Uma das coisas mais maravilhosas
do machismo é que ele possui diversas roupas adequadas a cada ocasião. O
machismo descarado dos vestiários pós futebol não se manifesta da mesma maneira
que o machismo hipster de óculos de aro grosso e barras de calças dobradas
chamando as mulheres de falsianes e periguetes, que não se manifesta da mesma
maneira que o machismo institucional, engravatado que a pretexto de nos
proteger nos silencia e invisibiliza.
por Renata Correa no Medium
Essa semana aconteceram três
casos muito emblemáticos desse machismo pós moderno, maroto, sem medo de se
mostrar, com orgulho de ser o que é. O neo machismo de olho nos avanços das
mulheres se armou com conhecimento adquirido em assessorias de imprensa, profissionais
de gerenciamento de crise e pasmem, no próprio feminismo para poderem sair de
miúda, desembaraçadamente depois de se exibir desavergonhadamente. Em comum
entre os três casos, mulheres em posição de destaque, que possuem conhecimento
empírico, técnico, científico, jurídico ou artístico sobre um assunto e foram
desqualificadas por homens que acharam que a opinião delas não era tão
importante assim.
Como diria minha vó:
Comigo não, violão.
Vamos aos casos.
O machismo “fofucho-delusional”
de Dado Dolabela
O fofucho proto ator, agressor
condenado de mulheres se tornou vegan. E claro, argumentou que agredir mulheres
não é tão ruim assim — pior mesmo é matar bichinhos. A discussão rolou e teve
como antagonistas do nosso gênio da raça a fotógrafa e ativista Renata Penna e
a advogada da Ong Artêmis, Ana Lucia Keneucke.
Com certeza todas as minhas
amigas veganas e feministas que pensam politicamente veganismo, leram A
Política Sexual da Carne e lutam contra todo tipo de violência e especismo
estão abrindo uma exceção para fazer um espetinho com a língua do Dado
Dolabella.
Como cereja do bolo o rapaz se
declara feminista e diz que quer fazer um longa contra cesáreas desnecessárias.
O machismo “a classe artística me
perdoa” de Lirio Ferreira e Claudio Assis
Os dois cineastas Pernambucanos
são incensados pela crítica, e com razão: dirigiram filmes importantes e
emblemáticos. Como homens e artistas eles possuem espaço o suficiente para
falar, dar sua opinião sobre o mundo, o mercado cinematográfico, a política nacional,
o preço do tomate ou quem pode ou não pode usar calça saruel.
Porém, não satisfeitos com a sua
posição de privilégio eles resolveram que o lugar mais adequado para brilhar
era no debate do filme “Que Horas Ela Volta?” da diretora Anna Muylaert. Relatos
contam que Claudio Assis impediu Anna de sentar na cadeira destinada a ela, e
que Lirio impedia aos gritos a plateia de interagir com a diretora.
Hoje já existe um mimimi no meio
audiovisual passando um pano pros rapazes, defendendo o bom humor, o caráter
folclórico das personalidades de ambos e colocando a deseducação na conta do
álcool. Mas o nome disso não é bom humor ou folclore, é machismo mesmo.
O Patriarcado opera com a lógica
de que uma metade da população deve estar subjugada para que outra excerça
privilegios. Encerrar mulheres em casa, negar o direito a participação na vida
publica, enfiar o mito do amor e do casamento goela abaixo para que nós,
quietas possamos trabalhar gratuitamente cuidandos dos filhos, cozinhando a
comida, lavando as cuecas. É claro que o mundo mudou. Não estamos mais
exatamente nessa posição literal, principalmente nós mulheres de classe média,
trabalhadoras, intelectuais. Mas simbolicamente ainda estamos. E os homens não
perdoam. Não perdoam o fato de termos algo a dizer, como se nossas conquitas
fossem uma concessão.
Com a palavra a própria Anna
Muylaert:
“Eles estavam bastante
alcoolizados. Agiram de maneira intantil e boba, numa atitude de egolatria
comum aos homens. Quando viram uma mulher em evidência, precisaram atrapalhar o
momento. O machismo é um tema levantado recorrentemente em todos os lugares que
frequento. Em países da Europa, em várias cidades do Brasil que tenho visitado,
o assunto sempre vem à tona. As mulheres não aguentam mais. Estamos todas por
um fio”.
Estamos mesmo, Anna.
O machismo “gerenciamento de
crise bem assessorada” do Jovem Nerd
Perseguição, bullying e
linchamento virtual fizeram com que Laura Buu encerrasse as atividades do seu
blog (maravilhoso) de cultura nerd e pop, o Pink Vader. Toda movimentação
aconteceu promovida pelo Jovem Nerd, que jogou seguidores sem dó em cima da
blogueira e não se responsabilizou por nada do que aconteceu.
Dois anos depois Laura recebe um
pedido de desculpas que mais vitimiza os agressores do que repara ou toma para
si a responsabilidade com o acontecido. Linchamento virtual é coisa séria e já
vimos meninas e mulheres com suas vidas e integridades físicas e emocionais em
risco por conta desse comportamento de manada do macho que não se conforma que
uma mulher tem opinião.
Muita gente veio me falar: mas
ele se DESCULPOU.
Desculpar-se é o default de
qualquer personalidade pública minimamente informada e assessorada — não
significa mudança de postura na prática do dia a dia, coisa que só poderá ser
avaliada e medida com o tempo e mesmo assim sem poder ser comparada com a
extensão do dano causado.
Ficam aqui meus votos para que o
feminismo consiga ser tão criativo para empoderar e proteger mulheres quanto a
diversidade das máscaras e manifestações machistas é eficiente para nos chamar
de loucas que não entendem nada a respeito de boas intenções de machos de bem.
Afinal, quem somos nós para nos manifestar contra almas tão iluminadas?
Fonte: Geledes
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