Judith Butler, em seu livro
‘Problemas de Gênero – Feminismo e Subversão da Identidade’ (2003 ), lança uma
pergunta para o feminismo: afinal, de que mulheres estamos falando? Conseguimos
falar de todas as mulheres? Todas as mulheres estão falando? Quem são as
mulheres que são sujeitos do feminismo?
Texto de Thayz Athayde
Ora, a pergunta não é simples.
Talvez não tenha resposta ou não saibamos responder. Ou ainda, não queiramos
responder. A importância dessa pergunta diz respeito a que feminismo estamos
fazendo. Já que não existe um feminismo, mas vários, podemos nos perguntar:
qual feminismo estamos fazendo, para quem e com quem? Em outras palavras: o
feminismo que fazemos é feito para quais mulheres? Quem está do nosso lado
fazendo política para mulheres?
Amanhã é o dia das mulheres. Dia
esse em que muitas mulheres recebem rosas e parabéns por serem mulheres. Por
serem A mulher. Por representarem o papel de mulher que nos esforçamos para
ser, mas que jamais seremos. E, parafraseando Butler, pergunto de quais
mulheres falamos no dia das mulheres. Não estou falando de promoções de
farmácia, rosas ou qualquer coisa parecida. Já deixamos claro aqui que 8 de
março é um dia de luta.
Afinal, qual imagem de mulher
passa pela sua cabeça quando pensamos no sujeito mulher? Para os padrões
normativos do que é ser mulher, existe apenas uma imagem: branca, hétero, cis,
sem deficiência, magra, classe média ou rica, que mora na cidade, faz faculdade.
Provavelmente não vou conseguir colocar tudo o que representa essa imagem dA
mulher. São as pegadinhas da identidade.
E como uma mulher deve ser? Doce,
inteligente (mas, nem tanto), livre (mas, nem tanto), descolada, romântica,
simpática e a cereja do bolo: se dar o respeito. As mulheres das capas de
revista não existem. Essa imagem da mulher não existe. Existe, sim, uma
pluralidade de identidades. Não existe uma identidade única de Mulher. Mas,
várias identidades que acompanham uma delas que é mulher. Eu, enquanto mulher
branca e cis, sofro com machismo. Uma mulher negra sofrerá com o machismo e
racismo. Uma mulher trans* com machismo, transfobia e cissexismo. Ora, não há
um vetor único de opressão. Audre Lorde diz melhor:
Dentro da comunidade lésbica eu
sou Negra, e dentro da comunidade Negra eu sou lésbica. Qualquer ataque contra
pessoas Negras é uma questão lésbica e gay, porque eu e milhares de outras
mulheres Negras somos parte da comunidade lésbica. Qualquer ataque contra
lésbicas e gays é uma questão sobre direitos dos negros, porque milhares de
lésbicas são Negras e milhares de homens gays são Negros. Não existe uma
hierarquia de opressão. Referência: Audre Lorde, There is No Hierarchy of
Oppression. Em: Sobre ser lésbica e negra de Maria Rita Casagrande.
Por isso, hoje quero tentar falar
de todas as mulheres. Tentar falar de todas as mulheres não significa falar
pelas mulheres. É muito mais uma tentativa de não pensar em uma identidade
universalizante de mulher. Mas, falar por todas elas? Jamais. Aliás, nem dá
para falar por todas elas. O objetivo é
falar dessas mulheres que para muitas pessoas não existem e que fazem da vida
sua própria existência e resistência.
Quero falar das mulheres negras,
das indígenas, das mulheres que não são brancas. Das mulheres com pênis, de
seios siliconados, das que não tem seios, dos seios pequenos, dos seios
grandes, dos seios. Das mulheres que não tem vagina, não tem útero, não tem
ovário, por diversos motivos e não apenas por um único. Das mulheres lésbicas e
das bissexuais. Das mulheres que se relacionam com outras mulheres, que amam
outras mulheres, que se apaixonam por outras mulheres. Daquelas que gostam de
homens e de mulheres, não porque estão confusas, mas porque gostam. Das
mulheres prostitutas, daquelas que gostam de ser prostitutas e daquelas que
estão ali por outros motivos que não cabe julgamento algum. Das mulheres que
moram no campo, no sertão, fora da cidade. Das mulheres pobres, das
marginalizadas, daquelas que fingimos não ver.
E, mesmo tentando falar de todas
as mulheres, sempre esquecerei de uma ou de todas. Nesse dia das mulheres eu
desejo luta, resistência e existência à todas as mulheres e suas identidades
que atravessam o ser mulher.
[+] Um dia pra lembrar que lutar contra o racismo também é feminismo. Por Charô Nunes.
[+] Dia internacional da mulher branca. Por Zaíra Pires.
[+] E a Propaganda da Riachuelo no Dia da Mulher? Por Luciana Nepomuceno.
[+] Dia Internacional da Mulher: conheça e apoie causas feministas ligadas à maternidade. Por Amanda Vieira.
Fonte: Blogueiras feministas
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