É
juridicamente correto deixar de reconhecer efeitos trabalhistas na relação
entre os profissionais do sexo e as casas de prostituição?
Por Darlon Costa Duarte
1. INTRODUÇÃO
A possibilidade de reconhecimento do vínculo empregatício dos
prostitutos com as casas de prostituição é um tema pouco explorado pela
doutrina trabalhista, não obstante a sua abrangência, considerando o número dos
possíveis beneficiários.
O presente artigo se debruça sobre esse ponto, objeto de déficit
doutrinário, ciente, desde já, das dificuldades que envolvem o tema, uma vez
que os debates ao seu respeito, como não poderia deixar de ser, sempre acabam
por externar concepções pessoais dos debatedores sobre o assunto, de forma que
estabelecer um consenso é difícil, senão impossível.
Será analisado o entendimento atual dos tribunais trabalhistas a
respeito da possibilidade jurídica de se reconhecer vínculo empregatício dos
prostitutos com as casas de prostituição.
Ato contínuo, tentar-se-á demonstrar que muitas dessas posições são,
data vênia, desacertadas, e que são dotadas de contradições insuperáveis.
Como premissa, contudo, vale esclarecer que sempre que se fala da
prostituição como atividade profissional, parte-se do pressuposto de que ela é
exercida de forma voluntária por pessoas maiores e capazes.
2. A VIABILIDADE JURÍDICA DO RECONHECIMENTO DO
VÍNCULO EMPREGATÍCIO
Inicialmente, cumpre rememorar que o exercício
individual da prostituição não é considerado crime no Brasil (não obstante haja
projetos de lei nesse sentido, a exemplo do PL 377/2011 de autoria do Deputado
Federal João Campos). De fato, apenas o seu agenciamento é considerado crime,
tipificado no art. 229 do Código Penal. Mas seria tal circunstância suficiente
para obstar eventual reconhecimento de vínculo empregatício dos profissionais
do sexo com as casas em que a prostituição é exercida?
Muitos julgados negam veementemente esta
possibilidade.
Os principais argumentos da corrente
recalcitrante são, basicamente, os seguintes: (1) a atividade dos prostitutos
concorre, na condição de atividade-fim, para o tipo penal previsto no art. 229
do Código Penal, de forma que não há que se falar em relação de emprego, uma
vez que tal atividade consiste em espécie de trabalho ilícito; (2) a atividade
dos prostitutos viola a moral e os bons costumes, inquinando de nulidade a
possível relação empregatícia.
Sem embargos, parece que tais posicionamentos
devem ser revistos.
Na tentativa de enfrentar o tema, faz-se
necessário, primeiramente, analisar os requisitos de um contrato de emprego (e,
para tanto, é indispensável a análise do seu gênero, o contrato de trabalho).
Em seguida, cumpre definir qual a natureza
jurídica das diversas formas de prostituição, para verificar qual delas
eventualmente se enquadra no conceito de relação de trabalho/emprego.
Finalmente, é preciso enfrentar se, de fato,
essa eventual relação de trabalho/emprego poderia se enquadrar no conceito de
“trabalho ilícito”, de forma a inquinar de nulidade o negócio jurídico (o que
pressupõe a análise da teoria das nulidades do contrato de trabalho, ocasião em
que serão feitas breves considerações sobre as distinções entre a teoria
trabalhista e a teoria civilista das nulidades), ou se os direitos sociais
oriundos dessa possível relação empregatícia podem ser garantidos (e
eventualmente tutelados pelo Judiciário).
2.1. RELAÇÃO DE TRABALHO VERSUS RELAÇÃO DE
EMPREGO
A doutrina define a relação de trabalho como
qualquer obrigação de fazer que se refira ao labor humano, sendo um verdadeiro
gênero que abrange diversas espécies.
Nesse sentido, segundo Martinez (2013, p. 138),
“do mesmo tronco comum surgem diversas ramificações com suas particularidades,
não obstante todas elas tenham o idêntico propósito de garantir a sobrevivência
humana”.
Com efeito, do gênero relação de trabalho surgem
a (a) relação de trabalho autônomo, (b) relação de trabalho eventual, (c)
relação de trabalho avulso, (d) relação de trabalho voluntário e, finalmente,
(e) a relação de emprego[1].
A distinção que permeia as diversas espécies de
relações de trabalho gira em torno, em regra, na ausência de um ou alguns dos
requisitos que caracterizam a relação de emprego.
2.1.1. PARTES DA RELAÇÃO DE EMPREGO
A relação de emprego compõe-se, basicamente, de
dois polos: o empregado e o empregador.
Nos termos do art. 3º da Consolidação das Leis
do Trabalho – CLT “considera-se empregado toda pessoa física que presta
serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e
mediante salário”.
Segundo Martinez (2013, p. 185), “no contexto do
contrato de emprego, o empregado aparece com sujeito prestador do trabalho,
vale dizer, aquele que pessoalmente, sem auxílio de terceiros, despende, em
caráter não eventual e sob direção alheia, sua energia laboral, em troca de
salário; aquele que, por não exercer atividade por conta própria, não assume
riscos da atividade na qual está incurso”.
Por outro lado, considera-se empregador, ainda
no escólio do supracitado autor, “a pessoa física, jurídica ou ente
despersonalizado (este excepcionalmente autorizado a contratar) concedente da
oportunidade de trabalho, que, assumindo os riscos da atividade (econômica ou
não econômica) desenvolvida, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de
serviços de outro sujeito, o empregado” (MARTINEZ, 2013, p. 223).
Já a CLT conceitua o empregador como sendo “a
empresa, individual e coletiva, que, assumindo os riscos da atividade
econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviços” (art.
2º).
2.1.2. REQUISITOS PARA A CARACTERIZAÇÃO DE UMA
RELAÇÃO DE EMPREGO
Como dito, a relação de emprego se distingue e
se torna peculiar em relação às demais espécies de relações de trabalho pela
presença cumulativa de uma série de requisitos. Diante da falta de algum deles,
será possível a existência de uma das demais espécies de relação de trabalho,
mas não de uma relação de emprego.
A maior parte desses requisitos, inclusive, está
presente no conceito de empregado trazido pela CLT (art. 3º). São eles: (a) ser
o trabalho exercido por uma pessoa física, (b) haver pessoalidade na prestação
dos serviços, (c) ser o trabalho não-eventual, (d) ser o trabalho oneroso e (e)
haver subordinação.
O requisito de ser o empregado pessoa física
demonstra que a pessoa jurídica não pode, jamais, figurar como empregada na
relação jurídico-laboral. Apenas ao empregador é dado ser pessoa jurídica,
jamais ao empregado.
Ademais, o requisito da pessoalidade demonstra,
de acordo com Maurício Godinho Delgado (2013, p.285) que, em regra, é
necessária a nota da infungibilidade na prestação dos serviços empregatícios.
Ou seja, a relação jurídica empregatícia deve ser, em relação ao empregado,
intuitu personae, de forma que ao prestador de serviços não é dado fazer-se
substituir por outro trabalhador no desempenho das suas obrigações.
Por outro lado, a não-eventualidade requer que a
relação empregatícia tenha um caráter de permanência, mesmo que essa
permanência se dê por um período de tempo determinado. Sendo assim, não se
caracteriza como emprego aquele trabalho realizado de maneira esporádica
(DELGADO, 2013, p.286).
A onerosidade, ao seu turno, demonstra que a
relação empregatícia tem um caráter essencialmente econômico. Nesse sentido,
enquanto “o empregado tem o dever de prestar serviços (...) o empregador, em
contrapartida, deve pagar salários pelos serviços prestados” (MARTINS, 2013, p.
107). Todavia, Maurício Godinho Delgado (2013, p. 291) alerta que a onerosidade
deve ser analisada estritamente sob a ótica do prestador de serviços, uma vez
que todo trabalho seria passível de mensuração econômica ao tomador dos
serviços.
Ademais, a análise da onerosidade deve se pautar
não só pelo aspecto objetivo (relacionado ao efetivo pagamento de uma
contraprestação ao prestador de serviços), mas também por uma análise de cunho
subjetivo, que se manifesta pela “intenção contraprestativa” (animus
contrahendi) existente entre as partes, em especial pelo prestador dos serviços.
Finalmente, para que se possa falar em relação
de emprego, deve haver subordinação, que, classicamente, consiste no
acolhimento, pelo empregado, do poder diretivo
do empregador diretamente exercido em relação àquele; ou seja,
tal subordinação, classicamente, seria manifestada pela “intensidade de ordens
do tomador de serviços sobre o respectivo trabalhador” (DELGADO, 2013, p. 297).
2.2. NATUREZA JURÍDICA DA ATIVIDADE DOS PROFISSIONAIS
DO SEXO
Vistos os requisitos para a caracterização da
relação de emprego, cumpre perquirir em quais hipóteses os serviços sexuais
desempenhados pelos prostitutos poderiam ser enquadrados como uma relação de
trabalho lato sensu, como uma relação de trabalho strictu sensu (ou relação
empregatícia) ou mesmo se é possível enquadrá-los como uma relação de consumo.
2.2.1. A PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS SEXUAIS COMO
RELAÇÃO DE CONSUMO
O melhor enquadramento jurídico a ser dado à
atividade dos prostitutos, em termos contratuais, na relação
prostituto-cliente, parece ser o de verdadeira prestação de serviços nos moldes
do art. 594 do Código Civil, segundo o qual “toda a espécie de serviço ou
trabalho lícito, material ou imaterial, pode ser contratada mediante
retribuição”.
A questão é saber se tal pacto consubstanciaria
uma relação de trabalho ou, simplesmente, uma relação de consumo, nos moldes do
Código de Defesa do Consumidor – questão relevante para, inclusive, fixar a
competência da justiça do trabalho ou da justiça comum no caso de eventuais
litígios judiciais.
De acordo com o art. 2º do CDC, consumidor é
toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como
destinatário final.
Já fornecedor, nos moldes do art. 3º do mesmo
diploma, é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou
estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de
produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação,
distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.
Finalmente, serviços, sob a ótica do relevante §
2º do art. 3º do CDC, é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo,
mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito
e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista.
No caso de uma relação de emprego (espécie do
gênero relação de trabalho), dúvidas não existem quanto à competência da justiça
do trabalho para julgar o litígio.
Todavia, nem toda relação de consumo é, também,
uma relação de emprego, embora alguns defendam a possibilidade de ser,
concomitantemente, uma relação de trabalho. Cite-se, por exemplo, o caso de um
jardineiro que oferece seu serviço uma única vez. Nesse sentido:
O Código de Defesa do Consumidor incide sobre algumas
relações de trabalho individual, caso de um jardineiro, de um dentista, de um
advogado, de um médico, de um empreiteiro, todos prestando serviços eventuais.
Em casos tais, é bem possível estarmos diante de uma relação de consumo que
também é uma relação de trabalho, e não necessariamente uma relação de emprego,
diga-se de passagem. (...) Quem merecerá proteção nessa hipótese? Qual a
justiça competente para apreciar eventual dilema contratual entre as partes: a
Justiça do Trabalho ou a Justiça Comum Estadual? (TARTUCE; NEVES. 2013, p.
100).
A questão ganha contornos ainda mais tormentosos
se forem analisadas as mudanças na competência da Justiça do Trabalho efetuadas
pela EC 45/2004, que, conforme o art. 114, I da Constituição Federal, passou a
ser competente para processar e julgar “as ações oriundas da relação de
trabalho” – competência esta que, antes, era restrita às relações de emprego.
Contudo, é de se observar que o consumidor é
definido, pelo art. 3º do CDC, como “destinatário final” do produto ou serviço.
Algumas teorias surgem para explicar o que se deve entender por “destinatário
final”, sendo a teoria finalista aquela que tem maior aceitação na doutrina e
no STJ[2]. Para essa teoria,
destinatário final seria aquele destinatário fático e
econômico do bem ou serviço, seja ele pessoa jurídica ou física. Logo, segundo
essa interpretação teleológica, não basta ser destinatário fático do produto,
retirá-lo da cadeia de produção, levá-lo para o escritório ou residência – é
necessário ser destinatário econômico do bem, não adquiri-lo para revenda, não
adquiri-lo para uso profissional, pois o bem seria novamente um instrumento de
produção, cujo preço será incluído no preço final do profissional para
adquiri-lo. Nesse caso, não haveria exigida ‘destinação final’ do produto ou
serviço, ou, como afirma o STJ, haveria consumo intermediário, ainda dentro das
cadeias de produção e distribuição. Essa interpretação restringe a figura do
consumidor àquele que adquire (utiliza) um produto para uso próprio e de sua
família, consumidor seria o não profissional, pois o fim do CDC é tutelar de
maneira especial um grupo da sociedade que é mais vulnerável. (MARQUES;
BENJAMIN; BESSA. 2010, p. 85).
A questão não é pacífica, mas parece que o traço
que distingue uma relação de consumo de uma relação de trabalho é que, no
primeiro caso, a energia laboral é utilizada na condição de atividade-fim, ao
passo que, no caso de uma relação de trabalho, a energia laboral será utilizada
como um acréscimo na cadeia produtiva[3].
Partindo desta premissa, agora numa abordagem
que envolva os atores sociais estudados neste artigo, é possível afirmar que a
prestação de serviços sexuais pelos profissionais do sexo aos seus clientes
consubstancia verdadeira relação de consumo, uma vez que estes desfrutarão dos
serviços sexuais na condição de consumidor final.
Imaginando, por outro quadro, que um prostituto
fosse contratado para prestar serviços sexuais, só que num set de filmagem de
uma empresa especializada na venda e comércio de material pornográfico: nesse
caso, o serviço será utilizado na condição de atividade-meio, que integrará a
cadeia produtiva da venda do material, atraindo, por conseguinte, as regras do
direito do trabalho, com a consequente competência da Justiça Laboral para
julgar a questão (ainda que não reste configurada uma relação de emprego,
notadamente pela eventualidade).
Com base nessas ideias, pode-se afirmar que os
prostitutos que oferecem seus serviços diretamente aos seus clientes
(consumidores finais) praticam verdadeira relação de consumo, de competência da
Justiça Estadual, nos termos do art. 93 do CDC.
Também o enunciado 363 da súmula do STJ aponta
no sentido de que “compete à Justiça estadual processar e julgar a ação de
cobrança ajuizada por profissional liberal contra cliente”.
Alguns críticos dos modelos que admitem a
prestação de serviços sexuais exercidas de forma livre indagam:
Si se sostiene que este es um trabajo de prestación
de servicios personales como cualquier otro, si se considera que prestar el
propio cuerpo para que los hombres satisfagan sus caprichos sexuales no es
diferente a prestar los brazos para realizar otras tareas manuales (por
ejemplo, cortar el pelo o servir bebidas), ¿por qué, entonces, se considera em
este caso que algunos gustos sexuales de los demandantes pueden suponer un
atentado contra la dignidad de estas trabajadoras? ¿No habíamos quedado
en que las prácticas sexuales no se enjuician? O la utilización del cuerpo de
unas personas como instrumento de placer de otras es uma indignidad, o no lo
es. Si es una indignidad, cualquier servicio prestado en el marco de esta
utilización debe considerarse como tal. Pero si se defiende que no es ninguna
indignidad, que no es más que una prestación de servicios como otra cualquiera,
entonces no viene al caso hablar de servicios deseados onodeseados nihay por
qué excluir ninguno de los servicios solicitados por los consumidores de sexo.
Pretender que algunas prácticas demandadas por los consumidores de servicios
sexuales pueden configurar el contenido de uma actividad laboral para las
mujeres que se prestan a realizarlas, y considerar al mismo tiempo que otras
prácticas también demandadas por estos mismos consumidores dan lugar a una
explotación que atenta contra la dignidad de estas trabajadoras,
utilizando además como criterio de distinción entre unas prácticas y
otras los deseos de las propias trabajadoras, pone de manifiesto la
inconsistencia teórica del planteamiento reglamentarista, que por un lado
reivindica tratar la prostitución como un trabajo cualquiera y por otro demanda
que esa reglamentación tenga en cuenta aspectos subjetivos (los deseos de las
trabajadoras) que son ajenos a um trabajo cualquiera (VIGIL; VICENTE, 2006, p.
3).
É certo que a prática sexual pode envolver
situações das mais diversas naturezas, sendo também certo que os gostos
pessoais devem ser respeitados, em virtude da liberdade sexual de cada um.
Contudo, defender que os prostitutos não podem cindir o que consideram moral ou
imoral, digno ou indigno em termos sexuais externa flagrante resquício de
preconceito perante a atividade desempenhada por estes trabalhadores.
De fato, cabe, sim, aos prostitutos definirem os
limites dos atos que estarão dispostos a praticar no desempenho dos seus
serviços (o que é conveniente seja feito na fase pré-contratual). Afinal, como
bem aponta Gey Espinheira (2008), “a prostituição é uma dessas situações
limites em que as possibilidades de ação dos indivíduos são mais amplas que
aquelas contempladas pelas regras institucionalizadas”.
Afinal, os prazeres que estão sendo vendidos não
são ilimitados, e as concepções do que seja digno ou indigno são subjetivas,
não cabendo, aqui, uma regra universal (como pretendem as autoras), o que,
todavia, não serve de argumento para descaracterizar a profissionalização desta
atividade.
2.2.2. A PROSTITUIÇÃO COMO RELAÇÃO DE EMPREGO
Nem todos prostitutos preferem se aventurar a
exercer as suas atividades sujeitos aos infortúnios da noite. Muitos se fixam
em um determinado estabelecimento, em prol de maior segurança, e se subordinam
diretamente ao dono do estabelecimento (este, criminoso, sob a ótica dos nossos
legisladores, nos termos do art. 229 do Código Penal).
Segundo o art. 5º, XIII, da Constituição
Federal, “é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão,
atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer”. Por se tratar
de um direito fundamental, possui aplicabilidade imediata (CF, art, 5º, § 1º),
de forma que, ainda que não exista regulamentação acerca de determinada
profissão (como é o caso da prostituição), a sua atividade, só por isso, não
pode ser obstada[4]. Tem tutela constitucional, portanto, o trabalho da
prostituição.
E é certo que, em muitos destes trabalhos, se
fazem presentes todos os elementos da relação de emprego.
Haverá um trabalho exercido (obviamente) por
pessoa física, e com pessoalidade.
Também se verifica a onerosidade nesta relação,
vez que os serviços sexuais são prestados com intuito de lucro (há animus
contrahendi).
A não-eventualidade também pode estar presente
nesta forma de trabalho, pois há muitos casos em que os prostitutos efetivamente
se vinculam ao estabelecimento onde oferecem os seus serviços.
Finalmente, a subordinação jurídica (aqui, sob o
viés clássico) também se faz presente em muitos casos, pois os prostitutos
recebem ordens do empregador, que fixa a jornada de trabalho, a forma como eles
devem se portar, as normas do estabelecimento onde ocorre a prestação de
serviços sexuais, etc.
Outros prostitutos, por outro lado, preferem
exercer as suas atividades de maneira autônoma, independente, sem subordinação
a nenhum agenciador (ou “lenão”, conforme os termos do Código Penal). Exemplos
desses casos são os profissionais que oferecem seus serviços nas ruas e
avenidas, celebrando o pacto de prestação de serviços verbalmente e diretamente
com os clientes.
Todavia, a subordinação jurídica num contrato de
caráter prostitucional, no tocante ao efetivo desempenho do sexo, deve ser
vista cum grano salis, pois caberá aos prostitutos, e somente a estes,
definirem como a prestação dos serviços será exercida, sem ingerência do empregador
nesta seara. É que o poder diretivo do empregador cede diante de princípios
maiores, como o da autodeterminação sexual.
Em suma, em muitos casos, os elementos da
relação de emprego se fazem presentes na relação prostituto-casa de
prostituição.
Resta definir, agora, se eventual ilicitude na
atividade do empregador (CP, art. 229) é capaz de inquinar de nulidade
contratos desta natureza, de forma a impossibilitar o reconhecimento de
direitos sociais aos prostitutos.
2.3. SOBRE A TEORIA DAS NULIDADES DO DIREITO
CIVIL E DO DIREITO DO TRABALHO
É preciso tecer algumas considerações sobre os
defeitos dos negócios jurídicos (do qual o contrato de emprego é espécie) para,
posteriormente, serem analisadas as peculiaridades da teoria das nulidades do
contrato de trabalho (em contraposição à clássica teoria civil das nulidades).
Todavia, a análise do defeito dos negócios
jurídicos pressupõe uma breve revisão sobre os planos do negócio jurídico,
conforme a clássica teorização de Pontes de Miranda.
2.3.1. DOS PLANOS DOS NEGÓCIOS JURÍDICOS
Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona (2011, p. 359),
definem o negócio jurídico “como sendo ‘a manifestação de vontade destinada a
produzir efeitos jurídicos’, ‘o ato de vontade dirigido a fins práticos
tutelados pelo ordenamento jurídico’, ou ‘uma declaração de vontade, pela qual
o agente pretende atingir determinados efeitos jurídicos admitidos por lei’”.
Por sua vez, Miguel Reale (2001, p. 209) o
conceitua como “ato jurídico pelo qual uma ou mais pessoas, em virtude de
declaração de vontade instauram uma relação jurídica, cujos efeitos, quanto a
elas e às demais, se subordina à vontade declarada, nos limites consentidos
pela lei”.
A doutrina civilista classifica em três as
espécies de planos do negócio jurídico, quais sejam, (a) plano de existência,
(b) plano de validade e (c) plano da eficácia.
Segundo Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona
(2011, p. 342), analisando o plano da existência, é intuitivo que “um negócio
jurídico não surge do nada, exigindo-se, para que seja considerado como tal, o
atendimento a certos requisitos mínimos”.
Por outro lado, “o fato de um negócio jurídico
ser considerado existente não quer dizer que ele seja considerado perfeito, ou
seja, com aptidão legal para produzir efeitos” (GAGLIANO; PAMPLONA, 2011, p.
342); tem-se, aí, o plano da validade do negócio jurídico.
Finalmente, “ainda que um negócio jurídico
existente seja considerado válido, ou seja, perfeito para o sistema que o
concebeu, isto não importa em produção imediata de efeitos, pois estes podem
estar limitados por elementos acidentais da declaração” (GAGLIANO; PAMPLONA,
2011, p. 342). É o plano da eficácia do negócio jurídico, que prevê a
possibilidade de modulação da eficácia do negócio a eventos futuros e certos
(termos), a eventos futuros e incertos (condições), ou a determinados encargos
a serem adimplidos.
2.3.1.1. DO PLANO DA EXISTÊNCIA
O plano da existência do negócio jurídico é
composto pelos seguintes elementos constitutivos: (a) manifestação de vontade;
(b) agente emissor da vontade; (c) objeto; e (d) forma (STOLZE; PAMPLONA, 2011,
p. 360).
Diante da falta de um desses requisitos, diz-se
que o negócio celebrado sequer existe para o mundo jurídico, ou seja, diz-se
que o negócio é inexistente[5]. Com efeito, aponta Marcos Bernardes de Mello
(2012, p. 134):
Neste plano, que é o plano do ser, entram todos
os fatos jurídicos, lícitos ou ilícitos. No plano da existência não se cogita
de invalidade ou eficácia do fato jurídico, importa, apenas, a realidade da
existência. Tudo, aqui, fica circunscrito a saber se o suporte fático
suficiente se compôs, dando ensejo à incidência. Naturalmente, se há falta no
suporte fático, de elemento nuclear, mesmo completante do núcleo, o fato não
tem entrada no plano da existência, donde não haver fato jurídico.
Quanto ao contrato de trabalho prostitucional, é
evidente que ele existirá para o mundo jurídico, mesmo para aqueles que
consideram tal trabalho como ilícito. Haverá manifestação de vontade, emitida
pelos agentes (prostitutos e casas de prostituição) no sentido de celebrarem um
vínculo de emprego, sob determinada forma (que não é pré-determinada, podendo
ser verbal e, até mesmo, tácita), cujo objeto se destina ao oferecimento de
serviços sexuais, mediante remuneração. Com efeito, para a caracterização de um
vínculo de emprego, basta a presença dos elementos analisados alhures.
A questão é saber se há, ou não validade neste
negócio jurídico.
2.3.1.2. DO PLANO DA VALIDADE
Os componentes do plano de validade do negócio
jurídico giram em torno dos mesmos componentes do plano da existência, só que –
como a doutrina didaticamente leciona -, “adjetivados”.
Com efeito, segundo o art. 104 do Código Civil,
“a validade do negócio jurídico requer: I – agente capaz; II – objeto lícito,
possível, determinado ou determinável; III – forma prescrita ou não defesa em
lei”[6].
À luz da doutrina civilista, o desrespeito a um
desses requisitos gerará, a depender da gravidade do vício, uma nulidade ou uma
anulabilidade do negócio jurídico.
A anulabilidade ocorre nos casos de vícios
decorrentes de interesses meramente privados, razão pela qual não podem ser
decretados de ofício, submetendo-se, assim, à necessidade de provocação das
partes, aplicando-se as máximas do nemo judex sine actore, ne procedat judex ex
officio. São hipóteses de anulabilidade do negócio jurídico (a) a celebração do
negócio com agente relativamente incapaz; e (b) vício resultante de dolo,
coação, estado de perigo, lesão ou fraude contra credores (CC, art. 171).
Ademais (diferentemente do que ocorre com os
casos de nulidade, conforme se verá), a decretação de anulabilidade, por girar
em torno, repita-se, de interesses meramente privados, submete-se a um prazo
específico. Com efeito, nos termos do art. 178 do Código Civil, é de 4 anos o
prazo de decadência da ação anulatória de negócio jurídico, que tem natureza
desconstitutiva ou constitutiva negativa.
Já a nulidade do negócio jurídico se relaciona a
interesses de ordem pública, razão pela qual, diferentemente dos casos de
anulabilidade, pode ser declarada ex officio pelo magistrado, e arguida por
qualquer interessado ou pelo Ministério Público (CC, art. 168). Suas hipóteses
estão previstas no art. 166 e 167 do Código Civil:
Diferentemente do que ocorre com a
anulabilidade, os vícios de nulidade do negócio jurídico não são suscetíveis de
confirmação, nem convalescem com o decurso do tempo (CC, art. 169). Por isso se
diz que a ação para declaração de nulidade do negócio jurídico é
imprescritível.
Parte da doutrina sustenta que um negócio
jurídico nulo não tem o condão de gerar quaisquer efeitos no mundo jurídico.
Com efeito, segundo Orlando Gomes, “a teoria clássica das nulidades assenta o
princípio geral de que o ato nulo não produz qualquer efeito: quod nullum est,
nullum producit effectum. A nulidade de pleno direito privaria o ato de toda
eficácia” (2009, p. 425). No mesmo sentido, apontam Cristiano Chaves e Nelson
Rosenvald que “em virtude da gravidade do vício infringido, violado, considera
o ordenamento jurídico que o ato ou negócio nulo não produza qualquer efeito”
(2011, p. 604).
Tal posicionamento, todavia, não é indene de
críticas. Com efeito, salienta Maria Helena Diniz (2005, p. 512):
Mesmo sendo nulo ou anulável o negócio jurídico, é
imprescindível manifestação do Judiciário a esse respeito, porque a nulidade
não opera ipso iure. A nulidade absoluta ou relativa só repercute se for
decretada judicialmente, caso contrário, surtirá efeitos aparentemente queridos
pelas partes; assim, o ato negocial praticado por um incapaz terá, muitas
vezes, efeitos até que o órgão judicante declare sua invalidade.
Seja como for, é relevante notar que a nulidade
do negócio jurídico, na seara civilista, opera efeitos ex tunc, ou seja,
retroage para que as partes retornem ao status quo ante.
Pois bem.
O art. 7º, XXXIII, da Constituição Federal
estabelece que a proibição de trabalho noturno, perigoso ou insalubre a menores
de dezoito e de qualquer trabalho a menores de dezesseis anos, salvo na
condição de aprendiz, a partir de quatorze anos. Contudo, eventual contrato de
trabalho prostitucional celebrado com menores de dezoito anos se releva uma
prática odiosa e inconcebível, esta sim devendo ser reprimida incisivamente
pelas autoridades administrativas com todo o rigor da máquina penal. Configura
crime nos termos do art. 218-B, do Código Penal, submeter, induzir ou atrair à
prostituição ou outra forma de exploração sexual alguém menor de dezoito anos
ou que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário
discernimento para a prática do ato, facilitá-la, impedir ou dificultar que a
abandone. Eventual supressão desse óbice, de lege ferenda, é inconcebível e
inaceitável.
Já em relação à prostituição agenciada exercida
por pessoas capazes e maiores de dezoito anos, é de se reconhecer que o art.
104, II, do Código Civil, especificamente ao exigir que o objeto do negócio
jurídico seja lícito, inquina de nulidade o contrato de trabalho
prostitucional, no atual estado da arte. É que, de fato, há uma ilicitude no
objeto, ao menos por parte do seu “empregador”.
Ou seja, conquanto o contrato de trabalho
prostitucional preencha os requisitos do plano da existência do negócio
jurídico (leia-se, o contrato existe para o Direito), tal contrato, sob a atual
conjuntura legislativa, é inquinado de nulidade pelo fato de haver tipos penais
específicos que penalizam o favorecimento à prostituição (CP, art. 228) e a
manutenção das casas de prostituição (CP, art. 229).
Mas, aqui – e tal observação é de fundamental
importância -, não há que se dar efeitos ex tunc (retroativos) à declaração de
nulidade.
É que, em se tratando de um contrato de
trabalho, há de se aplicar a doutrina trabalhista das nulidades, que é dotada
de algumas peculiaridades em relação à doutrina civil.
Trata-se de uma particularidade da seara
trabalhista que deve ser aplicada, por questões de justiça, a todo contrato de
trabalho prostitucional, vez que a ilicitude deriva única e exclusivamente da
figura do empregador, de modo que tal circunstância não pode prejudicar o
empregado, sob pena de favorecimento da própria torpeza e de inconcebível
prejuízo à parte mais frágil da relação contratual.
2.3.2. DOUTRINA TRABALHISTA DAS NULIDADES E O
CONTRATO DE TRABALHO PROSTITUCIONAL
Ante as peculiaridades que circundam este ramo
do Direito, as nulidades, nesta seara, sofrem certas modulações inconcebíveis
na seara civilista.
Nesse sentido, segundo Maurício Godinho Delgado
(2013, p. 519):
Vigora, pois, no tronco jurídico geral do
Direito Comum a regra da retroação da decretação da nulidade, o critério do
efeito ex tunc da decretação judicial da nulidade percebida.
O direito do trabalho é distinto, nesse aspecto. Aqui,
vigora, em contrapartida, como regra geral, o critério da irretroação da
nulidade decretada, a regra do efeito ex nunc da decretação judicial da
nulidade percebida. Verificada a nulidade comprometedora do conjunto do
contrato, este, apenas a partir de então, é que deverá ser suprimido do mundo
sociojurídico; respeita-se, portanto, a situação fático-jurídica já vivenciada.
Segundo a diretriz trabalhista, o contrato tido como nulo ensejará todos os
efeitos jurídicos até o instante de decretação da nulidade – que terá, desse
modo, o condão apenas de inviabilizar a produção de novas repercussões
jurídicas, em face da anulação do pacto viciado.
O fundamento da diferença entre um e outro ramo
reside no fato de que é inviável, uma vez efetivada a prestação de serviços,
retornar as partes ao status quo ante, pois o trabalho já terá sido prestado e
seu valor transferido, com apropriação completa pelo tomador de serviço.
Outra distinção relevante é o fato de a
transferência e apropriação do trabalho em benefício do tomador criar uma
situação econômica consumada de franco desequilíbrio entre as partes, que
apenas pode ser corrigida – mesmo que parcialmente – com o reconhecimento dos
direitos trabalhistas do prestador (DELGADO, 2013, p. 519).
Todavia, a teoria trabalhista das nulidades é
aplicada em maior ou menor grau, a depender de se lidar com um trabalho
proibido ou com um trabalho ilícito.
O trabalho proibido/irregular é aquele realizado
em desrespeito a alguma norma imperativa vedatória do labor em certas
circunstâncias (ex. trabalho noturno efetuado por menor de 18 anos, o que é
vedado, nos termos do art. 404 da CLT) ou envolvente de certos tipos de
empregados (como o menor de 16 anos que não esteja na condição de aprendiz,
sendo que, neste caso, necessariamente a partir dos 14 anos, nos termos do art.
7º, XXXIII, da Constituição Federal).
Por outro lado, considera-se trabalho ilícito
aquele que compõe um tipo penal ou contribui diretamente para a sua prática.
Exemplo clássico é a atividade desempenhada por aquele que concorre para a
prática do jogo do bicho, atividade vedada nos termos do art. 58 do Decreto-Lei
3.688 de 1941 (Lei das Contravenções Penais). É o entendimento cristalizado
pelo enunciado 199 da Orientação Jurisprudencial da SDBI-I do TST, segundo o
qual “é nulo o contrato de trabalho celebrado para o desempenho de atividade
inerente à prática do jogo do bicho, ante a ilicitude de seu objeto, o que
subtrai o requisito de validade para a formação do ato jurídico”.
A depender de a situação constituir um trabalho
proibido ou um trabalho ilícito, fala-se na (a) aplicação plena da teoria
trabalhista das nulidades; na (b) aplicação restrita da teoria trabalhista das
nulidades; e (c) na inaplicabilidade da teoria trabalhista das nulidades.
No caso da aplicação plena da teoria trabalhista
das nulidades, os efeitos da nulidade se afastam por completo das situações vivenciadas
no Direito Civil.
A situação mais comum ocorre quando se verifica
um defeito no tocante à capacidade do prestador de serviços (CC, art. 166, I e
CC, art. 171, II), em que se tem hipótese de trabalho proibido exercido, por
exemplo, por menor de 16 anos que não esteja na condição de aprendiz (desde que
a partir dos 14 anos). Nessas hipóteses, é de se reconhecer ao menor “todos os
efeitos justrabalhistas ao contrato irregularmente celebrado” (DELGADO, 2013,
p. 520). O mesmo ocorre nos casos dos “defeitos concernentes à forma (como, por
exemplo, a falta de lavratura de instrumento escrito em contrato de atleta
profissional empregado)” (DELGADO, 2013, p. 520), a despeito de restar
configurada ofensa ao art.166, IV do Código Civil.
Por outro lado, a aplicação restrita da teoria
trabalhista das nulidades gera gradações nos efeitos advindos do negócio
jurídico inquinado pela nulidade em virtude do tipo de defeito emergente do ato
jurídico e o bem jurídico afrontado (DELGADO, 2013, p. 520). Nesse sentido, “à
medida que os bens tutelados aproximam-se do interesse público (confrontando o
valor trabalho a outro valor também de inquestionável interesse público),
tende-se a restringir, proporcionalmente, a aplicação da teoria justrabalhista
especial” (DELGADO, 2013, p. 520).
Hipótese clássica da aplicação restrita da
teoria trabalhista das nulidades ocorre nos casos de contratação para serviço
público sem concurso público, o que consubstancia afronta à norma do art. 37,
II e § 2º da Constituição Federal, caracterizando outro caso de trabalho
irregular/proibido. Nesses casos, todavia, o TST só confere parcela de direitos
sociais aos trabalhadores contratados irregularmente no serviço público, aos
quais se negam o direito a verbas rescisórias próprias à dispensa injusta
(aviso-prévio, multa do FGTS e seguro desemprego)
visto que o pacto é nulo. Nesse sentido é o enunciado nº363 da
Súmula do TST, segundo o qual
a contratação de servidor público, após a CF/1988, sem prévia
aprovação em concurso público, encontra óbice no respectivo art. 37, II e § 2º,
somente lhe conferindo direito ao pagamento da contraprestação pactuada, em
relação ao número de horas trabalhadas, respeitado o valor da hora do salário
mínimo, e dos valores referentes aos depósitos do FGTS.
Finalmente, há as hipóteses de inaplicabilidade
da teoria trabalhista das nulidades, prevalecendo, assim, o regramento da
teoria clássica das nulidades do direito civil com seu característico efeito
retroativo (ex tunc). É o que se passa com os casos de trabalhos ilícitos.
É justamente com base neste argumento, ou seja,
pelo fato de o trabalho dos prostitutos supostamente consubstanciar atividade
ilícita, por concorrer diretamente ao tipo penal previsto no art. 229 do Código
Penal, que os tribunais trabalhistas vêm negando direitos sociais a estes
sujeitos.
Por ser considerado ilícito, não vem sendo
reconhecido nenhum direito trabalhista a estes profissionais, pois os tribunais
não têm aplicado a teoria trabalhista das nulidades nestes casos, o que culmina
na aplicação de efeitos retroativos (ex tunc) à declaração de nulidade.
Nesse sentido, vale conferir o seguinte trecho
do voto do Des. Lauremi Camaroski do TRT da 9ª Região proferido nos autos do
Recurso Ordinário nº 7.393 do longínquo ano de 1993 que, apesar de antigo, se
mostra bastante atual no entendimento dos nossos julgadores:
Em sendo a liceidade do objeto elemento essencial à validade
da relação empregatícia, impossível o seu reconhecimento, quando ausente tal
requisito. Se existe alguma alegação de hipocrisia, esta deve ser dirigida não
a Justiça do Trabalho, mas sim ao legislador, que relaciona como figura penal
típica (art. 229 do Código Penal) a manutenção de casa de prostituição, por
conta própria ou de terceiro, não importando a finalidade lucrativa ou a
mediação do proprietário ou de gerente. Ademais, a doutrina e a jurisprudência
trilham sábio caminho ao reconhecer a impossibilidade de vínculo empregatício
em casos que tais, eis que jamais poderá ser aceita a hipótese de prestação de
trabalho subordinado em atividades de prostituição. O empregador, utilizando-se
da mão-de-obra, seria sempre um rufião, auferindo lucros diretos pelo exercício
do comércio carnal, o que criaria situações absolutamente insólitas, agravando
em muito as condições já deprimentes às quais muitas mulheres se sujeitam, não
raro por falta de opções no mercado de trabalho, (sic) nem se diga que deveria
haver proteção somente para as "empregadas", eis que, para todo
direito, há uma obrigação correspondente, não sendo possível imputar um dever
simultaneamente legal e ilícito à parte adversa, ou seja, tal relação de
trabalho estaria inexoravelmente validada pela Justiça Obreira.
Em algumas hipóteses, os tribunais do trabalho
chegam a reconhecer um tipo de vínculo empregatício, só que não em relação à
atividade da prostituição em si, mas apenas quanto às outras atividades ditas
“honestas” e “lícitas” (ex. dançarinas[7], garçonete, copeira[8] e caixas do
estabelecimento[9]).
Todavia, parece que tais posicionamentos e essa
recalcitrância devem ser superados.
Nesse sentido, aponta Manoel Jorge (PAMPLONA;
PEDROSA. Coord. 2010, p. 147):
o trabalho da prostituta, por não se constituir em ilícito
penal, ou, mais ainda, em ilícito de qualquer espécie, ingressa nos domínios do
que se pode denominar amplamente como atividade, ocupação ou trabalho. E, nesse
passo, sendo trabalho, impõem-se os desdobramentos resultantes de atividade
humana lícita, ou seja, a proteção a ser conferida pelo Estado como natural
decorrência do respeito à cláusula da cidadania em sentido amplo
Noutra passagem, o Membro do Parquet salienta
que
reconhecer o trabalho da prostituta e proteger a sua
atividade é viabilizar a elevação de qualidade de vida das pessoas que executam
essa espécie de trabalho, tornando concretamente respeitado o objetivo
fundamental referente à garantia do desenvolvimento nacional.
De fato, os maiores prejudicados com tais
posicionamentos da justiça obreira (proferidos a título de protegê-los) são os
próprios prostitutos que, além de martirizados pela sociedade, e além de serem
deixados no limbo pelo Estado (que não se preocupa nem em regulamentar, nem em
fiscalizar as suas atividades), veem seus direitos sociais negados pelas cortes
que têm por missão constitucional a proteção dos trabalhadores, ficando
relegados a situações que violam os mais comezinhos valores de um estado
democrático, e que tem como fundamentos a dignidade da pessoa humana (CF, art.
1º, III) e os valores sociais do trabalho (CF, art. 1º, IV).
Ora, ao contrário do que foi dito no voto
supramencionado, não parece difícil acreditar que abrir as portas do judiciário
trabalhista e reconhecer direitos sociais aos prostitutos, longe de
desfavorecê-los ou de agravar “em muito as condições já deprimentes às quais
muitas mulheres se sujeitam”, farão com que as suas atividades sejam
desempenhadas com mais dignidade.
O próprio Poder Executivo vem dando
reconhecimento a esta atividade, ao enquadrar a atividade da prostituta na
Classificação Brasileira de Ocupações sob a rubrica de nº 5198[10]). Não
poderia a Justiça do Trabalho andar na contramão deste entendimento.
Manoel Jorge chega a defender que,
de fato, o Poder Público reconhece a atividade das
prostitutas sob o signo de ocupação; não há, todavia, na Constituição de 1988,
atividade humana lícita que possa ser reconduzida à ideia de ocupação, pois o
termo não é conceito constitucionalmente elaborado. Portanto, ao reconhecer a
atividade de prostituta como ocupação, o que fez o Ministério do Trabalho, foi,
em verdade, reconhecê-la como trabalho, ao qual devem ser atribuídos todos os
efeitos jurídicos (FILHO; PEDROSA. Coord. 2010, p. 153).
Ademais, da simples leitura do art. 229 do
Código Penal, que embasa tais posicionamentos, denota-se que, se há alguma
ilicitude nesta relação, parte ela, tão somente, da atividade desenvolvida pelo
“empregador” dos prostitutos, notadamente pelo fato de a atividade exercida por
estes ser perfeitamente lícita.
Ora, penalizar os profissionais do sexo por um
tipo penal que tem outrem como sujeito ativo consubstancia uma interpretação extensiva
que não se coaduna com os mais comezinhos ditames do Direito Penal, do Direito
Laboral e da Hermenêutica.
Tome-se, como exemplo, o empregado dos bicheiros
– exemplo típico de trabalho ilícito (conforme enunciado 199 da Orientação
Jurisprudencial da SBDI-I do TST). O art. 58 da Lei de Contravenções Penais
afirma que é crime “explorar ou realizar a loteria denominada jogo do bicho, ou
praticar qualquer ato relativo à sua realização ou exploração”. Note-se que a
disposição final do tipo penal é expressa em abarcar, além do explorador do
jogo do bicho, aquele que pratica “qualquer ato” destinado à sua realização, o
que abrange, também, os subalternos dos bicheiros que se empreendem nesta
atividade criminosa[11]. Nestes casos, é possível, sim, se falar na
inaplicabilidade da teoria trabalhista das nulidades (sem embargos das
discussões acerca da adequação social deste tipo de atividade), pois a
tipicidade abarca perfeitamente estes “empregados”.
Tal situação, contudo, não se verifica em
relação aos prostitutos, não se podendo inferir, da interpretação dos tipos
penais usados como argumentos para o não reconhecimento do seu vínculo,
qualquer relação com as atividades por eles desenvolvidas. O crime é o de
“manter casa de prostituição”, e não o de prostituir-se.
Ademais, é relevante mencionar que os
prostitutos figuram, para a maioria da doutrina penal, justamente como sujeitos
passivos do delito em questão[12]. Ora, sujeitos passivos do delito são, nas
lições de Zaffaroni (2009, p. 419), os titulares do bem jurídico tutelado pelo
tipo penal. Extrapola as bailas da coerência imaginar ser possível penalizar o
alvo da proteção de um determinado delito argumentando justamente com base
nele, negando aos prostitutos os seus direitos trabalhistas e, por tabela, favorecendo
os únicos criminosos da relação, uma vez que não se veem obrigados a arcar com
nenhum dos direitos sociais das suas “vítimas” (como férias acrescidas do terço
constitucional, gratificação natalina, adicional noturno, horas extras,
descanso semanal remunerado, etc.).
Aliás, como bem aponta Gabriela Leite (2008, p.
61),
os artigos referentes à prostituição foram feitos para
proteger a puta. No entanto, infelizmente, ele teve o efeito contrário ao
desejado. A prostituta acabou no meio da total marginalidade porque aqueles que
a cercam são considerados criminosos e, de alguma forma, transferem essa
condição a ela.
Pela análise dos julgados que enfrentaram a
questão, percebe-se que, em algumas vezes, a prostituição é justamente o
argumento utilizado pelos “exploradores sexuais” para afastar o vínculo e,
assim, se eximirem de suas obrigações, na clara tentativa de se favorecerem da
própria torpeza. Enriquecem através dos serviços dos prostitutos para, em
seguida, quererem se eximir de suas obrigações por conta de uma nulidade a que
deram causa.
Se forem analisadas as consequências dadas pelos
tribunais trabalhistas às outras hipóteses de trabalhos ilícitos, as
contradições tornam-se ainda mais evidentes.
Tome-se como exemplo a hipótese de desempenho de
atividades em condições análogas à de escravo, tipo penal previsto no art. 149
do Código Penal, segundo o qual é crime “reduzir alguém a condição análoga à de
escravo, quer submetendo-o a trabalhos forçados ou a jornada exaustiva, quer
sujeitando-o a condições degradantes de trabalho, quer restringindo, por
qualquer meio, sua locomoção em razão de dívida contraída com o empregador ou
preposto”.
Nestes casos, a pessoa submetida a condições
análogas à de escravo é o sujeito passivo da norma penal, alvo da proteção
estatal. Haverá nulidade no contrato de trabalho (CC, art. 166, II), mas a
constatação de atividades desempenhadas nestas condições implicará, além da
responsabilidade civil e penal do criminoso, a garantia de todos os direitos
trabalhistas à vítima do delito, aplicando-se plenamente a teoria trabalhista
das nulidades.
Ora, a situação é a mesma do que ocorre com
relação aos prostitutos. Com efeito, o único criminoso das situações
verificadas no art. 229 do Código Penal é o mantenedor da casa de prostituição.
Todavia, os tribunais trabalhistas dão, em relação aos prostitutos, tratamento
diametralmente oposto à primeira hipótese conjecturada, a despeito de se
enquadrarem em situações similares, o que viola o próprio critério uniforme e
constante da ideia de justiça de que trata Hart, consistente em “tratar da
mesma maneira os casos semelhantes” (2001, p. 174).
Por outro lado, se existe forte resistência dos
tribunais trabalhistas em reconhecer o vínculo dos prostitutos com o agenciador
do sexo, a mesma resistência, como já mencionado, não se verifica em relação
aos demais empregados desses recintos.
Mas, afinal, baseado em qual fundamento estes
empregados se distinguem do prostituto, cuja atividade, tal qual a daqueles, é
perfeitamente lícita?
Percebe-se que os Tribunais vêm realizando
distinções entre trabalhadores ao arrepio de qualquer previsão legal que as
embasem, fulminando de morte o princípio da isonomia.
A única justificativa plausível para essas
indagações é a constatação de que ainda vige, na mentalidade dos julgadores,
uma grande resistência imposta por preconceitos de ordem moral em relação às
atividades desenvolvidas pelos prostitutos, tal qual se percebe da seguinte
decisão proferida pelo TRT da 4ª Região no Recurso Ordinário nº 01279371/97-8:
(...) no exame da licitude da causa, deve-se
atentar para um aspecto bem pouco estudado. Se o fim econômico da fonte de
trabalho (empregador, empresa ou estabelecimento) não for proibido de maneira
essencial, isto é, se embora sendo imoral, não for vedada a sua atividade pelos
poderes públicos, serão válidos os contratos de trabalho realizados com seus
servidores? Imaginemos uma pensão de meretrício. A nosso ver, é indispensável
que os servidores de tal estabelecimento sejam agrupados em duas correntes
perfeitamente definidas: a primeira, a dos que exercem funções intrinsicamente
imorais, como as prostitutas que geralmente têm subordinação para com uma ou um
principal, e a segunda, a dos que exercem funções intrinsicamente honestas
como, por exemplo, os cozinheiros, os copeiros, as camareiras, etc. É evidente
que os contratos de trabalho dos trabalhadores da segunda categoria são
válidos, o que não ocorrerá, entretanto, com relação aos da primeira. É que,
segundo este critério, é necessário que se distinga entre a causa próxima ou
imediata e a causa remota ou mediata. Segundo o mesmo, ‘só serão válidos os
contratos imorais ou ilícitos proximamente, podendo sê-lo aqueles que, embora
remotamente ilícitos, têm sua prática cercada de moralidade, inclusa na esfera
ética do direito
(Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região. RO nº 01279371/97-8,
TRT da 4ª Região, Relatora Maria Helena Mallmann, Julgado em 06.07.2000).
Alguns dos mais renomados doutrinadores
trabalhistas coadunam com esse entendimento. Nesse sentido, afirma Alice
Monteiro de Barros (2012, p. 415):
Já a atividade exercida pela meretriz em prostíbulo é
ilícita, por ser contrária aos bons costumes, logo não produz qualquer efeito,
e nem sequer a retribuição lhe será devida. O conceito de comportamento
contrário aos bons costumes se deduz quanto ‘a consciência social o repugna e
considera indigno de amparo jurídico o resultado prático do negócio. Se,
contudo, a função executada no prostíbulo ou em outro local do mesmo gênero for
lícita[13], a idoneidade do objeto estará presente e, se aliada aos
pressupostos fáticos do art. 3º da CLT, a relação de emprego configurar-se-á,
não obstante a ilicitude da atividade do empregador. Todos os créditos
trabalhistas lhe serão garantidos
Todavia, nada parece mais equivocado do que
penalizar os possíveis empregados (os prostitutos) com a falta de
reconhecimento do seu vínculo empregatício baseado em pontuações de índole
subjetiva, metajurídicas e, portanto, de questionável idoneidade argumentativa.
Ao arrepio de critérios objetivos, além de gerar grande insegurança jurídica,
tais posicionamentos deixam os prostitutos à mercê das concepções de “moral e
bons costumes” que o juiz do seu processo possui, restando a eles a sorte de
serem julgados por um magistrado "vanguardista".
Na verdade, o fundamento da “moral e dos bons
costumes” não deixa de externar preconceitos no que tange à atividade dos
prostitutos, que sempre foi estigmatizada ao longo dos milênios. E não é raro
perceber argumentos desta jaez sendo utilizados para o combate de outras
situações rechaçadas pelo moralismo equivocado de parte da população. É o que
se verifica em relação às uniões homoafetivas, na mentalidade (atrasada) de
muitos.
Ademais, o que define, afinal, algo como imoral
e violador dos bons costumes? Veicular comerciais com nítido apelo sexual a fim
de angariar consumidores, televisionando-os nas mais diversas mídias, ou
transmitir para todo país a imagem de mulheres praticamente desnudas desfilando
nos carnavais de Rio de Janeiro/São Paulo, viola a moral e os bons costumes?
Seria o fumo ou o consumo de bebidas alcoólicas algo imoral[14]?
Ainda, conforme Beatriz Espejo (apud NUCCI,
2014, p. 63), muitas das mesmas mulheres que consideram uma agressão e um
exercício de poder machista que um homem pague para ter relações sexuais com
uma mulher, veem com bons olhos (ou com indiferença) as relações entre
belíssimas e elegantíssimas jovens unidas a endinheirados e pouco agraciados
varões, pois a isto ninguém chama prostituição. Trata-se apenas de jovens
seduzidas pelo “erotismo do poder”, eufemismo utilizado para justificar dita
situação. No mesmo sentido, aponta Guilherme de Souza Nucci (2014, p. 64):
Há casamentos e outras relações amorosas cultivados em cima
de uma troca nítida e, por vezes, assumida: juventude por dinheiro. Senhores
com seus 60 e tantos anos casam-se com jovens de 20 e poucos anos para lhes dar
conforto material em troca de sexo jovem. Essa permuta, que tem caráter
habitual, é considerada moral – somente por conta do casamento ou da união
estável – e assimilada pela sociedade. As feministas se calam diante dessas
relações, em que há nítida relação de poder do homem rico em relação à moça
mais pobre que ele, mas não fazem o mesmo em face da prostituição. Vender sexo
é somente uma questão de perspectiva; a denominação que se lhe confere, na
prática, é indiferente; se considerada tal venda do ponto de vista da
moralidade ou da ética, ingressa a hipocrisia: depende do ambiente e das
circunstâncias é moralmente aceitável; do contrário, imoral.[15]
Aliás, conforme afirma Simone de Beauvoir (apud
NUCCI, 2014, p. 66), a diferença entre os que se vendem pela prostituição e os
que se vendem pelo casamento localiza-se apenas no preço e na duração do
contrato. Há quem prefira ter vários clientes durante cinco minutos do que o
mesmo homem, que se comporta como um cliente, durante toda a vida.
Nesse sentido, pode-se falar na existência de
dois tipos de prostituição: uma direta, rechaçada socialmente; outra indireta,
aceita no meio social, uma vez que é desempenhada de maneira camuflada,
subreptícia, imbricada no seio de supostos relacionamentos amorosos e
duradouros, onde a prática do sexo é desempenhada com intenção de obter
segurança financeira ou bens materiais. Tal prática, conforme Guilherme Nucci
(2014, p. 68), “não deixa de ser um formato de prostituição, embora em alto
estilo. Nada contra, nem a favor. Cuida-se de um fato ocorrido entre adultos,
no cenário da vida privada, em relação ao qual a sociedade e muito menos o
Estado deve intrometer-se. Entretanto, por uma questão de coerência, há de se
cultivar a igualdade, conferindo o mesmo status à prostituição direta: sem
intromissão social ou estatal”[16].
Não se pode negar, todavia, que a grande maioria
da sociedade não vê mais a prostituição (direta) como tamanha afronta a estes
ideários de índole subjetiva. A sexualidade, nos tempos atuais, tem cada vez
mais se desligado de dogmas morais e religiosos, que a confinavam à intimidade
do marido e da mulher.
As casas de prostituição desempenham suas
atividades em todo lugar da cidade, sem que entidades fiscalizadoras batam às
suas portas para pugnar pelo respeito à moral e bons costumes. Muito pelo
contrário: cobram tributos destes estabelecimentos, que recebem até mesmo
alvará de funcionamento. É uma hipocrisia penalizar o lado mais frágil desta
relação por taxá-la de imoral. A contemporânea Justiça do Trabalho tem especial
importância na superação destes vetustos posicionamentos.
Seja qual posição ideológica se adote em relação
à legalização da prostituição, uma coisa é certa: salvo no caso dos modelos
proibicionistas (que repugnam a prostituição sob todas as suas vertentes, a
exemplo do que ocorre nos EUA), os demais movimentos veem nos prostitutos
vítimas que merecem ser protegidas, seja da “exploração sexual” da qual se
devem ser afastadas (abolicionistas), seja da hipocrisia reinante na
sociedade que aceita a sua atividade mas a relega à clandestinidade
(legalistas). É como diz Beatriz
Gímeno (2008, p.1):
Casi nadie discute que cuando hablamos de
prostitución hablamos, en gran parte de pobreza, de injusticia, de desigualdad.
Intentar por todos los medios buscar soluciones para conceder los derechos
básicos de ciudadanía a las personas que se dedican a la prostitución, en eso,
creo que todas estamos de acuerdo.
Dessa forma, se crê que o reconhecimento
judicial dos vínculos empregatícios dos prostitutos com as casas nas quais
trabalham (com fundamento na teoria trabalhista das nulidades) agradaria
qualquer das citadas vertentes, pois conferiria, sem dúvidas, maior proteção
aos trabalhadores do sexo[17].
Ademais, tal reconhecimento externaria nada mais
do que uma coerência dentro do sistema normativo laboral, além de representar a
concretização da justiça para estes obreiros, que já são suficientemente
estigmatizados pela sociedade para, além disso, também o serem pelos tribunais
do trabalho (por argumentos – data vênia - inconsistente e/ou metajurídicos).
Por todo o analisado, não obstante a nulidade do
contrato de trabalho (já que a atividade do empregador é ilícita, à luz do art.
229), crê-se plenamente possível reconhecer, na atual conjuntura normativa, o
vínculo empregatício dos prostitutos com as casas de prostituição, através da
aplicação plena da teoria trabalhista das nulidades, garantindo, com isso, os
direitos sociais destes trabalhadores que, arduamente, trabalham dignamente
(sim!) em prol da sua subsistência.
Autor
·
Analista Judiciário - Área Judiciária do Supremo
Tribunal Federal. Graduado em Direito pela Faculdade Baiana de Direito e
Gestão. Pós-graduando em Direito Administrativo pela Universidade Anhanguera.
Fonte: https://jus.com.br/
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