Em um relacionamento abusivo, o parceiro pode não ter matado ou agredido a mulher (ainda), mas a prende em um relacionamento destrutivo e muito danoso. Tudo partindo da premissa que “mulheres são coisas e essa coisa é MINHA”.
por Aline Valek
Experimente fazer uma busca no
Google com o termo “inconformado com o fim do namoro”. Deixe que o próprio
Google te mostre a triste realidade de mulheres assassinadas, sequestradas e
agredidas pelos ex-parceiros. É assustador.
Não poucas vezes a mídia noticia
casos de assassinato de mulheres pelos ex como “crime passional”. Mas não há
nada de passional nisso. Não são homens que “amaram” demais e, por não
suportarem a rejeição, resolveram agir drasticamente como se fossem personagens
de um romance shakespeariano. Trata-se, na verdade, de um crime de ódio
motivado por uma ideia simples e perversa: mulheres são coisas. Esses homens
compraram essa ideia, acreditaram que suas companheiras eram suas posses.
Acreditaram que eles tinham direito sobre o corpo e sobre a vida dessas
mulheres a ponto de tirar-lhes a vida, se assim eles desejassem. Não é absurdo?
Esses casos mostram o extremo
para onde a ideia “mulheres são coisas” pode levar, mas essa ideia se manifesta
também no dia-a-dia de quem vive um relacionamento abusivo. Em um relacionamento
abusivo, o parceiro pode não ter matado ou agredido a mulher (ainda), mas a
prende em um relacionamento destrutivo e muito danoso. Tudo partindo da
premissa que “mulheres são coisas e essa coisa é MINHA”.
Espero de verdade que não seja o
seu caso, mas você sabe dizer se está em um relacionamento abusivo? Existem
algumas pistas que podem indicar se você está presa em uma cilada dessas.
(antes, uma observação:
relacionamentos abusivos podem não acontecer apenas em relações heterossexuais;
mas, como dentro da nossa sociedade machista existe uma óbvia relação de poder
de homens sobre mulheres, este é o recorte que escolhi para o texto)
1. Possessividade e controle:
esse é o principal indício de que você pode estar com um cara abusivo. Ele tem
ciúmes dos seus amigos, de pessoas do seu trabalho, até de familiares? Controla
com quem você pode falar ou com quem você pode sair? Vigia suas mensagens,
exige senha do seu e-mail e redes sociais? Desconfia constantemente de você, te
acusa de traição sem motivos? Controla as roupas que você usa? Tenta isolar
você só pra ele? Olha, o alarme já soou por aqui. Essa possessividade indica
que o cara acredita que você é uma coisa, e não um ser humano autônomo e
independente. E a gente já sabe o perigo que essa ideia representa, né?
2. Comportamento agressivo: nem é
preciso partir para o espancamento para você descobrir que está em um
relacionamento perigoso. Ele usa formas de contato físico para te ameaçar, como
te segurar com força pelos braços ou te empurrar? Ele soca, chuta e derruba
coisas para te intimidar? Já te ameaçou com uma arma? Amiga, fuja desse cara
sem olhar pra trás.
3. Força sexo: não é sua
obrigação como mulher ou namorada fazer sexo com seu parceiro. Você disse “não”
e mesmo assim ele te forçou a fazer algum ato sexual? Ele já tentou fazer sexo
com você enquanto você estava dormindo, contra a sua vontade? Ele já te ameaçou
ou fez alguma chantagem emocional para que você concordasse em fazer sexo com
ele? Sexo sem consentimento significa uma coisa: estupro. Um cara que não
respeita o seu “não” já te enxerga como uma coisa desprovida de vontade.
4. Coloca você pra baixo: um
relacionamento abusivo não é uma relação de igual para igual, mas sim uma das
partes tentando exercer poder sobre a outra. O cara abusivo vai colocar você
para baixo para poder se sentir poderoso. Ele humilha você com xingamentos ou
apelidos pejorativos? Desvaloriza tudo o que você faz? Faz você se sentir feia,
burra ou incapaz? Fica com raiva quando você demonstra independência,
inteligência ou força? Ele te ofende e faz você passar por constrangimentos?
Com isso, ele está destruindo uma das suas armas mais poderosas: sua
autoestima. Há homens que acreditam que se puderem enterrar a autoestima da
mulher sob vinte metros de concreto, ela estará mais suscetível a tolerar uma
merda de relacionamento.
5. Desrespeita outras mulheres:
fique atenta ao histórico do cara com quem você vive ou se relaciona. Ele
maltrata outras mulheres, como a mãe, a irmã, a empregada, amigas, colegas de
trabalho, desconhecidas na rua? Não fique indiferente ao comportamento
agressivo do cara em relação a outras mulheres, pois nada impede que ele faça o
mesmo com você.
6. Manipula: ele faz chantagem ou
joguinhos para que você faça exatamente o que ele quer? Ele te pune e te impõe
restrições se você o desobedece? Ele te coloca em situações em que você precisa
da permissão dele para alguma coisa? Ele te proíbe de falar com os parentes
para impedir que você conte o que acontece entre vocês? Ele te culpa por um
abuso que ele tenha cometido contra você? Depois de um abuso ele se torna
repentinamente carinhoso e romântico para que você o desculpe? Ele te ameaça ou
faz qualquer tipo de chantagem caso você ameace abandoná-lo? Ele ameaça se
matar caso você termine o relacionamento?
Se sim, lamento informar, mas
você está em um relacionamento abusivo. Ou, na mais utópica das hipóteses, com
um cara MUITO babaca.
“Estou em um relacionamento
abusivo. E agora?”
Bem, só tenho um conselho para te
dar: sai dessa. Corre. É uma cilada.
Claro que não é fácil assim. E eu
te entendo, de verdade. Por isso o relacionamento abusivo é uma armadilha tão
perigosa: porque te coloca numa situação difícil de sair, seja por ter tornado
você dependente do cara financeira ou emocionalmente, seja por fazer você
sentir medo ou culpa ou ainda aquela esperança de que você possa “salvar” o seu
namoro ou casamento. Mas sua vida está acima de um namoro ou de um casamento. O
caso é grave e não dá para arriscar sua vida, seu bem estar e sua integridade
física desse jeito.
Se for difícil, conte para
familiares e amigos mais próximos. Tenho certeza de que você terá muitas
pessoas ao seu lado para te apoiar e te proteger nesse momento.
E se o cara te trata dessa forma,
ele não vale a pena MESMO. Eu te garanto: você não vai estar perdendo nada.
Além disso, não caia na ilusão de que você tem a “missão” de consertar este
cidadão. Você não é obrigada.
Acima de tudo, o mais importante
e que eu destacaria com um marcador colorido e glitter se fosse possível: NÃO É
CULPA SUA.
Podem dizer que você foi burra
por ter se envolvido com um cara assim, que a culpa foi sua por não ter
percebido antes, que a culpa foi sua por ter deixado ele abusar de você, que
você foi ingênua, fraca, submissa. Não acredite. Não é verdade. A culpa aqui é
do cara que abusou de você, te ameaçou, tentou te controlar ou te agredir. Pro
inferno com essa gente que tenta transferir a culpa para quem só se ferrou na
história toda.
No mais, se ele te agrediu,
continua te ameaçando ou te perseguindo, procure uma Delegacia da Mulher e
denuncie.
A vida é curta demais para perder
tempo com quem trata você como coisa.
Força.
Fonte: Carta Capital
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