O 8 de Março é um dia de luta.
Não nos esqueçamos disso quando vierem nos entregar flores, bombons e parabéns.
Por Maíra Kubik Mano*
A violência contra a mulher
persiste e os instrumentos para acolhê-las seguem precários, mesmo com dez anos
da lei Maria da Penha – basta ver quantos e quais são as condições dos IMLs.
A crise econômica prejudica mais
as mulheres, que são a maioria das pessoas pobres do mundo.
As mulheres continuam morrendo
por conta do machismo, e as mulheres negras muito mais do que as brancas.
A lesbofobia e a transfobia
também ameaçam vidas diariamente.
A divisão sexual do trabalho
ainda pesa sobre nossos ombros e nos coloca em uma posição socialmente
inferior.
E para mudar tudo isso, como bem
perceberam as precursoras do 8 de Março, só mudando profundamente a sociedade.
Desde meados do século 19, o
operariado organizava greves para pressionar os proprietários das indústrias,
principalmente as têxteis, cuja maioria das trabalhadoras era mulheres. Em
terras norte-americanas foi registrado o primeiro Dia da Mulher, em 3 de maio
de 1908. Segundo o jornal The Socialist Woman, “1.500 mulheres aderiram às
reivindicações por igualdade econômica e política no dia consagrado à causa das
trabalhadoras”.
No ano seguinte, a data foi
oficializada pelo partido socialista e comemorada em 28 de fevereiro. Em Nova
York, reuniu cerca de 3 mil pessoas em pleno centro da cidade.
Em 1911, ocorreu um episódio
marcante, que ficou conhecido no imaginário feminista como a consagração do Dia
da Mulher: em 25 de março, um incêndio teve início na Triangle Shirtwaist
Company, em Nova York. Localizada nos três últimos andares de um prédio, a
fábrica tinha chão e divisórias de madeira e muitos retalhos espalhados,
formando um ambiente propício para que as chamas se espalhassem. A maioria dos
cerca de 600 trabalhadores conseguiu escapar, descendo pelas escadas ou pelo
elevador.
Outros 146, porém, morreram.
Entre eles, 125 mulheres, que foram queimadas vivas ou se jogaram das janelas.
Mais de 100 mil pessoas participaram do funeral coletivo.
Até hoje, muitas organizações e
movimentos afirmam que essa tragédia aconteceu em 1857 e por isso reivindicam o
mês de março como a data para comemorar a luta pelos direitos das mulheres.
Como não há provas nem registros de que um evento similar tenha ocorrido, essa
versão não é considerada verdadeira. Para os estudiosos, esse foi apenas mais
um acontecimento que fortaleceu a organização feminina.
De fato, o Dia Internacional da
Mulher já havia sido proposto em 1910, um ano antes do incêndio, durante a II Conferência
Internacional de Mulheres Socialistas, realizada em Copenhague, Dinamarca.
Clara Zetkin, militante e intelectual alemã, apresentou uma resolução para que
se criasse uma “jornada especial, uma comemoração anual de mulheres”. A
inspiração nas trabalhadoras do outro lado do Atlântico é explícita: para
Clara, elas deveriam “seguir o exemplo das companheiras americanas”.
Sem data definida, mobilizações
anuais pelos direitos das mulheres prosseguiram em meses distintos, em diversos
países.
Em 8 de março de 1917, uma ação
política das operárias russas contra a fome, contra o czar Nicolau II e contra
a participação do país na Primeira Guerra Mundial precipitou os acontecimentos
que desencadearam na revolução de fevereiro.
O líder Leon Trotsky registrou
assim esse evento: “Em 23 de fevereiro (8 de março no calendário gregoriano)
estavam planejadas ações revolucionárias. Pela manhã, a despeito das diretivas,
as operárias têxteis deixaram o trabalho de várias fábricas e enviaram
delegadas para solicitarem sustentação da greve. Todas saíram às ruas e a greve
foi de massas. Mas não imaginávamos que este 'dia das mulheres' viria a
inaugurar a revolução”.
A situação econômica e política
da Rússia era então insustentável. Mais de 90 mil pessoas marcharam, exigindo
pão e paz. Os protestos e as greves subseqüentes culminaram na queda da
monarquia. Alexandra Kollontai, uma das principais dirigentes feministas da
revolução de outubro, afirmou que “o dia das operárias em 8 de março de 1917
foi uma data memorável na história”.
Em 1921, de acordo com a
pesquisadora canadense Renée Coté, referência no estudo da história das
mulheres, o 8 de março foi estabelecido como data oficial. Pesquisando arquivos
da Conferência Internacional das Mulheres Comunistas, ela encontrou um
documento que registrava que “uma camarada búlgara propôs o Dia Internacional
da Mulher, lembrando a iniciativa das mulheres russas”.
Lembrar é preciso. O 8 de Março é
um dia de luta. Não nos esqueçamos disso quando vierem nos entregar flores,
bombons e parabéns.
E que sua história nos sirva
sempre de inspiração para as tantas batalhas que ainda precisamos travar.
(*) Maíra Kubik Mano é
jornalista, doutora em Ciências Sociais e professora do bacharelado em Estudos
de Gênero e Diversidade da Universidade Federal da Bahia. Ela, gentilmente,
aceitou publicar, neste blog, por conta do Dia Internacional da Mulher.
Fonte: Blog de Sakamoto
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