"Hoje o poder imperial é o da Fifa, que manda e
desmanda no País à custa do sofrimento e desespero dos brasileiros mais
desprotegidos e dos próprios interesses do País".
Em evento paralelo, realizado na última terça feira, durante
a 23ª Sessão do Conselho de Direitos Humanos da ONU, em Genebra, um grupo de
brasileiros, representantes da Articulação Nacional dos Comitês Populares
(Ancop) conseguiu chamar a atenção dos presentes para um impactante vídeo sobre
as remoções forçadas de famílias de seus lares e a consequente demolição de
suas moradias para darem lugar às obras da Copa do Mundo, no Brasil. Com o
título "Who wins this match?” (Quem ganha esse jogo?), o vídeo traz cenas
revoltantes da remoção de moradores, sem qualquer diálogo prévio para o
encontro da solução mais adequada, como pôde ser constatado por depoimentos
emocionantes dos próprios moradores.
PR DA FIFA
Esse tipo de violência é tão velho como a história do País –
basta lembrar a chegada da família real, no Rio de Janeiro, em 1808, fugindo de
Napoleão Bonaparte. Na ocasião, um carimbo com as letras iniciais da palavra
Príncipe Regente (PR), colocado na porta (que o povo lia como "ponha-se na
rua”) era uma sentença de expulsão do morador, que tinha de deixar sua
residência imediatamente para dar lugar aos membros da Corte. Hoje, o poder
imperial é o da Fifa, que manda e desmanda no País à custa do sofrimento e
desespero dos brasileiros mais desprotegidos e dos próprios interesses do País.
DESFIBRAMENTO
É triste que esse novo PR imperial se dê num governo
teoricamente governado pela esquerda (imagine se não o fosse). Uma esquerda
desfibrada, que está perdendo sua condição de referencial para os mais
desprotegidos deste País. Evidentemente, é uma ingenuidade imaginar que a
esquerda, pelo simples fato de estar no governo tenha poder efetivo de realizar
seus compromissos históricos. O sistema de presidencialismo de coalizão foi
organizado de forma a impedir isso: sem maioria parlamentar, o governo não vai
a lugar nenhum. E o sistema foi bolado justamente para não permitir essa
maioria e deixar o governo refém dos donos do País.
MANCEBIA
Contudo, seria possível permitir ao menos que a militância
dos partidos de esquerda mantivesse aceso o compromisso de defender os
interesses dos segmentos mais frágeis da sociedade, apresentando alternativas
às propostas liberais. Em último caso, ocupando as ruas com eles, se preciso.
Se não puderem defender alternativas próprias (inclusive, no caso da Copa do
Mundo), não custaria deixar claro que lutaram e foram derrotados. Isso seria
uma forma de garantir aos seus representados que não os traíram, nem se
deixaram enredar por uma mancebia vergonhosa com as forças do status quo.
CORREÇÃO
É verdade que o radicalismo obtuso do passado e a ilusão de
que é possível promover a ruptura com o capitalismo, por simples decisão
política, aproveitando um eventual elo fraco do sistema, como pregou Lênin e
seus afins, é algo sepultado pela História. O difícil não é a tomada do poder,
mas conservá-lo contra um meio circundante hostil, o que levaria a apelar para
uma brutalidade repressora e corrosiva, sacrificando desde logo a democracia.
Isso seria o caminho mais direto para o fracasso. O papel das forças
compromissadas com a transformação social, daqui para frente, é o de corrigir
continuamente as distorções geradas pelo capitalismo, já que este deixado livre
só produz guerras e desumanidade.
PROGRAMA
Não faltará trabalho para a esquerda: ampliação dos
mecanismos participativos democráticos e de participação popular no processo
decisório, defesa e ampliação dos direitos sociais, defesa dos direitos
humanos, luta pela preservação ambiental e, sobretudo, o compromisso com a
democracia como um fim em si mesmo, e não apenas como um meio para atingir um
fim. Nada deve ser tolerado fora da democracia. Mas, ao mesmo tempo, é preciso
que isso não signifique abdicar dos valores e das causas que motivaram a luta
histórica dessas forças pela transformação social. No horizonte deve estar
sempre a perspectiva de se alcançar uma sociedade mais equânime, mais
compassiva e humana. Isso o mercado, por si só, nunca proporcionará.
FARSA
A Comissão Nacional da Verdade(CNV) está pondo por terra as
justificativas difundidas pela ditadura e seus apoiadores para justificar o
crime cometido contra o Brasil pelo golpe de 1964. A tortura e o assassinato de
opositores existiram desde o primeiro dia do golpe. No dia 1º de abril, foram
metralhados, em Recife, pelos militares, dois estudantes (outros dois no Rio de
Janeiro) que saíram às ruas para defender pacificamente o regime
constitucional, sem falar nos camponeses mortos nas usinas e engenhos de cana.
Daí a mentira de que foi a esquerda que iniciou o derramamento de sangue. A
tortura não foi fruto de "excessos”, mas política deliberada de Estado –
constatou a CNV.
AUTOANISTIA
A anistia aprovada foi a autoanistia imposta pelo governo
com o apoio de 26 senadores biônicos (não eleitos pelo povo). A proposta de
anistia ampla, geral e irrestrita para os opositores, apresentada pelo MDB, foi
negada. Os presos políticos condenados pela luta armada não foram anistiados
(saíram depois que as penas foram rebaixadas, alguns chegaram a cumprir 10 anos
de cadeia), mas os torturadores foram anistiados previamente, sem terem sido ao
menos processados. O STF sabe que não houve negociação legítima, nessas
condições, como alegou para chancelar o embuste.
Fonte: (Valdemar Menezes) Jornal O Povo
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