Egressos de escola pública vivem
euforia da aprovação em universidades públicas em meio à preocupação sobre como
conseguirão se manter em outras cidades e Estados.
Por Osvaldo de Brito Do Ultimo
Segundo
A família de Talita Reis ainda
está acabando de conseguir o dinheiro para que a jovem viaje até a capital
federal para fazer a matrícula na Universidade de Brasília (UnB). Caçula de
quatro irmãos e filha de pais que não completaram o ensino médio, a garota é,
aos 19 anos, a primeira da casa a chegar no ensino superior. E fez bonito.
Conseguiu uma vaga no curso de arquitetura em uma universidade pública.
A conquista foi graças à boa nota
no Enem. Moradora do bairro dos Pimentas, na periferia de Guarulhos, na Grande
São Paulo, ela sempre estudou em escolas públicas. No último ano do ensino
médio, os professores indicaram um cursinho comunitário. “Como era gratuito,
fiz a inscrição e comecei a frequentar às aulas. Durante a semana, estudávamos
no período da noite e, aos sábados e domingos, das 8 às 14h . Em alguns finais
de semana as aulas terminavam às 16h”, conta.
Valeu a pena. Talita disputou com
quase 3 milhões de pessoas e garantiu, por meio do Sisu, uma das 228 mil vagas
oferecidas em 6.323 cursos de 131 instituições públicas. Ela concorreu às vagas
do Sisu nas três modalidades de cotas: estudantes de escola pública; pretos,
pardos e indígenas, e também baixa renda. De acordo com o MEC, foram 28
candidatos por vaga na Lei de Cotas, e 24, 8 candidatos por vaga na ampla
concorrência.
Com a nota obtida no Enem 2015,
Talita se classificou para a Universidade Federal do Mato Grosso (UFMT) e para
a UnB. Escolheu a última. Na Unb, os candidatos ao curso de arquitetura e
urbanismo realizam uma prova de habilidades específicas e, se aprovados,
disputam as vagas para o curso utilizando a nota do Enem. “Sempre quis
arquitetura e nunca tinha ido a Brasília. Quando cheguei lá pra fazer a prova
de habilidades específicas, tive a certeza que era onde eu queria estudar”,
conta.
Na segunda-feira (18), a
estudante estava acompanhada do pai, da mãe e de três amigas do cursinho quando
saiu o resultado da seleção.“Para ser sincera, ainda não estou acreditando que
consegui. Acho que só quando eu estiver na universidade vou perceber que é
verdade!”.
Custo de vida
Garantida a matrícula, o desafio
de Talita e de outros tantos egressos de escolas públicas é conseguir recursos
para se manter longe de casa. E daí entra outra seleção: a das bolsas de
auxílio estudantil. “Já pesquisei
bastante. Chegando à UnB, vou tentar a bolsa permanência e moradia estudantil.
Optei pelo curso noturno, porque se não conseguir nenhum auxílio, vou procurar
emprego durante o dia”, explica. Segundo a garota, o resultado será divulgado
no mês de abril.
Talita sabe que, além desse,
enfrentará outros desafios para se formar em arquitetura. “Tenho noção que
temos direito em ocupar todos os espaços, incluindo as universidades públicas,
mas sei que vou sofrer preconceito. Amigos que conheci no cursinho e já fazem
faculdade, relatam os casos. Mas o nosso lema é ‘Juntos somos fortes’. Não
estarei sozinha. Espero que cada vez mais pessoas como eu, do meu bairro e da
minha escola sejam aprovadas”, conclui.
Confira outros relatos:
Estudar enfermagem é o objetivo
de Eduardo Silva, de 18 anos, morador do Jardim Cumbica, também em Guarulhos.
Esta foi a primeira vez que ele tentou uma vaga no Sisu, e foi aprovado na
Universidade Federal de São Carlos (Ufscar). “Não tentei cotas para escola
pública, nem por renda, por um erro meu no ato da inscrição do Sisu. Mas no
final consegui, mesmo assim”, relata. O
jovem ainda aguarda os resultados do vestibular da USP de Ribeirão Preto.
Eduardo, que é filho único, diz
que a mãe está preocupada com a partida do filho. “No cursinho, havia reuniões
com os pais, e um dos temas tratados era, justamente, se preparar para quando o
filho vai estudar fora”, explica. “Como eu queria enfermagem e desde o início
só tentei universidades no interior, ela está se acostumando aos poucos”,
conta. O jovem também vai pleitear auxílios para a permanência em São Carlos,
ou, mesmo em Ribeirão Preto, caso seja aprovado.
Isabella Viana, de 18 anos, foi
selecionada para cursar medicina veterinária na Universidade Federal de Lavras
(UFLA), em Minas Gerais. Esta é a segunda vez que a jovem, estudante de escola
pública, concorreu às vagas do Sisu. “Quando terminei o ensino médio, não fui
aprovada no curso que queria. Então, em 2015, comecei a estudar no cursinho
comunitário oferecido pela Unesp de São José dos Campos. As aulas eram durante
a semana das 13h30 às 20h, com simulados em alguns sábados e plantão de
dúvidas”, conta.
A escolha da instituição em
Lavras se deu por duas razões: a indicação de um dos professores do cursinho –
que comentou que a irmã dele estudava lá e que o curso é muito bom – e porque a
jovem tem parentes em Cambuquira, cidade razoavelmente próxina. “Minha família
está receosa em como vou me manter, mas vou tentar obter os auxílios
estudantis”, afirma Isabella, que participou do Sisu com as cotas para escola
pública e baixa renda.
A Universidade Federal do Rio de
Janeiro (UFRJ) foi o local escolhido por Juanitha Brito para cursar direito. A
garota de 18 anos, moradora do bairro Jaraguá, em São Paulo, sempre estudou na
rede pública. Quando terminou o ensino médio, tentou uma das vagas oferecidas
pelo Sisu, mas não foi selecionada. Em 2014, começou a estudar no Cursinho da
Poli. Após dois anos de dedicação, conseguiu. Juanitha concorreu às vagas do
Sisu com cotas nas modalidades escola pública, baixa renda, e negros, pardos e
indígenas. “Ainda faltam os resultados da USP e da Unesp (Universidade Estadual
Paulista). Em todo caso, farei a matrícula na UFRJ”, diz. “Meus pais estão um
pouco aflitos com a minha partida para o Rio, mas lá eu vou tentar os auxílios
aos estudantes”, explica.
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