quinta-feira, 17 de março de 2016

Justiça proíbe 12 homens por dia de chegar perto de mulheres em SP

Em janeiro, a produtora cultural Márcia (nome fictício), 46, decidiu procurar a polícia em razão das agressões que sofria do marido. “Apanhei durante cinco anos. Muitas vezes, nós, mulheres, fazemos concessões. Eu não denunciava por causa do meu filho, mas comecei a temer pela minha vida”, conta.


Ela foi a uma delegacia da mulher na capital paulista e fez um boletim de ocorrência. Um dia depois, a Justiça determinou que o marido não poderia mais se aproximar de Márcia nem do filho do casal.

A aplicação desse tipo de medida, quando a Justiça impõe um limite de aproximação entre o agressor e a mulher, cresceu 26% na cidade de São Paulo de 2013 a 2015 –e já beira 12 casos por dia.

Prevista na Lei Maria da Penha, é a mais extrema entre as chamadas medidas protetivas –que visam proteger mulheres vítimas de violência ou ameaçadas. Além dessa, há outros tipos, como separação forçada e proibição de visitas a filhos.

Existem 71 mil processos relacionados à violência contra a mulher correndo na Justiça na capital. Investigações e processos criminais, mais demorados, trafegam em paralelo às medidas protetivas, que têm caráter de urgência.

Essas ações só ganharam força em 2012, quando a Lei Maria da Penha, aprovada em 2006, foi declarada constitucional pelo Supremo Tribunal Federal.

Em São Paulo, o Tribunal de Justiça começou a compilar dados em 2013, quando houve 3.445 dessas proibições de aproximação. Em 2015, chegaram a 4.326.

SOCIEDADE

O aumento é comemorado por especialistas em direitos humanos pelo fato de as mulheres estarem buscando ajuda, mas não significa que a violência tenha diminuído.

“As mulheres conhecem melhor a lei, mas a maioria dos casos ainda não é informada”, diz Ana Paula Lewin, coordenadora do grupo de defesa da mulher da Defensoria Pública de São Paulo.

“A população hoje cobra mais efetividade no combate a essa violência. Foram criados mecanismos como delegacias da mulher e grupos de apoio na Defensoria e no Ministério Público”, diz Ana Lucia Keunecke, da Artemis, ONG de defesa das mulheres.

No caso de Márcia, o agora ex-marido se afastou após a proibição. “Ele sumiu, ficou intimidado quando soube que poderia ser preso se descumprisse a medida”, conta.

Nem sempre é assim. Fazer cumprir as medidas protetivas é um dos principais entraves da Lei Maria da Penha. “Ter um papel da Justiça não garante segurança”, afirma a defensora Ana Lewin.

Há dois problemas, dizem especialistas: nem sempre a polícia dá proteção às vítimas, e a Justiça tem dificuldade em intimar o agressor. “Muitas são assassinadas mesmo tendo medidas protetivas e boletins de ocorrência”, afirma Ana Lucia Keunecke.

Em alguns Estados, como o Rio Grande do Sul, estão sendo usados “botões do pânico” e tornozeleira eletrônica, que avisam a polícia em caso de aproximação do agressor.

Em SP, prefeitura e Ministério Público criaram, em 2014, o programa Guardiã Maria da Penha. Agentes da guarda civil visitam 160 mulheres para garantir que os agressores não se aproximem delas.

Uma das criadoras do programa, a promotora Silvia Chakian diz que mulheres que continuam em relacionamentos violentos ainda são criticadas pela sociedade.

“As pessoas precisam ver que às vezes a própria mulher não se enxerga como vítima, não vê o parceiro como criminoso. Ainda existe a dependência financeira, a psicológica. Em outros casos, a mulher teme ser vista pelos filhos como o fator que rompeu a família. Isso tudo contribui para que ela não saia daquele círculo de violência.”


Fonte: (Leandro Machado) Folha de S.Paulo

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