"Se Eliza Samudio está morta, o Estado brasileiro deve ser
responsabilizado, pois se omitiu quando instado por ela a proteger a sua vida!
A lei, quando chamada, não compareceu para dar limites ao agressor. Ao
contrário, acariciou sua onipotência". A condenação do mandante do crime
foi uma vitória, mas é voz geral que foi branda.
Por Fatima Oliveira
Não punir delitos de quem exibe padrão sociopata é crime?
No último Dia Internacional da Mulher, em cadeia nacional de
rádio e TV, a presidente Dilma disse: "Faço um especial apelo e um alerta
àqueles homens que, a despeito de tudo, ainda insistem em agredir suas
mulheres... Se é por falta de amor e compaixão que agem assim, peço que pensem
no amor, no sacrifício e na dedicação que receberam de suas queridas mães. Mas,
se agem assim por falta de respeito ou por falta de temor, não esqueçam jamais
que a maior autoridade deste país é uma mulher, uma mulher que não tem medo de
enfrentar os injustos nem a injustiça, estejam onde estiverem".
Na data, foi veiculada "Nota pública da ministra
Eleonora Menicucci sobre o caso Eliza Samudio", na qual declara que
"é estarrecedora a declaração do acusado de que Eliza foi assassinada,
esquartejada e teve seu corpo jogado aos cães... Como ministra da secretaria da
Mulher, reafirmo que o Estado brasileiro é mais forte que a violência. A Lei
Maria da Penha é o marco legal que nos une, os Três Poderes da República e a
sociedade, para retirar as mulheres do ciclo perverso da violência de
gênero".
É um conforto ouvir e ler tais declarações; todavia, as
palavras da presidente e as da ministra em muitas ocasiões podem ser meras
figuras de retórica, infelizmente. É que, entre a intenção e o gesto, pode
haver um fosso: "Se Eliza Samudio está morta, o Estado brasileiro deve ser
responsabilizado, pois se omitiu quando instado por ela a proteger a sua vida!
A lei, quando chamada, não compareceu para dar limites ao agressor. Ao contrário,
acariciou sua onipotência". A condenação do mandante do crime foi uma
vitória, mas é voz geral que foi branda.
Não temos de trastejar: "Se a vítima denuncia e, assim
mesmo, perde a vida, cabe à sua família acionar o Estado por omissão na
proteção da vida das mulheres". Talvez só depois de meter a mão no bolso,
por descaso pelas nossas vidas, o Estado brasileiro encontre um caminho seguro
para nos proteger.
E é dever dos três níveis de governo esforço máximo para
abolir o fosso do patriarcado, do machismo e do racismo, impedimentos concretos
à cidadania feminina, como escrevi em "A personalidades delinquentes só a
lei é que pode impor limites": "Urge que a Secretaria de Políticas
para as Mulheres (SPM) encontre meios de blindar a Lei Maria da Penha, ao
máximo, contra interpretações ao bel-prazer do juízo de valor conservador e
machista de magistrados (as) e incluir elementos novos, científicos e
consensuais, pertinentes às personalidades criminosas ou bandidas, já que os transtornos de personalidade são
intratáveis, incuráveis e irreversíveis, mas há prevenção: Investir
em educação, em atendimento à primeira infância, na
aplicação das leis e em contenção. A Lei Maria da Penha e a
magistratura não podem se omitir diante de
agressores. É estímulo
homicida não punir delitos de quem exibe
padrão sociopata!" (O TEMPO, 13.7.2010).
Tais reflexões estão na totalidade na sentença da juíza
Marixa Fabiane Lopes Rodrigues, que condenou Bruno Fernandes das Dores de Souza
a 22 anos e três meses de prisão: "A conduta social é igualmente
desfavorável, considerando o comprovado envolvimento do réu Bruno Fernandes na
face obscura do mundo do futebol. No tocante à personalidade, tal
circunstância, igualmente, não favorece o acusado, uma vez que demonstrou ser
pessoa fria, violenta e dissimulada. Sua personalidade é desvirtuada e foge dos
padrões mínimos de normalidade".
Com a palavra, o Estado brasileiro!
Fonte: O Tempo
Nenhum comentário:
Postar um comentário