Os atuais protestos em várias cidades brasileiras resultam
do fato de que os brasileiros "caíram na realidade", na avaliação do
sociólogo francês Alain Touraine, especialista em América Latina e autor de
inúmeros livros sobre movimentos sociais. "O balanço da situação
brasileira é bom. Mas o país sofre desigualdades e benefícios do
desenvolvimento são muito mal distribuídos", afirmou. "O Brasil ainda
está muito longe de ter um nível de distribuição de renda aceitável".
“A situação (econômica e social) no Brasil vinha sendo
descrita de maneira exageradamente cor-de-rosa", disse o sociólogo em
entrevista à BBC Brasil. Para ele, os protestos aproximaram a imagem que se
tinha do Brasil da realidade do país.
"Construiu-se uma imagem do Brasil em que tudo vai bem
e que o país se dirige rapidamente em direção ao crescimento e ao
bem-estar", disse ele. "Fico feliz ao ver que o que acontece
atualmente no Brasil corresponde melhor à realidade do país do que as imagens
que vinham sendo transmitidas", afirmou.
"É ridículo ter a imagem de que há sucesso em todas as
áreas, sobretudo em um país como o Brasil, onde as instituições são fracas e a
corrupção é profunda", disse Touraine, que foi professor do ex-presidente
Fernando Henrique Cardoso. Ele disse que em uma comparação com o México, por
exemplo, apesar de este país ter vários indicadores econômicos e sociais mais
positivos, é o Brasil que possui a imagem de país "onde tudo vai
bem".
O sociólogo definiu os movimentos de protestos no Brasil
como a "quebra da esperança", um sentimento de "decepção, que
cria uma situação favorável ao descontentamento". "Quando há
crescimento econômico e ele diminui, como é o caso do Brasil, isso representa
exatamente o bom momento para protestar", disse ele.
"O balanço da situação brasileira é bom. Mas o país
sofre desigualdades e benefícios do desenvolvimento são muito mal
distribuídos", afirmou. "O Brasil ainda está muito longe de ter um
nível de distribuição de renda aceitável".
Nível baixo de vida
De acordo com Touraine, os protestos no Brasil demonstram
"um sentimento real, justificado, de que o nível de vida é muito
baixo".
E também, acrescentou, "o sentimento de que se
constituiu, estranhamente, no topo do poder, um mundo de riquezas."
"A pobreza, que permanece imensa, é sacrificada em benefício do
espetáculo", disse ele, se referindo aos gastos "gigantescos"
com as obras da Copa do Mundo e Jogos Olímpicos, que geraram protestos "no
país do futebol".
Mas Touraine ressaltou que os protestos no Brasil não
assumiram, "pelo menos até o momento", uma forma política, com o
objetivo de derrubar o governo, como ocorreu nas revoluções nos países árabes.
"O caso brasileiro é um pouco atípico. As reivindicações econômicas e
sociais são, pelo menos aparentemente, mais importantes do que os protestos ou
ataques puramente políticos", afirmou.
"Não há um furor pela democracia no Brasil como
ocorreu, por exemplo, na praça Tiananmen, em Pequim. Em vários países os
protestos se concentraram contra um ditador", disse Touraine à BBC Brasil.
"No caso do Brasil, não acredito que os protestos representem uma ameaça
política contra o governo atual. Mas é possível que a situação evolua. Hoje,
não posso dizer que o movimento seja voltado contra Dilma Rousseff".
Fonte: (Daniela Fernandes)
BBC Brasil
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