 5,17).

b) A descrição da paixão de Jesus acentua o fracasso dos discípulos. Apesar da convivência de três anos, nenhum deles ficou para tomar a defesa de Jesus. Judas traiu, Pedro negou, todos fugiram. Mateus conta isto, não para criticar ou condenar, nem para provocar desânimo nos leitores, mas para ressaltar que o acolhimento e o amor de Jesus superam a derrota e o fracasso dos discípulos! Esta maneira de descrever a atitude de Jesus era uma ajuda para as Comunidades. Por causa das frequentes perseguições, muitos tinham desanimado e abandonado a comunidade e se perguntavam: “Será que é possível voltar? Será que Deus nos acolhe e perdoa?” Mateus responde sugerindo que nós podemos romper com Jesus, mas Jesus nunca rompe conosco. O seu amor é maior que a nossa infidelidade.


2. Comentando o texto

a) Mateus 26,20-25: Anúncio da traição de Judas

Jesus sabe que vai ser traído. Mesmo assim, faz questão de se confraternizar com os amigos e as amigas. Estando reunido com eles pela última vez, anuncia quem é o traidor. E “aquele que põe a mão no prato comigo”. Este jeito de contar as coisas acentua o contraste, pois para os judeus a comunhão de mesa, comer juntos do mesmo prato, era a expressão máxima da amizade, da intimidade e da confiança. Mateus sugere assim que, apesar de a traição ser feita por alguém muito amigo, o amor de Jesus é maior que a traição!

b) Mateus 26,26-29: A instituição da Eucaristia

O encontro de Jesus com os discípulos realiza-se no ambiente solene da celebração da Páscoa. Eles estão reunidos para comer o cordeiro pascal e, assim, lembrar a libertação do Egito. O contraste é grande. De um lado, os discípulos: eles estão inseguros, sem entender nada. De outro lado, Jesus que faz um gesto de partilha, convidando os amigos a tomar o seu corpo e o seu sangue. Ele distribui o pão e o vinho como expressão do que ele mesmo está vivendo naquele momento: doar sua vida pelos outros, para que possam viver. Este é o sentido da Eucaristia: aprender de Jesus a se doar e a se entregar, sem medo dos poderes que ameaçam a vida. Mateus acentua ainda mais o contraste entre Jesus e a atitude dos discípulos. Antes do gesto de Jesus, ele colocou a traição de Judas (Mt 25,20-25). Depois do gesto, a negação de Pedro e a fuga dos discípulos (Mt 25,30-35). Deste modo, destaca para todos nós a inacreditável gratuidade do amor de Jesus, que supera a traição, a negação e a fuga dos amigos. O seu amor não depende do que os outros fazem por ele.

c) Mateus 26,30-35: O anúncio da fuga de todos

Terminada a ceia, saindo com os amigos para o Horto, Jesus anuncia que todos vão abandoná-lo. Vão fugir e se dispersar! Mas desde já ele avisa: “Depois da ressurrei­ção, vou na frente de vocês lá na Galiléia! “Simão, que tem o apelido de Cefas ou Pedro (pedra) e que já foi pedra de tropeço para Jesus (Mc 8,33), agora pretende ser ó discípulo mais fiel de todos. “Ainda que todos se escandalizem, eu não o farei!” Mas Jesus avisa: “Pedro, você será mais rápido na negação do que o galo no canto!” De fato, os discípulos vão romper com Jesus, mas Jesus não rompe com eles! Ele continua esperando por eles lá na Galiléia, isto é, no mesmo lugar onde, três anos antes, os tinha chamado pela primeira vez. A certeza da presença de Jesus na vida do discípulo e da discípula é mais forte do que o abandono e a fuga! O retorno é sempre possível. Jesus continua chamando. Chama sempre!


3. Alargando: O corpo e o sangue do meu Senhor são força viva de paz

Jesus toma o pão e diz: “Tomai e comei, isto é o meu corpo!” Toma o cálice bom vinho e diz: ‘ ‘Isto é o meu sangue, o sangue da Aliança, que é derramado por muitos para remissão dos pecados!” Pão! Corpo! Cálice! Sangue! Aliança! Remissão dos pecados! O pão é símbolo da Lei. Nós dizemos até hoje “o pão da palavra”. O corpo indica a própria pessoa de Jesus que se entrega. O cálice é símbolo do sofrimento da paixão (Mt 20,22). O sangue indica a pessoa de Jesus enquanto é entregue numa morte violenta. A aliança é o compromisso entre Deus e o povo, agora confirmado pelo sangue de Jesus. A remissão dos pecados é a entrega por amor que liberta as pessoas do pecado. Em resumo, Jesus é a Nova Lei. O seu amor, a sua doação e entrega revelam o objetivo da Lei de Deus. Comer o pão da Eucaristia significa assimilar em nós a mesma atitude de doação. E Jesus termina dizendo que não vai beber mais do fruto da videira até o dia em que beberá o vinho novo no Reino do Pai. O vinho novo é o amor que se bebe com os irmãos na vida das comunidades.

O texto  é extraído do livro Travessia: quero misericórdia e não sacrifício, de Carlos Mesters, Mercedes Lopes e Francisco Orofino.
Fonte: http://www.cebi.org.br/

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