Judith Butler, filósofa, falou sobre exclusão do gênero dos planos de
educação.
Por Ana Carolina Moreno, do G1
A palestra da filósofa americana
Judith Butler em São Paulo, na tarde da passada quarta-feira (9), atraiu
centenas de pessoas ligadas à pesquisa e à militância das questões de gênero e
LGBT, e um pequeno grupo de manifestantes contrários à discussão. Butler, que
foi alçada ao status de celebridade na área após elaborar conceitos que levaram
à criação da teoria queer, foi a principal palestrante do primeiro dia do
Seminário Queer, que termina nesta quinta (10) no Sesc Vila Mariana.
Sua teoria critica a associação
automática do sexo biológico das pessoas à identidade de gênero e à orientação
sexual delas. Ela defende a noção de que a identidade e o gênero das pessoas
são mais flexíveis do que isso. Assim, a teoria queer considera, em seus
estudos, as especificidades de quem se sente excluído ou excluída da
simplificação “macho e fêmea” ou “homem e mulher”, como acontece com as pessoas
trans. Por isso, ela provoca controvérsia e atrai críticas de alguns setores da
sociedade.
Além de um acalorado debate entre
acadêmicos e militantes da área, o nome da americana, professora da
Universidade de Berkley, na Califórnia, e ganhadora do Prêmio Adorno em 2012,
também provoca a ira de grupos conservadores. Na tarde desta quarta, antes de
sua palestra, um pequeno grupo de pessoas protestou contra a vinda de Butler ao
Brasil e, por tabela, contra a inclusão da palavra “gênero” no Plano Municipal
de Educação de São Paulo. Com uma gaita de fole e um megafone, os manifestantes
“alertaram” os participantes sobre a “ideologia homossexual” nas escolas e
deixaram cartazes em frente ao local contra a vinda da filósofa ao Brasil.
Gênero nos planos de educação
Em entrevista coletiva à
imprensa, antes de sua palestra sobre “vulnerabilidade e resistência”, Butler
comentou a questão educacional no país, e afirmou que a retirada do termo nos
documentos que foram aprovados nas câmaras municipais, inclusive na Capital
paulista, criou um debate em torno do tema, que ainda não chegou ao fim.
“Agora, vai haver uma luta para colocá-lo de volta no plano de educação. Talvez
eles vençam. Talvez eles vençam, talvez não vençam. Em outras palavras, vocês
são parte de um debate historicamente em evolução nesse assunto. Esse não é o
fim da história”, disse ela (veja mais no vídeo acima).
A filósofa acredita que o debate
é benéfico, porque leva as pessoas a pensarem em como querem educar as crianças
sobre a questão da aceitação da diversidade.
“Nós queremos educar nossas crianças, ou as
crianças das outras pessoas, para entender que isso é um problema altamente
debatível? E que há diferentes pontos de vista, e que elas precisam considerar
a complexidade do mundo, culturalmente e religiosamente, historicamente, para
entender essa questão? Não significa que eles precisam aceitar um ponto de
vista político”, afirmou Butler.
O debate, segundo ela, gira em
torno da esfera onde deve se dar o ensino sobre sexo, sexualidade e, talvez,
gênero. “Essa é uma questão: o que pertence à religião, ou a um espaço privado,
e o que pertence a uma política educacional pública.”
Conservadores contra o conceito de gênero
Mas a filósofa americana, que
veio ao Brasil pela primeira vez, afirmou que aprendeu também, com as críticas
que recebeu no país, que há setores que contestam o próprio conceito de
gênero(assista ao vídeo acima). “Tem aqueles que dizem que se você aceitar a
categoria de gênero, então você nega a categoria de sexo. E se você negar a
categoria de sexo, você nega a Bíblia, que diz que há dois sexos, ou você nega
a ciência, que diz, extensivamente, que há dois sexos”, disse ela, afirmando
que, dentro da ciência, o assunto é complexo.
Antes de palestra de Butler em
SP, grupo protestou contra a 'ideologia homossexual' nas escolas (Foto: Ana
Carolina Moreno/G1)
“A ciência tem claro que a designação de sexo
é uma prática muito difícil, e que ela nem sempre funciona, e eles brigam entre
eles, os cientistas. Enfim… Com o propósito de defender a Bíblia, alguns
cristãos vão evocar uma ideia da ciência na qual a diferença entre os sexos é absoluta.”
De acordo com Butler, o gênero
implica a negação do sexo.
“Ele simplesmente abre a questão:
como conhecemos o sexo? Que nome damos para ele? Sob qual enquadramos o
entendemos? Entendemos o sexo por meio da religião? Entendemos o sexo por meio
da ciência? De qual ciência?”, questiona ela.
“Então existe um conjunto de
contextos sobre como interpretar o que podemos chamar de corpo sexuado. O nome
para esse conjunto de contextos é chamado de estudos de gênero. Estudos de
gênero. É onde você pode fazer essas perguntas, onde você aprende a pensar
criticamente sobre o problema.”
Grupo de manifestantes deixou em frente ao Sesc Vila Mariana cartazes
ofensivos à filósofa da teoria queer
Fonte: Geledes
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