segunda-feira, 24 de agosto de 2015

Projeto nós, Madalenas – Uma palavra para o feminismo: afronta


Afronta é uma das minhas palavras preferidas, talvez porque entre seus muitos significados esteja “enfrentar” e eu acho que é a principal definição do que é ser mulher negra na sociedade do racismo e da misógina, assim como ser feminista e negra não é nada mais que um afrontamento, e isso até mesmo dentro do próprio feminismo.

Por Stephanie Ribeiro,

 Estamos enfrentando tudo e todos, todo dia e sem descanso, e é por isso que estamos tão cansadas.
Quando eu tive que pensar sobre uma palavra tinha certeza que era essa que me representava, fiz então uma retrospectiva do porque um dia eu me posicionei como feminista negra essa que foi a mudança mais significativa na minha história até agora.
Percebi que ao longo da minha vida eu sempre quis ser “normal” mesmo quando eu não me colocava como uma mulher negra, eu sabia que eu não era igual as outras meninas, e isso não era culpa minha, as pessoas me tratavam diferente e na minha cabeça crescia a ideia que normal era igual a ser branca. Mesmo na infância eu me recordo de querer ser “normal”, de chegar em casa e tomar banho me esfregando forte para ver se eu ficava mais clara, de por a toalha na cabeça e fingir que meus cabelos eram longos e lisos, na adolescência eu queria usar maquiagem mais clara e não gostava de tirar fotos pois me achava feia.
Eu me sentia feliz quando me chamavam de morena e tinha pavor quando me chamavam de NEGRA.


Acredito que quando eu me emponderei, foi quando comecei a ler e ver outras pessoas como eu, que tinha histórias parecidas com a minha, e assim consegui me entender. Foi quando me coloquei como feminista e negra que me senti pertencendo a algo, e essa sensação me seduziu de forma avassaladora.
Então seguindo um rumo natural, comecei a escrever, um dos meus primeiros textos fiz no auge de uma crise, consequência da situação que eu enfrento na faculdade: o isolamento acadêmico, o racismo institucional e agressões verbais.
Era uma fase que eu só queria morrer.
Não acho que seja realmente um problema falar isso, acho que é real esse sentimento, você se vê presa numa solidão e indagações que se sente tão estranha ao mundo que só quer dormir para sempre. Muitas pessoas negras pensam em desistir – do que fazem, do que querem e do que são. Eu pensei em tudo isso, ainda penso, só que agora bem menos. Porque eu aprendi o real significado de afrontar, não preciso gritar, não preciso comandar grandes revoluções, não preciso ser mártir.

Eu só preciso sobreviver, num mundo que odeia mulheres e negros, duas coisas que eu sou.
Afrontar sobrevivendo é complicado, é acordar todo dia sair da cama e acreditar que você vai vencer, mesmo que tenha uma força enorme te puxando para a derrota. Não acho que eu conseguiria estar agora bem, caso não tivesse tido o apoio de várias mulheres negras, da minha mãe e o entendimento de que a única forma de poder assumir minimamente o controle do que sou e o que sinto, era escrevendo.
Então eu escrevo quando meus silêncios e vazios ficam grandes demais para mim, eu escrevo para subverter a lógica do lugar que dizem que mulheres negras devem ocupar, eu escrevo para me manter viva.
Escrevo pois sei que quando mulheres negras falam por si, escrevendo suas histórias, estamos fazendo uma revolução, essa sim, capaz de mudar o mundo.
E assim eu sigo, um dia de cada vez, enfrentando tudo que for necessário para ser vista como eu sou: normal.

Quer saber mais sobre o Projeto – Nós,Madalenas e como colaborar acesse: http://bit.ly/1KeBJP0



Fonte:  Imprensa Feminista

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