O preconceito está presente em
todas as relações da mulher que exerce a prostituição: com o cliente, com a
sociedade em geral, no meio acadêmico e inclusive partindo das próprias
profissionais.
Todas fazem uso de um pseudônimo
para se identificar dentro do local de trabalho e esse nome é trocado conforme
a casa em que estão exercendo a atividade, facilitando assim o anonimato, que é
considerado fundamental no ofício em função do preconceito vivido por elas.
Elas contam que às vezes acontece
de serem xingadas na rua por clientes que já usufruíram de seus serviços.
Apesar de serem uma minoria, há clientes que as maltratam verbal e fisicamente
durante o trabalho e fora. As profissionais relatam esconder sua profissão da
maioria das pessoas, principalmente de suas famílias: "meu filho não vai
saber que eu sou garota de programa... eu não tenho vergonha, mas também não
tenho orgulho... é um trabalho como outro, mas não é aceito". Apesar de
dizerem que consideram essa uma profissão como outra qualquer, afirmam que não
gostariam de ser registradas: "eu não quero uma carteira de trabalho
escrito 'prostituta'".
A religião reforça uma
ambigüidade de sentimentos, gerando culpa por exercerem uma atividade
considerada pecaminosa: "tem até um dos dez mandamentos que diz 'não se
prostituirás'". Outra frase marcante no sentido dessa culpabilização
gerada pela religião é: "toda vez que um homem sai de cima de mim, eu
rezo".
Há ainda o preconceito das
próprias "garotas" contra um tipo que chamam de "a puta de
paredão", referindo-se a mulheres que fazem sexo por prazer e com muitos
parceiros, em suas palavras: "a mina que vai na balada e transa com
qualquer um, acha o cara da balada bonitinho, vai com ele para o motel e não
cobra". Essas não seriam profissionais, mas mulheres promíscuas.
Durante o estágio, sentíamos que
estávamos adentrando um território muito delicado, tocando em alguns tabus da
sociedade. Percebemos que o tema por várias vezes gerou discordâncias e
incômodos. No meio acadêmico que freqüentamos, deparamo-nos com reações que
variaram do interesse ou da curiosidade à repulsa.
No início da relação com as
estagiárias, as "garotas" pareciam testá-las, perguntando se estavam
preparadas para ser confundidas com uma delas ao saírem da boate. Ao mesmo
tempo, valorizavam a presença das estagiárias ali. Ao final do trabalho,
mostraram de maneira clara a segregação que vivenciavam, caracterizando "o
mundo lá fora e o mundo aqui dentro", como se houvesse uma barreira entre
elas e o resto da sociedade. A dona da casa disse que nunca havia visto uma
intervenção desse tipo "em dez anos de noite" e que o fato de as
estagiárias escutarem o que elas tinham a dizer sem julgá-las já era uma forma
de romper com essa barreira, pois as conversas possibilitavam levar para
"fora" um pouco do que a equipe vivenciou lá dentro, mostrando que
elas são pessoas comuns, o que poderia ajudar a combater um pouco do
preconceito."
Da pesquisa “ Intervenção em
saúde do trabalhador com profissionais do sexo” (http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1516-37172008000100008)
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