Nós mulheres ouvimos desde muito
pequenas frases como: “não faça isso, isso é coisa de menino”, “isso não são
atitudes de mocinha”, “meninas não devem fazer isso”, e simplesmente crescemos
achando que somos incapazes de realizar “tarefas masculinas” ou “agir como
“meninos”.
Por Jornalismo de Mulher Do
Jornalismo de Mulher
O fácil, o delicado, o sem graça,
a teoria, fica com as mulheres. O difícil, interessante, aventureiro, a
prática, com os homens. Sempre foi assim e duvido muito que mude, mas isso é
papo para outra hora. O fato é que o sexo feminino vem se destacando na
sociedade em geral, apesar de faltar muito para alcançarmos uma verdadeira
equidade. Nos esportes, na ciência, na aeronáutica, as mulheres estão provando
que podem (e devem) quebrar as barreiras da misoginia e serem quem elas bem
entenderem. Mas falta estímulo, principalmente da mídia. Não importa o quanto
uma menina seja talentosa, ela será diminuída a um nível de objeto. Se estiver
dentro dos padrões, será apenas mais um rostinho bonito, uma “musa”. Se não
estiver nos padrões, será humilhada, de modo que todos os seus “defeitos” sejam
expostos pro mundo como se ela fosse uma criminosa. A mídia é cruel e
naturaliza o machismo e a insuportável cultura do estupro.
Um exemplo foi o que aconteceu
com a atleta brasileira, Ingrid de Oliveira, especializada em saltos
ornamentais. A moça será uma das representantes do Brasil nos jogos
Pan-Americanos no Canadá, que começaram na sexta-feira, dia 10/07. Com apenas
19 anos de idade, Ingrid foi vítima de comentários machistas e grosseiros ao
postar uma simples foto sentada de costas na plataforma de treino.
Comentários que não apenas a
insultam, mas a reduzem a um brinquedo sexual, feito para satisfazer os homens.
Como se aquela foto fosse pensada exclusivamente para o prazer masculino, ignorando
todo seu talento como atleta, e como uma mulher guerreira que conseguiu chegar
nos Jogos Pan-Americanos. Isso desanima qualquer mulher, pois sabemos que
qualquer visibilidade feminina é levada ao modo sexual, então pensamos que é
melhor ficar por aqui mesmo, afinal, pra quê correr o risco? Em entrevista ao Portal Uol, Ingrid conta seu
desespero: “Fiquei horrorizada. Do nada, começou a aparecer um monte de homens
que nunca vi na vida comentando absurdos na minha foto. Já tomei a decisão de
não postar mais fotos da minha bunda no Instagram por um bom tempo”, onde
percebemos que a liberdade da mulher acaba quando o homem quiser. Eles têm o
poder de nos assustar, e de nos fazer mudar de ideia em relação a fotos, ao
nosso corpo, etc. Como se não bastasse os insultos, os portais de notícia não
deixaram por menos. Destilaram misoginia até para noticiar o que aconteceu com
Ingrid.
O conceito de “musa” não passa de
objetificação barata e escancarada. Pois não vemos o mesmo acontecer com
homens. E o pior é quando paramos para ler os comentários das notícias.
Parece coisa de século passado,
mas não é. É 2015. E em pleno 2015 ser mulher e exercer a liberdade de postar
uma foto, ainda é algo revoltante. A mídia só naturaliza isso. Como se o trabalho
de uma mulher fosse agradar o homem, não importa o que ela seja. Jornalista,
atriz, cantora, atleta, dançarina, qualquer coisa nesse mundo, deve girar em
torno de homem. Segundo a mídia e suas terríveis publicidades, o corpo da
mulher é de livre acesso pra qualquer um. É só refrescar a memória e lembrar da
campanha da Skol do “deixei o não em casa”, da campanha da Itaipava do “Vem
verão”, ou de centenas de propagandas de cerveja. O primeiro erro é achar que
só homem curte cerveja. O segundo é achar que a mulher que gosta de cerveja
está fazendo isso pra agradar o macho. Em terceiro, só existe mulher padrão em
comerciais desse tipo. Isso é naturalização e banalização da imagem feminina,
que colabora drasticamente para perpetuar a cultura do estupro.
Outro exemplo recente é a Copa do
Mundo de Futebol Feminino, onde apenas uma emissora televisionou os jogos ao
vivo. Foi praticamente impossível encontrar mais de dois sites que mostrassem
os resultados e os próximos jogos, enquanto o mundo para toda vez que acontece
a Copa do Mundo de Futebol Masculino. Todo mundo lembra, aconteceu ano passado.
Um peso, duas medidas completamente diferentes. Não vemos propaganda
milionárias com jogadoras de futebol, diferente dos jogadores. A mídia, por não
dar uma chance às mulheres, influencia toda a sociedade, que continua achando
que elas jogam mal, ou fazem isso para “se aparecer”. A velha e ultrapassada
história de que futebol não é coisa de mulher, ainda é perpetuada. As jogadoras
sofrem para se manter na carreira, pois são tratadas com um extremo descaso,
até mesmo de quem deveria apoiá-las. Marco Aurélio Cunha, coordenador de
futebol feminino da CBF, fez colocações infelizes em entrevista ao jornal
canadense The Globe and Mail, falando sobre o crescimento da modalidade:
“Futebol feminino costumava copiar o futebol masculino. Até nos modelos de
camisa, que era masculino. Nós vestíamos as meninas como garotos. Então faltava
o espírito de elegância, de feminilidade. Agora os shorts são mais curtos, os
cabelos são bem feitos. Não são mulheres vestidas como homens”, afirmou o
dirigente. Novamente, entregando às mulheres o papel de frágil e delicada, até
mesmo jogando futebol. Vestir as meninas “como garotos”, ou seja, com uniformes
completamente normais, para ele era um erro, pois elas precisam estar com
shorts mais curtos, sendo objetificadas. Sendo criticadas por sua aparência, e
não pelo modo como jogam.
Ser mulher é difícil. A cada dia
é uma nova batalha a ser enfrentada contra um mundo que tira nossa humanidade,
que nos torna meras bonecas infláveis, que precisam estar sempre lindas. Não
importa o talento nem a profissão, importa é que você esteja num padrão de
mulher linda, calada e submissa. Mesmo ocupando tantos espaços diariamente,
todas nós somos testadas diariamente, precisamos provar o tempo todo que somos
boas no que fazemos para um homem não ocupar nosso lugar. E mesmo quando
provamos, eles estão nem aí. Porque não podemos esquecer que quem comanda a
mídia é a elite. A elite, aquela mesma que cresceu no meio de tantos
preconceitos, de tanto sexismo e que estimula isso cada dia mais para se manter
no poder. Não há espaço dignamente feminino na grande mídia. Não podemos
esperar para que um dia essa realidade mude, isso precisa partir de nós.
Principalmente estudantes de comunicação. Mulheres precisam ocupar esse meio e
fazer dele um lugar livre de objetificação e misoginia.
Fonte: Geledes
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