segunda-feira, 21 de março de 2016

Por dentro dos grupos secretos do Facebook onde as pessoas trocam sexo por serviços

Alejandra* não é uma trabalhadora sexual. Ela não transa com estranhos em troca de dinheiro e não fica à noite parada numa esquina à espera clientes. Recentemente, porém, ela passou meia hora fazendo sexo em troca de internet grátis.


Acontece que o salário dela não cobre certas coisas que ela deseja –como uma mesa de centro de mármore, garrafas de uísque, máquina de lavar ou wi-fi. Alejandra também gosta de fazer sexo –desde que possa escolher o parceiro, claro. Ela, e um número crescente de mexicanos, unem as duas coisas trocando bens e serviços por sexo.


O escambo é uma forma de transação anterior ao conceito de dinheiro e, hoje, se você quer aulas de direção em troca de meia hora com seu corpo, é só procurar na internet. É algo que acontece em todo lugar do mundo e, ao que parece, com mais frequência em países em desenvolvimento, como o México.

Eu queria saber o que exatamente estava sendo trocado e que tipo de pessoa participa disso, então, sob o nome "Pancho", criei uma conta falsa no Craigslist mexicano, no Facebook e no site de trocas espanhol ofrezcoacambio.com.



O Craigslist não é um lugar particularmente bizarro quando se trata de sites de troca de sexo –durante minha pesquisa encontrei, por exemplo, uma mulher que queria trocar sexo por uma conversa sobre literatura. Ela se descrevia como uma "alma solitária que nunca menospreza outras pessoas" e "uma escritora tentando fazer seu próprio nome". O anúncio dela não oferecia explicitamente sexo, mas estava na seção "pessoal" do Craigslist embaixo das guias "Mulher Procura Homem" e "Encontros Casuais".


A segunda rede de trocas mais importante do México é o ofrezcoacambio.com. Mesmo que a maioria dos usuários seja da Espanha, o que não falta são anúncios mexicanos. Aqui você acha principalmente jardineiros, nerds de computador e encanadores cheios de tesão oferecendo seus serviços em troca de alguns momentos de afeto. Para encontrar esse tipo de negócio, basta digitar "sexo" na barra de procura.

Mas o melhor lugar para conseguir algo em troca de sexo no México é o Facebook. Alguns anos atrás, um cara chamado Alex* criou um grupo fechado com esse propósito. A descrição diz: "NADA EM DINHEIRO... apenas coisas ou serviços por sexo. Quem oferecer pagar em dinheiro será banido. Somos pessoas respeitosas. Fica a cargo de cada um decidir se um negócio é justo ou não. É proibido stalkear por inbox! Quem fizer isso será deletado e banido do grupo. Proibida a entrada menores de 18 anos. Se você é um membro e a pessoa não pagou, denuncie."

Foi lá que encontrei Alejandra, uma garota de 26 anos com um apartamento cheio de coisas que ela trocou por sexo, da cama ao wi-fi em que ela estava conectada para falar comigo. A internet dela foi hackeada do vizinho por um cara que cobrou 30 minutos de sexo. "Não me considero uma trabalhadora sexual. Não cobro. As pessoas me dão coisas por transar com quem eu quero", ela me respondeu por mensagem.

Minha interação com o grupo foi cortada depois que um dos membros descobriu que meu perfil era falso e me denunciou. Só fui aceito de novo três dias depois.



Enquanto Alejandra oferece meia hora de sexo em troca da senha da internet, a maioria das pessoas que oferece transas por serviço no México está numa situação bastante vulnerável. Muitas mulheres em extrema pobreza fazem isso para cobrir necessidades básicas. Um trabalho publicado pelo Instituto Nacional de Saúde Pública mexicano, intitulado "O Sexo Recompensado: uma prática no centro das vulnerabilidades das jovens mexicanas (DST/HIV/AIDS)", explica esse lado das trocas.

"No estudo conduzido no estado de Guadalajara, um grupo notou as seguintes situações em que o sexo era trocado por serviços: 'homens jovens heterossexuais fazendo sexo com outros homens em troca de presentes', 'prostitutas não remuneradas –mulheres jovens fazendo sexo em troca de bens e serviços', ou 'mulheres jovens dispostas a fazer sexo em troca de drogas'", diz o relatório.

Outro fator de vulnerabilidade dos homens e mulheres que oferecem sexo nesses termos é o estigma social. "Culturalmente, é difícil para jovens mexicanas aceitarem que fizeram sexo fora do enquadramento tradicional, quanto mais aceitar –mesmo para si mesmas– que fizeram sexo em troca de algo. Elas se arriscam a contrair esse estigma social no seu ambiente, como serem chamadas de vagabundas ou prostitutas, dois termos usados por homens jovens dentro do nosso grupo de foco", diz o relatório.

Em uma entrevista citada no trabalho, uma mulher diz: "Há sempre o medo de ficar sem nada. Não há muitos empregos, e os que estão disponíveis para mim geralmente são péssimos. Então, quando surge a oportunidade, às vezes você tem que aceitar [fazer sexo em troca de algo]".

É tenuê a linha entre sexo por troca como um ato coercivo ou em comum acordo. Muitos estudos sobre transações de sexo que não envolvem dinheiro mostram que o ato em si é profundamente enraizado numa combinação de pobreza, consumismo ocidental e o desnível econômico entre homens e mulheres.

Penetrar no mundo do sexo por escambo me deixou com mais perguntas que respostas. Transar por dinheiro, transar por wi-fi, transar por comida, transar por amor. Não são todas necessidades básicas hoje?

"O serviço de internet custa pelo menos 500 pesos (R$100) e esse cara hackeou uma senha para que eu pudesse usar a internet do vizinho em troca de meia hora de sexo. Foi o melhor investimento que fiz na vida", diz Alejandra.

* Nomes fictícios


Fonte: http://www1.folha.uol.com.br

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