terça-feira, 4 de agosto de 2015

O abuso dos “encoxadores”

O Disque 100 é um serviço nacional que recebe denúncias de violência sexual.
“Estava no parque de diversões tentando comprar um lanche e um homem estava encostando em mim. Eu tentava me afastar, mas não conseguia, pois tinha muita gente. Olhei para trás e vi que ele estava encostando o pênis. Eu o empurrei com força e ele caiu no chão me chamando de louca”. O caso aconteceu no parque Guanabara, há cinco anos, e foi suficiente para marcar a administradora Marlene*, 36. “Senti nojo, invadida, com raiva”, reclama.


Nem sempre “encoxadores” que ficam se esfregando nos outros é apenas um pervertido. Ele pode ter o chamado “frotteurismo”, transtorno sexual caracterizado pela necessidade do contato físico indesejado para se sentir excitado. Por isso, essas pessoas costumam encostar e roçar partes do corpo, especialmente a genitália, em outras – e, com frequência, isso ocorre em público. Vale dizer que o prazer de quem desenvolve o frotteurismo é relacionado a um comportamento sexual fantasiado e proibido, sem relação com o ato de penetrar.

Especialista em transtornos da sexualidade, Marina Zaneti diz que o frotteurista age de forma parecida a um dependente químico, chegando a permanecer muitas horas do dia em busca de vítimas. “O comportamento envolve quatro fases: a fissura (vontade intensa), a ritualização (rotina que leva ao aumento da excitação), a gratificação sexual (não consegue interromper a busca pela vítima enquanto não se satisfaz) e o desespero (a culpa e o sofrimento)”, conta.

De acordo com a psiquiatra, os prejuízos para as vítimas podem gerar traumas sexuais, mas os “encoxadores” dificilmente percebem os danos de tais atos e só buscam tratamento com psicoterapia e medicamentos quando existem consequências legais.

Para saber se existe o problema, Marina destaca a necessidade de uma avaliação médica ou psicológica, pois pode existir associação a outras doenças, como transtorno bipolar ou esquizofrenia, por exemplo, e diz que o frotteurismo também merece atenção jurídica. “Não aceitem qualquer suspeita de vitimização nos transportes públicos. Frotteurismo é crime. Denunciem”, diz.

Marlene, que foi vítima, também acredita que a única forma de coibir outros episódios é denunciar. “Não fiz o boletim de ocorrência porque o abusador correu, mas não dá pra ficar calada, tem que reagir”, sugere.

Crime

Por não ser consensual e ferir o princípio da dignidade das pessoas, o abuso praticado pelo frotteurista pode configurar vários crimes previstos pelo Código Penal, de acordo com o professor de direito penal da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais e advogado criminalista, Leonardo Vilela. “São varias hipóteses, uma delas é o constrangimento ilegal, que pode ter pena de seis meses a um ano. Também pode significar ato obsceno, com pena de três meses a um ano. E, ao contrário do que muita gente pensa, a ‘encoxada’ pode ser interpretada como estupro (pena de seis a dez anos). O problema é que hoje vivemos em uma sociedade machista em que a vítima acaba sempre sendo colocada como culpada”, avalia.

Projeto de ‘Vagão Rosa’ aguarda votação

Para tentar combater esse tipo de situação no transporte público brasileiro, o Estado do Rio de Janeiro e o Distrito Federal já passaram a adotar o “vagão rosa” exclusivo para as mulheres e pessoas com deficiência. Em Belo Horizonte, denúncias, reclamações de usuários e um abaixo-assinado com mais de 12 mil nomes também deram origem a um projeto de lei de autoria do vereador Léo Burguês (PTdoB). “O PL está pronto, só esperando o presidente da Câmara Municipal de Belo Horizonte (Wellington Magalhães – PTN) colocá-lo em pauta para ser votado”, diz.
O vereador ressalta, porém, que essa seria uma medida paliativa. “O ideal seria que as pessoas tivessem educação para conviver e respeitar o próximo. A nossa ideia é que seja feito junto com campanhas educativas”, afirma.

Enquanto o PL não entra em votação, Burguês acredita que outras providências podem ser tomadas. “A Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU) poderia tomar a decisão de separar um vagão exclusivo para as mulheres. A própria BHTrans também poderia fazer campanhas educativas”.

Em nota, a CBTU disse que “acompanha a discussão” e que “cumprirá todas as determinações legais que vierem a ser implantadas”. A companhia informou ainda que “promove campanhas permanentes que estimulam a gentileza urbana” e mantém “agentes treinados para coibir ocorrências de segurança”

Fonte: O Tempo  

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