Todos os problemas que toda mulher tem, a prostituta também tem. A única diferença é a estigmatização, a discriminação. Temos que combater esse preconceito lutando contra ele. Enfrentando a sociedade, enfrentando essas pessoas que discriminam.
Na última semana, a posição do ministro da Saúde, Alexandre
Padilha, de vetar uma peça publicitária da campanha iniciada pelo Ministério
pela prevenção de doenças sexualmente transmissíveis foi mais uma demonstração
da disposição do governo federal em ceder às reivindicações dos setores mais
conservadores e preconceituosos da sociedade brasileira. A peça em questão
trazia a protagonista declarando: “Eu sou feliz sendo prostituta”. Sob pressão
de extremistas religiosos e de políticos do campo da direita, o ministro cedeu,
cancelou a veiculação da peça e exonerou o diretor do departamento responsável
por ela.
No domingo o jornal Zero Hora resumiu, em editorial, o que a
mídia dominante e esses velhos setores sociais pensam a respeito, embutindo em
uma discurso falsamente imparcial e inofensivo uma exasperação ideológica de
direita que, além de procurar humilhar um grupo social, manipula os demais.
O título, “Orgulho de ser prostituta?”, já apresenta a tese
que será desenvolvida ao longo do texto: a ideia de que as prostitutas não têm
direito a sentir orgulho, ou seja, são uma subespécie. É um discurso
absolutamente discriminatório, e que segue ao afirmar que as peças
publicitárias em questão “enalteciam a prostituição”, quando, na verdade, procuravam
apenas criar vínculo identitário e atacar o preconceito contra esse setor
social.
Também o “olho” (trecho em destaque) do editorial vai nesse
caminho, procurando vincular a prostituição à exploração infantil: “Ao sugerir
o questionável orgulho de ser prostituta, o governo poderia passar uma mensagem
contrária ao combate à prostituição infantil, que é uma de suas bandeiras
sociais”. Em 2012, em entrevista ao Jornalismo B Impresso, a coordenadora do
Núcleo de Estudos da Prostituição (NEP), Carmen Lucia Paz, já afirmava: “Temos
que conseguir garantir nossos direitos garantidos na Constituição, e também
acabar com essa história de que prostituição induz as crianças. Muitas vezes
nós somos culpadas pela mídia, dizem que incentivamos a prostituição infantil.
Nem existe prostituição infantil, o que existe é exploração. Criança não é, nem
pode, nem deve ser prostituta”.
Após explicar a sequência de fatos que levou ao veto de
Padilha, ZH, ainda teimando em afirmar-se imparcial, acaba por entregar de que
lado está – e não apenas nesse caso específico, mas como posição
político-social geral: “De um lado, opositores do governo, religiosos e setores
mais conservadores da sociedade condenando o Ministério da Saúde pela concessão
ao oportunismo de militantes. De outro, organizações não governamentais,
associações defensoras da diversidade de gênero e intelectuais criticando
duramente o governo pelo recuo”. Como a sequência do editorial sustenta a
primeira tese, fica claro que ZH inclui-se entre os “opositores do governo,
religiosos e setores mais conservadores”, e exclui-se como “defensora da
diversidade de gênero”.
Zero Hora insiste em sua própria imparcialidade, mas
denuncia a si mesma novamente. Depois de dizer que “o extremismo de posições
pouco contribui para um encaminhamento mais propositivo da questão”, tem, ela
mesma, uma posição extrema: “Soa, porém, falso e demagógico exaltar na
propaganda oficial uma profissão (…). Fez bem, portanto, o ministro em
redefinir o rumo da campanha”.
Na entrevista que concedeu ao Jornalismo B, Carmen Lucia
também falou sobre a discriminação:
Todos os problemas que toda mulher tem, a prostituta também
tem. A única diferença é a estigmatização, a discriminação. Temos que combater
esse preconceito lutando contra ele. Enfrentando a sociedade, enfrentando essas
pessoas que discriminam. O ideal seria que todas as prostitutas tivessem essa
coragem. Temos que ter respeito com a nossa profissão. Essa seria a forma
básica para diminuir a discriminação. Organizadas, com a nossa profissão
regulamentada, vai ser mais fácil enfrentar. E aí sim podemos dizer que a
sociedade vai nos respeitar como profissionais. A mídia tem um papel
importantíssimo, ela pode te ajudar, te levantar, fazer de ti um grande
movimento, como pode derrubar esse movimento também.
http://jornalismob.com/
Nenhum comentário:
Postar um comentário