quinta-feira, 28 de abril de 2011

Eu tenho um nome e me chamo MULHER

Fernanda Priscila Alves da Silva*


Era tarde de março… Mais um encontro para acontecer. Mulheres chegando e adentrando a casa, trocando olhares, trocando sabores e cheiros.
Era tarde de março e havia um tema proposto: Importância e significado do próprio nome na história.
O encontro iniciou com a acolhida de sempre e sentindo-se em casa cada mulher foi convidada a dizer seu nome em voz alta e falar de si mesma. Eu me chamo… Eu sou Mulher. O tom era firme e forte. Mulheres tomando a palavra. Mulheres fazendo outros corpos sentirem sair de si um força estranha, uma força geradora de vida. Força esta que um dia Jesus mesmo sentiu em seu corpo ao ser tocado por aquela mulher que há doze anos sofria de uma hemorragia que não a deixava viver.

Ditas as palavras, cada uma das mulheres presentes naquela tarde de março foi convidada a desenhar seu próprio nome. Desenhar, rabiscar, contornar… E assim, cada uma das mulheres desenhou seu próprio nome e em seguida compartilhou com as outras o sentido e significado do mesmo. Desse modo, se ia formando com os nomes das mulheres a palavra MULHER. Ser Mulher e ter um nome… Algo de um significado especial para aquelas mulheres da batalha. Elas que muitas vezes ocultam seus nomes, o proclamavam naquela tarde com a força de SER MULHER.

Aos poucos o grupo foi tomando a palavra, ou seja, tomar a palavra enquanto MULHER ganhou outro contorno. De mãos dadas as mulheres escutaram e meditaram o texto de Jo 20, 11-16, aonde mostra Jesus chamando Maria pelo nome e assim pelo tom de voz se reconhece quem se chama.

Pelo tom de voz se identifica quem chama e como chama esta foi a reflexão e partilha das mulheres. Uma delas dizia: “Quando ele chegava lá em casa daquele jeito eu já sabia, ele tinha bebido e aquela voz me incomodava… era horrível. Mas chegou um dia que eu não quis mais ouvir aquele tom de voz. Então eu falei: Chega!!!” (sic). Outra mulher refletiu: “Mas tem voz boa também. Jesus chama Maria com força e é por causa do amor que ela reconhece ele.” (sic). À medida que as mulheres iam falando a rede ia sendo tecida, ou melhor, a vida sendo costurada, interligada ao som de vozes e lembranças. Em meio às partilhas uma mulher gritou: Eu tenho um nome e me chamo Mulher. Em seguida todas as mulheres aplaudiram concordando e repetiram: Eu tenho um nome e me chamo MULHER.

Era tarde de março e no encontro com Madalena, a beira do túmulo, tendo coragem de olhar lá dentro cada mulher pôde de novo se encontrar consigo mesma e assim encontrando consigo mesma se encontrava com a outra. Mulheres tomam a palavra enquanto a Palavra recria vida.

O encontro foi terminando, mas ao mesmo tempo dando continuidade. A força criadora da Palavra continuaria fortalecendo a vida e assim poetizando com Madalena seguiremos cantando:

Maria, minha irmã Venho nesta manhã contigo bendizer

A vida que renasce, o sonho que permanece

A luta, a utopia que não se deixa morrer

Quero também eu inclinar-me

Quero também ter coragem de abaixar

Perceber que é possível o túmulo olhar

assim então em ti Senhor abandonar-me


Quero correr os campos

Atravessar as montanhas,

Banhar-me em teus rios

Enxugar meu pranto

Escutar meu nome pronunciado

Vem comigo então Maria

Vem e ensina-me

Mostra-me tua coragem

Pois desejo também eu amar como tu amas

Desejo também percorrer as vinhas

Saltar as janelas para encontrar-me com o Amado


Desejo escutá-lo…

Ouvir a voz do jardineiro: do Deus cuidador

Àquele que toca minhas raízes

E aprofunda meu ser em tuas terras

Meu Deus, Meu Amado, Meu Redentor

Eis que estou aqui minha companheira

Minha querida Madalena

Também quero escutá-lo a pronunciar meu nome

E assim reconhecê-lo

E assim voltar-me-ei aos campos

A bendizer e proclamar

Que também eu vi o Senhor

Também eu senti teu amor

* Fernanda Priscila é integrante do projeto Força Feminina e acompanha profissionais do sexo em Salvador/BA. É autora do livro Estações do Crer.

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