Francisco dá passos importantes
no sentido de abrir, na Igreja, o debate sobre sexualidade. Para adequar a
Igreja aos tempos atuais, Francisco convocou para outubro, em Roma, o Sínodo da
Família, que debaterá os novos perfis familiares, e deu um basta na homofobia. Se
sexo fosse pecado, Deus não teria criado uma forma tão prazerosa de gerar vida.
Mas não é o sexo que o debate católico deve priorizar. É o amor. Todos os
abusos sexuais decorrem da falta de amor.
A 9 de junho o papa Francisco
ordenou a criação do tribunal vaticano para julgar bispos acusados de pedofilia
e por acobertarem padres denunciados por violência sexual, o que considerou
"abuso de poder.”
O tribunal funcionará dentro da
Congregação para a Doutrina da Fé (antigo Santo Ofício), a mais importante instância
católica depois do papado.
Ano passado, a ONU acusou a
Igreja Católica de não combater a pedofilia e facilitar o acobertamento de
denúncias. Francisco instalou, então, uma comissão de 17 pessoas, inclusive
representantes das vítimas de abuso sexual, para investigar a ocultação desses
crimes.
Sexo sempre foi tabu nas Igrejas.
É o que menos se fala e muito se faz. A começar do fato de todos os papas,
cardeais e bispos serem frutos da relação sexual entre um homem e uma mulher.
As influências da teologia do
apóstolo Paulo, educado pela escola puritana dos fariseus e, mais tarde, de
Santo Agostinho, discípulo de Platão, cuja filosofia antepõe corpo e espírito,
induziram os católicos a verem no celibato de Jesus um exemplo a ser universalmente
abraçado por sacerdotes. Não se leva em conta que o próprio Jesus não
considerava o celibato exigência a seus apóstolos, tanto que escolheu como
primeiro papa um homem casado, Pedro, cuja sogra ele curou (Marcos 1, 31).
A virgindade de Maria, mãe de
Jesus, passou a ter mais importância que seu hino à justiça social, o
Magnificat (Lucas 1, 46-55), e sua fidelidade aos valores evangélicos.
Até meados da década de 1960, a
Igreja Católica abrigava adolescentes em seminários, privados de contatos com
mulheres, no intuito de cultivar neles a vocação ao celibato exigida pelo
sacerdócio. Ali tinham início distorções e perversões, como a prática de
pedofilia.
Todo pastor é um homem imbuído do
poder de tocar a alma humana. Quem convive com gurus religiosos sabe que
precisam estar alertas em relação a certas mulheres que, ao despir a alma,
facilmente despem também o corpo... Algo parecido ocorre em consultórios de
psicanálise. Daí a importância de uma formação sólida para quem lida com a
subjetividade alheia, manipulável pela religião.
Francisco dá passos importantes
no sentido de abrir, na Igreja, o debate sobre sexualidade. O tema está
interdito entre os católicos desde o século XVI, quando se formulou a doutrina
ainda vigente e incompatível com os avanços científicos e morais da
modernidade, como a exigência de que toda relação sexual tenha por finalidade a
procriação, e a proibição do uso de preservativo.
Para adequar a Igreja aos tempos
atuais, Francisco convocou para outubro, em Roma, o Sínodo da Família, que
debaterá os novos perfis familiares, e deu um basta na homofobia. A
homossexualidade é, agora, reconhecida pela Igreja Católica como tendência
natural, merecedora de respeito e direitos.
A pedofilia é uma perversão
praticada também no interior de famílias e instituições que lidam com crianças.
Porém, outras anomalias são frequentes na Igreja, como a dupla moral (a que se
prega e a que se vive), a sedução que cria dependência afetiva, o uso do
conceito de pecado e do medo do inferno como diabólica maneira de manipular
consciências infantilizadas e privadas de discernimento.
Se sexo fosse pecado, Deus não
teria criado uma forma tão prazerosa de gerar vida. Mas não é o sexo que o
debate católico deve priorizar. É o amor. Todos os abusos sexuais decorrem da
falta de amor. Vale lembrar a escala grega: pornô (o prazer de um é a
degradação do outro); eros (ambos se dão prazer); filia (do prazer nasce a
cumplicidade); ágape (o supremo prazer é a comunhão de espíritos, que
transcende a epiderme).
E convém proclamar o que enfatiza
a 1ª. Carta de João (4, 7-8): onde há amor, Deus aí está. E acrescento:
inclusive em uma relação homoafetiva.
Frei Betto é escritor, autor de
"Aldeia do silêncio” (Rocco), entre outros livros.
http://www.freibetto.org/> twitter:@freibetto.
Fonte: Adital
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