Trabalhadores vítimas do tráfico
de pessoas para o trabalho escravo são resgatados no Pará (Foto: Leonardo
Sakamoto)
O tráfico de seres humanos para
trabalho escravo, exploração sexual, remoção de órgãos, mendicância forçada,
adoção ilegal e casamento forçado é um dos crimes mais lucrativos do mundo.
Apesar disso, ele ganha muito menos destaque nos noticiários brasileiros do que
o tráfico de drogas ou de armas.
Por Leonardo Sakamoto
Ao mesmo tempo, nós jornalistas
cobrimos mal o tema, sendo pautados pelo governo, Justiça, polícia ou novelas e
não tomando a dianteira em propor análises e investigações por conta própria.
Isso sem contar que, involuntariamente, por causa da falta de formação e
informação, a sociedade acaba por perpetuar determinados preconceitos.
Preconceitos e equívocos como:
– Apenas mulheres são vítimas de
tráfico para exploração sexual;
– Esse problema envolve apenas
brasileiras no exterior;
– Só grandes máfias controlam o
comércio de gente;
– Somente pessoas pobres e
ingênuas tornam-se vítimas;
– Todo boliviano trabalhando em
oficina de costura de São Paulo é vítima de trabalho escravo.
Nesta quinta (30), celebra-se o
Dia Mundial de Combate ao Tráfico de Pessoas. Por isso, resolvi recomendar
novamente duas publicações. A pesquisa
“Tráfico de pessoas na imprensa brasileira” , desenvolvida pela Repórter
Brasil, com recursos do Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime
(UNODC) e o apoio do Ministério da Justiça, no ano passado, aponta que o tema
ainda não recebe atenção suficiente por parte da mídia.
De 655 textos que saíram nos
maiores veículos da imprensa sobre o tema desde 2006, 57% apenas menciona o
tráfico de pessoas, não raro de forma equivocada, misturando conceitos e
interpretações. Entre os 43% restantes, a maioria (54%) não trata de causas ou
contextualiza a questão e boa parte (44%) é focada apenas no tráfico para fins
de exploração sexual.
A cobertura se baseia na agenda
governamental ou em ações policiais e em muitos casos limita-se a aspectos
criminais, sem os aprofundamentos necessários para tratar de um fenômeno
complexo, multifacetado e dinâmico, com diferentes modalidades, causas e
consequências.
Não admira, portanto, que a
percepção popular para a solução é mandar todos os envolvidos para o xilindró.
Punir com prisão é importante, mas reduzir todas as medidas a essa é uma visão
simplista de um problema estrutural.
Para melhorar a cobertura do
fenômeno, sugiro o “Guia para jornalistas com referências e informações sobre
enfrentamento ao tráfico de pessoas”, um guia com referências, informações e
fontes sobre o enfrentamento ao problema para ajudar jornalistas, profissionais
de comunicação do poder público, empresas e organizações não-governamentais e
interessados em geral a tratarem do tema.
A publicação destaca que o Brasil
é país de origem, trânsito e destino de tráfico de pessoas, o que torna a
cobertura complexa. Às pessoas preocupadas em acompanhar a questão, o guia
recomenda focar direitos humanos, contextualizar e acompanhar políticas de
prevenção, diversificar fontes e ter atenção para identificar novas modalidades
de tráfico.
Por se tratar de um fenômeno
clandestino e de difícil mensuração, é preciso ter cuidado com números e
estatísticas, e com os mitos e estereótipos que ainda são comuns e mais
atrapalham do que ajudam no entendimento sobre o tema – pois, em tese, qualquer
pessoa pode ser traficada. Ao aprofundar a questão é preciso sensibilidade com
vítimas, que não devem ser tratadas como coitadas, inocentes, ignorantes, mas
como sujeitos de direitos que merecem respeito.
Também vale cuidado redobrado em
casos que envolvem crianças e adolescentes, e estar atento a termos inadequados
(o guia traz diversos exemplos). Outras recomendações são ter a perspectiva de
gênero e lembrar que diferenças sexuais são produtoras de desigualdades
sociais; entender migração como um direito humano; e considerar que a
prostituição não é crime no Brasil.
Para saber mais sobre o tráfico
de pessoas, veja o vídeo abaixo:
Fonte: Blog do Sakamoto
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