Analogamente ao papel das
mulheres na sociedade, uma cooperação mais imediata das mulheres como mulheres
no apostolado da hierarquia poderia constituir uma força humanizante que
corrija as tendências ao clericalismo burocrático e ao carreirismo.
Publicamos um trecho traduzido do
livro Promise and Challenge. Catholic Women Reflect on Feminism, Complementarity,
and the Church [Promessa e desafio: mulheres católicas refletem
sobre feminismo, complementaridade e Igreja] (Huntington, Indiana, Our Sunday
Visitor, 2015, 256 páginas), organizado por Margaret Harper McCarthy.
O excerto foi publicado no jornal L'Osservatore Romano,
22-07-2015. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis o texto.
Para compreender como poderia
haver "uma presença feminina mais incisiva na Igreja" (Evangelii
gaudium, n. 103), é preciso primeiro reconhecer e apreciar a Igreja na
sua realidade feminina, naquela que foi definida como a dimensão mariana.
A dimensão mariana – a laicidade
ou "sacerdócio comum" – é aquela dimensão secular que pode
"tornar a Igreja presente e ativa naqueles locais e circunstâncias em que
só por meio deles ela pode ser o sal da terra" (Lumen gentium,
n. 33). É a dimensão mariana que torna a Igreja e o mundo, de modo novo,
"como uma casa", ajudando o mundo a "ser" e a crescer de
acordo com a sua vocação mais profunda.
Naturalmente, a dimensão mariana
não existe sem a dimensão petrina. A dimensão petrina encarna Cristo,
que vem à Igreja para torná-la fecunda e, de tal modo, garante o fluxo
constante de vida a partir de Cristo a ela. Mas essa função petrina emerge do
interior da dimensão mariana e está a seu serviço.
Sobre esse ponto, Hans
Urs von Balthasar nota a prioridade da dimensão mariana estabelecida
com a Anunciação, que permaneceu e se tornou mais profunda quando (sob a cruz) Maria foi
dada aos apóstolos como a sua Mãe.
A partir da perspectiva dessa
compreensão "esponsal" da Igreja, notamos que, como membro da
dimensão mariana da Igreja, já estamos na Igreja e participamos plenamente
dela. Portanto, quando se fala da presença das mulheres – ou de qualquer leigo
– na Igreja, é preciso resistir a certas tendências ao clericalismo, que dá às
mulheres um grande trabalho eclesial para que se sintam "mais
envolvidas", como se já não fossem.
As tendências clericalistas
reduzem a abertura da Igreja ao mundo e a fecundidade que ela pode ter, isto é,
justamente aquilo para cujo serviço existe a dimensão petrina. A presença das
mulheres e dos leigos na Igreja, portanto, é garantida em primeiro lugar pela
sua "permanência no seu lugar" na dimensão mariana no centro do mundo.
Dito isso, há um lugar em que os
leigos "podem ainda ser chamados, por diversos modos, a uma colaboração
mais imediata no apostolado da Hierarquia, à semelhança daqueles homens e
mulheres que ajudavam o apóstolo Paulo no Evangelho,
trabalhando muito no Senhor" (Lumen gentium, n. 33).
E, na medida em que os leigos são
consultados em alguma função da Igreja oficial, não há nada de verdadeiramente
novo ao consultar as mulheres. No entanto, se considerarmos a participação das
mulheres leigas como tais, podemos apontar o dedo para qual fim essencial pode
ter esse envolvimento para além do "incluir a todos".
Analogamente ao papel das
mulheres na sociedade, uma cooperação mais imediata das mulheres como mulheres
no apostolado da hierarquia – "onde se tomam as decisões importantes"
(Evangelii gaudium, n 103) – poderia constituir uma força
humanizante que corrija as tendências ao clericalismo burocrático e ao
carreirismo.
Embora o conceito que a Igreja
tem da autoridade não tenha nada a ver com o poder, da forma como é comumente
entendido, muitas vezes, somos tentados a identificar o poder sacramental com o
poder em geral, ou com o poder como dominação.
Em vista disso, uma presença
feminina ajudaria a recordar a "Pedro" aquilo que poderia ser
facilmente esquecido. Vendo a Igreja feminina, lembra-se a "Pedro"
aquilo a que ele deve a si mesmo e aquilo a que ele serve. E lembra-se a ele
que as suas decisões são tomadas todas dentro de uma decisão anterior, o fiat de Maria,
como disse Newman.
Em última análise, para abordar
de modo autêntico o que significa para as mulheres "levar adiante o seu
perfil", sempre é preciso partir da afirmação da diferença entre os sexos
como única garantia da fecundidade espiritual e física da natureza humana.
Qualquer reflexão sobre o assunto deve levar seriamente em consideração tanto
as pressões da cultura dominante, quanto da mulher como tal, como ser propenso
à maternidade que cria uma casa para o ser humano no sentido mais profundo.
Implícita nessa compreensão do
gênio feminino, vemos que ela já é tanto social quanto eclesial, e que o valor
do "dar um passo à frente" das mulheres de maneira mais pública
consiste em tornar o mundo e a Igreja mais, e não menos, semelhantes a uma
casa.
Fonte: Ihu
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