Quem sabe, necessitamos aprender
novamente a valorizar as coisas pequenas e os pequenos gestos. Não nos sentimos
chamados a ser heróis nem mártires a cada dia, porém todos são convidados a
viver pondo um pouco de dignidade em cada rincão deste nosso pequeno mundo. Um
gesto amigável ao que vive desconcertado, um sorriso acolhedor a alguém que
está só, um sinal de proximidade a quem começa a se desesperar, um raio de
pequena alegria num coração sobrecarregado... não são coisas grandes. São
pequenas sementes do reino de Deus que todos podemos semear numa sociedade
complicada e triste que esqueceu o encanto das coisas simples e boas.
Por Jose A. Pagola
Jesus se preocupava muito que
seus seguidores terminassem o dia desalentados ao ver seus esforços por um
mundo mais humano e feliz não haver obtido o êxito esperado. Será que se
esqueceriam do reino de Deus? Manteriam, ainda, sua confiança no Pai?
O mais importante é que não se
esquecessem jamais como deveriam trabalhar.
Com exemplos tomados da
experiência dos camponeses da Galileia, anima-os a trabalhar sempre com
realismo, com paciência e com grande confiança. Não é possível abrir caminhos
para o Reino de Deus de qualquer maneira. Devem fixar-se na maneira como ele,
Jesus, trabalha.
A primeira coisa que devem saber
é que sua tarefa é semear, não colher. Não viverão dependentes dos resultados.
Não lhes deverão preocupar nem eficácia nem o êxito imediatos. Sua atenção se
centrará em semear bem o Evangelho. Os colaboradores de Jesus haverão de ser
semeadores. Nada mais.
Depois de séculos de expansão
religiosa e grande poder social, os cristãos devem recuperar na Igreja o gesto
humilde do semeador. Esquecer a lógica do colhedor que sai sempre para recolher
frutos e entrar na lógica paciente daquele que semeia um futuro melhor.
O início de toda semeadura sempre
é humilde. Entretanto, trata-se de semear o Projeto de Deus no ser humano. A
força do Evangelho não é nunca algo espetacular ou clamoroso. De acordo com
Jesus, é como semear algo tão pequeno e insignificante como "um grão de
mostarda" que germina secretamente no coração das pessoas.
Por isso, o Evangelho somente
pode ser semeado com fé. É isso que Jesus deseja fazer-lhes ver com as suas
pequenas parábolas. O Projeto de Deus de fazer um mundo mais humano traz dentro
de si uma força salvadora e transformadora que não depende do semeador. Quando
a Boa Notícia desse Deus penetra numa pessoa ou num grupo humano, ali começa a
crescer algo que nos ultrapassa.
Na Igreja não sabemos, neste
momento, como atuar nesta situação nova e inédita, em meio a uma sociedade cada
vez mais indiferente a dogmas religiosos e códigos morais. Ninguém tem a
receita. Ninguém sabe, exatamente, o que se há de fazer. Precisamos buscar
caminhos novos com a humildade e confiança de Jesus.
Cedo ou tarde, os cristãos
sentirão a necessidade de retornar ao essencial. Descobriremos que somente a
força de Jesus pode regenerar a fé na sociedade descristianizada de nossos
dias. Então, aprenderemos a semear com humildade o Evangelho como início de uma
fé renovada, não transmitida por nossos esforços pastorais, mas gerada por ele.
PEQUENAS SEMENTES
Vivemos sufocados pelas más
notícias. Emissoras de rádio e televisão, noticiários e reportagens descarregam
sobre nós uma avalanche de notícias de ódios, guerras, fomes e violências,
escândalos grandes e pequenos. Os "vendedores de sensacionalismo" não
parecem encontrar outra coisa mais importante em nosso planeta.
A incrível velocidade com que se
difundem as notícias nos deixa aturdidos e desconcertados. O que alguém pode
fazer diante de tanto sofrimento? Cada vez mais, estamos melhor informados do
mal que assola a humanidade inteira, e cada vez mais nos sentimos mais
impotentes para enfrentá-lo.
A ciência nos quis convencer de
que os problemas podem se resolver com mais poder tecnológico, e nos lançou
numa gigantesca organização e racionalização da vida. Porém, este poder
organizado já não está mais nas mãos das pessoas, mas das estruturas. Se
converteu em "um poder invisível" que se situa além do alcance de
cada indivíduo.
Então, a tentação de nos
inibirmos é grande. O que eu posso fazer para melhorar esta sociedade? Não são
os dirigentes políticos e religiosos que devem promover as mudanças que se
fazem necessárias para avançar para uma convivência mais digna, mais humana e
feliz?
Não é assim. Há no evangelho um
apelo dirigido a todos, e que consiste em semear pequenas sementes de uma nova
humanidade. Jesus não fala de coisas grandes. O reino de Deus é algo muito
humilde e modesto em suas origens. Algo que pode passar tão desapercebido como
a semente mais pequena, porém está chamado a crescer e frutificar de maneira
inimaginável.
Quem sabe, necessitamos aprender
novamente a valorizar as coisas pequenas e os pequenos gestos. Não nos sentimos
chamados a ser heróis nem mártires a cada dia, porém todos são convidados a
viver pondo um pouco de dignidade em cada rincão deste nosso pequeno mundo. Um
gesto amigável ao que vive desconcertado, um sorriso acolhedor a alguém que
está só, um sinal de proximidade a quem começa a se desesperar, um raio de
pequena alegria num coração sobrecarregado... não são coisas grandes. São
pequenas sementes do reino de Deus que todos podemos semear numa sociedade
complicada e triste que esqueceu o encanto das coisas simples e boas.
Chama a atenção, com que força os
estudos recentes destacam o caráter individualista e não solidário do homem
contemporâneo. Segundo diferentes análises, o europeu vai se fazendo cada vez
mais narcisista. Vive dependente de seus interesses e esquecido, quase que
completamente, dos vínculos que o unem aos demais homens.
C. B. Macpherson fala do
"individualismo possessivo" que impregna quase tudo. Cada um busca o
seu bem-estar, segurança e prazer. Aquilo que não lhe afeta, não lhe dá
atenção. L. Lies chega a afirmar que o "solteiro", livre de
obrigações e dependências, representa, cada vez mais, o ideal de liberdade e
autonomia do homem moderno.
Por detrás de todos os dados e
pesquisas parece haver uma realidade aterradora. O ser humano está perdendo a
capacidade de sentir e expressar amor. Não consegue sentir solicitude, cuidado
e responsabilidade por outros seres humanos que não se enquadram dentro de seus
interesses. Vive "inimizado" em suas coisas, numa atitude narcisista
que Sigmund Freud já considerava como um estado inferior no desenvolvimento da
pessoa.
Sem dúvida, dentro desta
sociedade individualista há um coletivo admirável que nos recorda, também hoje,
a grandeza que se encerra no ser humano. São os voluntários. Esses homens e
mulheres que sabem aproximar-se dos que sofrem, movidos somente por sua vontade
de servir. Em meio ao nosso mundo competitivo e pragmático, eles são portadores
de uma "cultura da gratuidade".
Não trabalham para ganhar
dinheiro. Sua vocação é fazer o bem gratuitamente. Podemos encontrá-los
acompanhando jovens toxicômanos, cuidando de anciãos solitários, atendendo
mendigos, escutando pessoas desesperadas, protegendo crianças abandonadas ou
trabalhando em diversos serviços sociais.
Não são seres vulgares, pois seu
trabalho é movido somente pelo amor. Por isso, nem todos podem ser verdadeiros
voluntários. Recordava-o, belamente, Leon Tolstoi com estas palavras:
"Pode-se cortar árvores,
fabricar ladrilhos e forjar o ferro sem amor. Porém, é preciso tratar com amor
aos seres humanos... Se não sentes afeto pelos homens, ocupe-se com qualquer
coisa, mas não deles".
Tradução de: Pe. Telmo José
Amaral de Figueiredo.
Fonte: http://padretelmofigueiredo.blogspot.com.br/
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