Uma pesquisa realizada pelo Ipea quis saber as opiniões do
brasileiro quanto à violência contra a mulher. Os resultados preocupam: a
maioria dos brasileiros acredita que o estupro é culpa da mulher, que mostra o
corpo e não se comporta como deveria.
Para a maioria dos brasileiros, a mulher deve “dar-se ao
respeito”. Ela deve obediência ao marido e só se sente realizada ao ter filhos
e constituir família. A maioria ainda acredita que, “se a mulher soubesse se
comportar melhor, haveria menos estupros”. Mais que isso: para a maioria dos
brasileiros, “mulheres que usam roupas que mostram o corpo merecem ser
estupradas”.
São essas as conclusões de um estudo conduzido pelo
Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) divulgado nesta quinta-feira
(27). Anualmente, o Ipea organiza o Sistema de Indicadores de Percepção Social
, uma pesquisa realizada em domicílios brasileiros que visa a identificar a
opinião da população acerca de políticas públicas implementadas pelo governo.
Neste ano, a pesquisa queria saber o que o brasileiro pensa sobre a questão da
violência contra a mulher. Entre maio e junho de 2013, 3.809 domicílios foram
consultados, em 212 cidades espalhadas pelo Brasil. Homens e mulheres foram
entrevistados. Elas, inclusive, foram maioria – correspondem a 66% da amostra.
Dos dados, emerge um sociedade patriarcal, que busca controlar o corpo feminino
e que culpa a mulher pelas agressões sofridas.
Segundo o Ipea, existe no Brasil um “sistema social que
subordina o feminino ao masculino”, no qual “a violência parece exercer um
papel fundamental”. Entre os entrevistados, 58,5% acham que, se as mulheres
soubessem se comportar haveria menos estupros. Essa percepção, além de
depositar a culpa da agressão nos ombros das mulheres, carrega implícita a
noção de que os homens não conseguem – e nem deveriam – controlar seus apetites
sexuais.
O mais chocante – 65% dos brasileiros concordam com a ideia
de que mulheres que usam roupas que mostram o corpo merecem ser atacadas. A
afirmação, dizem os pesquisadores, mostra a existência de uma “cultura do
estupro” no país. Não basta que o comportamento feminino seja alvo de
restrições maiores que o masculino: é tolerável que os desvios de conduta sejam
punidos, por meio de violência sexual.
A pesquisa do Ipea é apresentada em um momento em que o tema
da violência contra a mulher ganha destaque na imprensa e na agenda do governo.
O instituto aponta que, nessa área, avanços importantes foram conquistados,
como a criação da Lei Maria da Penha em 2006. Mesmo assim, a mentalidade
machista ainda predomina na sociedade brasileira. Além das questões
relacionadas à violência sexual, a pesquisa abordou questões relativas à
violência doméstica e à organização familiar.
Violência doméstica e
sociedade patriarcal
Nessa área, as opiniões dos brasileiros são um tanto contraditórias.
A maioria concorda que atos de violência contra a mulher, em casa, devam ser
punidos: 91% dos entrevistados concordaram com a afirmação de que “homem que
bate na esposa deve ir para a cadeia”. Mesmo assim, a maioria acredita que
casos de conflitos entre pessoas casadas possam e devam ser resolvidos dentro
de casa, sem intervenção das autoridades: 63% acham que casos de violência
doméstica só devem ser discutidos entre membros da própria família.
Para os pesquisadores do Ipea, a maior parte da sociedade
brasileira preserva a imagem de uma família tradicional, organizada em torno da
figura do homem. Nessa forma de organização familiar, o homem não tem poderes
irrestritos sobre mulher e filhos – seus atos de violência, se extremos, devem
ser punidos. Mesmo assim, o pai continua a ser uma figura cuja autoridade deve
ser respeitada, ainda que isso acarrete prejuízos para a mulher. Nesse
contexto, o recurso à violência, física ou subliminar, é frequente e tolerado:
27% dos entrevistados concordam total ou parcialmente com a afirmação de que a
mulher deve satisfazer os desejos sexuais do marido, ainda que não tenha
vontade de fazê-lo. Sem deixar claro, a
pergunta aborda a questão do estupro no âmbito do casamento – um tabu.
Existe ainda a tendência de associar a imagem da mulher à
imagem de mãe. 30% dos entrevistados acreditam que uma mulher só se sente
realizada quando tem filhos.
Casamento entre
pessoas do mesmo sexo
A família que o brasileiro valoriza é aquela composta por
pai, mãe e filhos. E liderada pelo marido: a maioria enxerga o homem como o
cabeça da casa. Embora esse arranjo familiar venha perdendo espaço – o número
de famílias chefiadas por mulheres, segundo o IBGE, cresceu de 28% para 38% em
2012 – é ele que ocupa o imaginário do brasileiro médio como o de família
ideal. Segundo o Ipea, além de desvalorizar a importância da mulher no círculo
familiar, esse imaginário cria espaço para opiniões de caráter homofóbico – o
casamento de dois homens, por exemplo, é visto como uma situação em que um
homem ocupa o lugar de submissão associado à mulher. Quando questionados, 52%
dos entrevistados afirmaram que o casamento entre pessoas do mesmo sexo não
deveria ser permitido. Mesmo assim, em outra aparente contradição, 50% deles
acreditam que pessoas do mesmo sexo devem ter acesso aos mesmos direitos que os
demais casais.
De acordo com o Ipea, o perfil das respostas, nesse caso,
variou conforme a faixa etária do entrevistado. Jovens, entre 16 e 29, têm uma
imagem mais positiva da homossexualidade.
Fonte: Revista Epoca
Nenhum comentário:
Postar um comentário