A partir do final da tarde, a
Orla de Salvador se transforma. Na
calçada, mulheres desfilam e como se fossem estrelas de um grande espetáculo.
Assim se pode montar o palco da madrugada na Pituba, Amaralina e Barra, por
exemplo. Frequentada por clientes de todos os tipos, que buscam sexo, rápido,
fácil e descomprometido, as boates e as calçadas contam com a serventia de
“garotas” (sejam mulheres ou transexuais) bonitas e provocantes.
O vereador Claudio Tinoco (DEM)
solicitou, nesta segunda-feira (15), que a Secretaria Municipal de Urbanismo
(Sucom) fiscalize as casas de prostituição instaladas na orla de Salvador.
O edil já havia questionado a
existência de estabelecimentos do tipo no município no ano passado (veja aqui),
mas decidiu solicitar a intervenção da pasta após receber panfletos de uma nova
casa no bairro do Rio Vermelho que realiza shows eróticos. “Nós já vínhamos
fazendo o mapeamento dessas casas, além de uma análise jurídica pra definir a
estratégia de abordagem desta questão. Mas nas últimas semanas eu comecei a ser
abordado por moradores e comerciantes do Rio Vermelho que reclamavam e, no
sábado (13), eu recebi um cartão de uma casa recém instalada no Largo de
Santana, o Hot Café”, explicou.
Segundo Tinoco, há dois
desdobramentos que podem indicar o funcionamento irregular das casas instaladas
na orla. “Primeiro, solicitei averiguações da Sucom sobre a regularidade das
licenças e alvarás que esses estabelecimentos possuem para estarem funcionando.
Fora a permissão pra fazer publicidade. Se eles só têm licença para ser bar e
têm striptease, está ilegal. Esperamos que a secretaria possa avaliar e quem
sabe interditar a casa”, detalhou. “A partir daí, vamos entrar com representação
no Ministério Público, porque pode fugir dessa questão. Tem que descobrir se
tem exploração sexual, se porventura tem menores de idade”, completou.
O vereador afirmou que, apesar de
ter baseado a solicitação em um caso específico, já possui informações de
outras empresas que oferecem stiptease e até suítes gratuitas. “O caso do Rio
Vermelho chamou atenção porque a propaganda foi feita a céu aberto. É um bairro
recentemente requalificado, com novos espaços de convivência. Nós ainda estamos
na alta estação, com muitos turistas passando por lá. Uma casa se aproveitar da
nova dinâmica da área pra promover a prostituição é, no mínimo, indevido, um
constrangimento”, criticou.
Fonte: Bahia Noticias e Tribuna
da Bahia
Salvador tem prostituição desterritorializada
Infográfico: Ian Thommas
É só andar pelas ruas de Salvador
que se nota uma mudança no espaço e na forma de ocupação da cidade. Houve uma
época, entre os anos 50 e 70, em que locais de prostituição estavam no auge e
concentravam-se na Ladeira da Montanha, entre o Comércio e a Cidade Alta, como
o Cabaré dos Coronéis - o Tabaris - situado na rua Chile. Estes locais eram
frequentados pela classe média, enquanto a Rua Manoel da Nóbrega, no
Pelourinho, tinha uma prostituição voltada para as classes baixas. Hoje, há um
gradual processo de desterritorialização da atividade.
O antropólogo e professor Roberto
Albergaria conta que no final dos anos 60 para 70 aconteceu o declínio da
Ladeira da Montanha e dos chamados “bregas”. Com a Revolução Sexual de 1970, a
sociedade mudou e as relações sexuais começaram a acontecer mais cedo e não
somente após o casamento. A prostituição de rua ficou para atender a um estrato
da população de menor renda, em estabelecimentos de baixo meretrício. Para
Albergaria, a prostituição se adaptou às novas demandas do mercado, a despeito
das mudanças de costumes. “Hoje não há mais pontos específicos de prostituição.
Se eu pudesse dizer um lugar, diria ‘as redes’, a internet, o telefone/celular
etc”, afirma.
Os avanços das tecnologias
trouxeram novos mercados para o ramo na internet. Em texto publicado na web, o
psicólogo Roberto Ceccarelli defende que este campo de atuação não para de
aumentar. Segundo ele, nos meios de comunicação, o número das propostas de
“serviços personalizados” é cada vez maior. Seja por meio de anúncios, na
televisão, via celular, através do
Whatsapp, aplicativo de mensagens instantâneas para smartphones; as redes fazem
parte do mercado erótico contemporâneo. “Quase todas as fantasias sexuais podem
ser realizadas mediante pagamento. Surgiu, a partir daí, a prostituição
virtual: sexo vendido por meio de imagens fotográficas, filmes, e mesmo ‘ao
vivo’, via webcam”, desenvolveu Ceccarelli.
Os sites que divulgam o trabalho
de garotos e garotas de programa estão em alta. Muitos optam por construir
blogs próprios a fim de evitarem os pagamentos para a divulgação de suas fotos
em site especializados. É comum, também, o uso de fóruns de prostituição, no
qual as pessoas pesquisam e comparam preços e serviços de prostitutas. Estas
práticas fazem com que o cliente tenha o serviço em casa, sem se expor às casas
de strip-tease. Em paralelo, cresce o número de agências de encontros e de
garotas de programa e acompanhantes, também chamadas de call girls ou scort
girls. Para uma profissional que acompanha executivos e empresários em festas e
recepções, é fundamental que nada a identifique como prostituta. Os critérios
são completamente diferentes de quem se prostitui na rua. Em vez de manter sua
atividade em segredo, ela deve deixar claro quem é e o que faz para ser
identificada e abordada pelos clientes.
Segundo historiadores, a
prostituição é uma das profissões mais antigas do mundo. A prática era muito
comum nas primeiras civilizações da Mesopotâmia, Egito e Grécia. A partir do
século XII, a prática passou a ser regulamentada e protegida pela lei. No
século XVI, com a Reforma Religiosa, a prostituição caiu na clandestinidade. Já
com a Revolução Industrial, as mulheres precisaram enfrentar condições
desiguais no trabalho em relações aos homens. Prostituir-se em troca de
favores, de melhores condições de vida, revelou-se uma opção.
A prostituição de rua ainda é uma realidade
Existem pontos na cidade onde a
prostituição ainda é uma característica marcante. A Orla de Patamares é um
destes locais, sobretudo o trecho próximo à entrada da Avenida Pinto de Aguiar,
em um muro próximo ao campo de futebol do bairro e uma região em frente a um
antigo salão de beleza, que já funcionou como bar. O Comércio, a Ladeira da
Montanha e sua paralela, a Ladeira da Conceição, são locais históricos de
prostituição favorecidos pela proximidade com a zona portuária da cidade. As
duas entraram em um processo de degradação associado ao desgaste físico de seus
casarões (na maioria abandonados) e ao tráfico de drogas, sobretudo a
frequência de usuários de crack.
Outros pontos de prostituição são
a Praça da Sé, a Barroquinha e, de forma mais dissipada, outros trechos da
Orla. Nestes casos, os personagens são, principalmente, mulheres de classe
baixa. Pesquisa do Projeto Força Feminina, instituição social soteropolitana que
tem por missão favorecer a promoção integral das mulheres em situação de
prostituição, aponta que 40,6% das mulheres são negras, 55,2% sustentam a casa
e mais de 60% delas entraram na prostituição com menos de 20 anos.
Joana Santos* tem 42 anos e até o
ano passado fazia programas na Ladeira da Montanha. Hoje em dia não trabalha
mais com programas e faz alguns “bicos” como manicure. Joana trabalhou durante
23 anos em uma casa de prostituição e revelou que, há algum tempo, o lugar era
mais organizado e seletivo. Não eram aceitas mulheres com envolvimento com
drogas e era preciso entregar carteira de saúde. “A gente tinha que usar salto
alto, andar sempre arrumada e ficar dentro dos estabelecimentos. Os homens que
frequentavam tinham um melhor poder aquisitivo”, acrescenta.
Na prostituição de rua, é
frequente a briga pelo ponto. As garotas ou travestis já têm seus pontos
específicos de trabalho: estes são locais onde se encontra determinado grupo de
garotas. As vezes, apenas uma pessoa é considerada “dona” do ponto ou da
esquina. Funciona como uma vitrine para quem passa: neste caso o corpo é o
produto. Não é permitido outra pessoa tomar o lugar de alguém que já tem seu
ponto, esta é uma regra entre as próprias prostitutas. Quando isto ocorre, as
brigas chegam a tomar grandes proporções.
As novas donas das ruas
Outro grupo que têm se destacado
nos últimos anos, por estarem nas ruas em situação de prostituição, são as
travestis. Segundo Albergaria, com a revolução de 1970, há uma inversão de
papéis e, como consequências disso, as travestis passaram a ser mais aceitas,
quando se fala no mercado do sexo. “Já existiam travestis desde o século XIX,
mas houve uma ‘virada’, com ícones como Roberta Close e Leo Kret”, explica o
antropólogo, sobre a popularização de travestis na cidade. Cerca de 90% das
travestis de Salvador se prostituem. Segundo Millena Passos, Presidente de
Associação de Travestis de Salvador, na cidade cerca de 150 travestis vendem
seus corpos nas ruas. Estas têm pontos específicos bastante conhecidos e
específicos. Os principais são na Pituba – ao longo da Manuel Dias, nas ruas
transversais e paralelas, como a Minas Gerais, a Amazonas e a Maranhão; nas
proximidades dos motéis de Itapuã; em Patamares, sobretudo na Avenida Pinto de
Aguiar; na Cidade Baixa, no Largo de Roma; e no Centro, ao longo da Avenida
Carlos Gomes. “A maioria está na rua porque não tem alternativa de trabalho. As
poucas opções são ser cabeleireira, esteticista ou cursar enfermagem”,
argumenta Millena.
Prostituição masculina
Os garotos de programa de
Salvador normalmente atendem pessoas de todos os sexos, sobretudo outros homens
e principalmente homossexuais. Em menor proporção, quando comparados com as
mulheres, também é possível encontrá-los nas ruas. “Durante o dia, no Porto da
Barra. Durante a noite, é necessário ir ao Beco dos artistas ou à Avenida
Carlos Gomes para encontrar um garoto de programa”, afirmou o professor
Maurício Tavares, que é articulista do Trabalho Com Sexo. O grande forte da
prostituição masculina, porém, vem sendo as saunas gays e, é claro, o espaço
virtual.
*nome fictício
Fonte: www.correio24horas.com.br
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