domingo, 13 de março de 2016

Ensaio publicado em jornal vaticano sugere que as mulheres deveriam pregar na missa

Uma série de ensaios no jornal semioficial do Vaticano insta a Igreja Católica a autorizar que mulheres preguem no púlpito durante as missas, função que tem estado reservada quase que exclusivamente ao sacerdócio masculino por quase 800 anos.

 A reportagem é de David Gibson, publicada por Religion News Service, 02-03-2016. A tradução é de Isaque Gomes Correa.

“Este tópico é delicado, porém acredito ser urgente o abordarmos”, escreveu Enzo Bianchi, líder de uma comunidade religiosa ecumênica do norte da Itália e famoso comentador católico, em seu artigo no L’Osservatore Romano.

“Com certeza, para os leigos fiéis em geral, mas sobretudo para todas as mulheres, esta seria uma mudança fundamental para a participação delas na vida da Igreja”, afirmou Bianchi, que considerou uma tal reforma como um “caminho decisivo” para a resposta aos pedidos generalizados – inclusive do Papa Francisco – para se achar meios de dar a elas um papel maior na Igreja.

Duas irmãs consagradas também contribuíram com artigos publicados em uma seção especial de 1º de março, seção que faz parte de uma nova série do L’Osservatore Romano sobre a mulher intitulada “Mulheres Igreja Mundo”.

Em sua coluna, a Irmã Catherine Aubin, dominicana natural da França que leciona Teologia na Pontifícia Universidade em Roma, observou que Jesus incentivou as mulheres a pregarem a sua mensagem de salvação, e disse que, ao longo da história da Igreja, existiram muitas evangelistas extraordinárias. Hoje também as mulheres conduzem retiros e, com efeito, pregam de outras formas, argumentou.

“Façamo-nos”, escreveu Aubin, “sinceramente a seguinte pergunta: Por que as mulheres não podem também pregar em frente de todo mundo durante a celebração da missa?”

Uma outra irmã dominicana, Madeleine Fredell, da Suécia, escreveu que a pregação “é a minha vocação como dominicana, e embora eu não o possa fazê-la na maioria dos lugares, às vezes nem mesmo em uma comunidade luterana, creio que a escuta da voz de mulheres no momento da homilia enriqueceria o nosso culto católico”.



Caso isso aconteça, uma tal mudança causaria polêmica.

No começo do século XIII, como parte do movimento em direção à consolidação do poder católico no papado e no clero, o Papa Gregório IX efetivamente proibiu os leigos – homens não ordenados e mulheres – de pregar, especialmente sobre assuntos teológicos ou doutrinários, temas que eram considerados a província dos clérigos.

Embora exceções ocasionais fossem permitidas, foi somente no começo da década de 1970 que houve indícios de se reconsiderar esta proibição, estimulado pelos crescentes apelos para que as mulheres – e os leigos em geral – assumissem mais funções e responsabilidades na Igreja. Em seu artigo, Bianchi notou que, em 1973, o Vaticano deu aos bispos alemães a permissão de autorizar leigos, entre eles muitas mulheres, a pregar com permissão especial durante um período experimental de oito anos.

Mas a eleição em 1978 de São João Paulo II, papa conservador em termos doutrinais, deu início a um período de proibições mais estritas.

O Código de Direito Canônico revisado que João Paulo II promulgou em 1983 afirmava que a homilia “está reservada ao sacerdote ou ao diácono” porque faz parte integral da missa e deve ser feita por um homem ordenado atuando no papel de Cristo.

Então, em 1997, um documento do Vaticano apoiado por oito diferentes departamentos da Cúria Romana buscava reforçar ainda mais a proscrição contra a pregação dos leigos; o texto também advertia os bispos que eles não podiam autorizar nenhuma exceção.

No entanto, na mesma época em que o Vaticano estava reforçando a distinção entre leigos e clérigos ordenados, os leigos – entre eles muitas mulheres – estavam desempenhando um papel mais visível na missa como leitores e ministros da Eucaristia. As meninas também haviam sido permitidas a atuarem como coroinhas, prática que se tornou generalizada.

Estas mudanças levaram uma série de conservadores a condenar a “feminização” da Igreja Católica, e quaisquer propostas sérias em permitir que as mulheres pregassem certamente aumentaria a ansiedade deles.

O argumento para uma mudança nesse sentido não é que ela estaria “modernizando” a Igreja, mas, pelo contrário, está remontando à tradição dos primeiros anos do cristianismo, onde, conforma Bianchi e outros ensaístas observam, elas regularmente recebiam a permissão para pregar e, frequentemente, o faziam em frente dos sacerdotes, bispos e mesmo do papa.


Na verdade, Maria Madalena era conhecida como “a apóstola dos apóstolos” porque os Evangelhos contam como Jesus apareceu primeiramente a ela na manhã de Páscoa, e a enviou para dar a notícia da ressureição – a crença cristã fundamental – aos seguidores masculinos de Jesus.

O que, portanto, Francisco vai fazer?

O pontífice tem repetidamente pedido por uma maior participação das mulheres na Igreja, porém ele também reiterou a proibição contra a ordenação feminina ao sacerdócio e advertiu contra a “clericalização” delas, com as tentativas de torná-las cardeais ou focando-se em promovê-las a cargos eclesiásticos mais altos.

De qualquer forma, que o próprio jornal do Vaticano dedique tanto espaço para a questão das mulheres pregadoras é, em si, algo intrigante, disse Massimo Faggioli, historiador da Igreja e professor da Universidade de St. Thomas, em Minnesota.

“Eu acho que isso é um grande sinal”, completou ele.


Fonte: Ihu

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