“Pelo trabalho que
realizamos, em ambientes de prostituição, estamos sempre nas periferias. Talvez
seja justamente necessário que sair dessa ocultação, desmontando os
estereótipos e sensacionalismos, para dar o passo para reconhecer «a pessoa»
para além da atividade que exerce e fomentar um debate corajoso, no âmbito
social e político”.
Durante muitos anos, Lourdes Perramon (Manresa, 1967) foi a diretora,
em Barcelona, do Lloc de la Dona, um centro pioneiro situado no Raval, que
acolhe e atende mulheres que exercem a prostituição. Era a alma de um projeto
que deixará de dirigir pessoalmente, porque foi escolhida como superiora geral
das Oblatas do Santíssimo Redentor. A Irmã Lourdes sentirá muito a falta da
missão, à qual dedicou tantos esforços e entusiasmo. Uma missão que, segundo
afirma, preencheu-a e fê-la feliz. Agora, a congregação religiosa a que
pertence pede-lhe para iniciar uma nova etapa de desafios. A jovem religiosa de
Manresa enfrenta-a convencida de que toda a vida consagrada deve estar «ao
serviço de uma missão e o desejo é que esta nos configure, incluindo também os
cargos institucionais de animação e de governo». A nova superiora geral, junto
com o novo conselho geral, dinamizarão a congregação nos próximos seis anos com
o objetivo de se manterem fiéis ao carisma fundacional.
Como recebeu a nomeação como superiora geral das Oblatas do Santíssimo
Redentor? Estava à espera?
Parece-me que algo assim, especialmente quando é a primeira vez,
não se espera mas, simplesmente, acontece! Mas o sentido de pertença e,
sobretudo, de co-responsabilidade e de coerência pessoal, levaram-me a aceitar,
estando muito consciente que, perante a proposta das irmãs, era necessário
confiar e disponibilizar-me. Mas não é um trabalho individual. Felizmente,
trata-se de um trabalho em equipa e creio que juntas tentaremos trazer
entusiasmo, compromisso, esperança num momento de mudanças, no âmbito
congregacional, e de desafios, em geral, para a vida religiosa e para a Igreja.
Falando de desafios, que linhas impulsionarão a vida da Congregação nos
próximos anos?
Como muitas outras congregações, estamos imersas num
processo de unificação de províncias, procurando estruturas mais ágeis, que
favoreçam tanto a qualidade de vida evangélica, como as respostas às
necessidades sociais atuais. A reestruturação jurídica já é um facto, mas o
desafio para os próximos seis anos é acompanhar o conjunto da Congregação, para
assumir e consolidar esse processo, buscando ao mesmo tempo novas fórmulas que
explicitem a liderança partilhada, as respostas corajosas e atualizadas na
missão compartilhada e um sentido profundo de vida a partir de Deus e o
compromisso para construir o Reino. Confiamos que isto levará a revitalizar a
dimensão vocacional, recrear a identidade e aproximar o carisma e a vida
religiosa à sociedade e, especialmente, aos jovens.
As intuições fundacionais continuam vigentes?
Acreditamos que continuam totalmente vigentes. No próximo
dia 1 de Junho celebraremos os 150 anos do início deste projeto, quando Antónia
de Oviedo Schöntal e José Maria Benito Serra Julià, os nossos fundadores,
abriram as portas da primeira casa para acolher mulheres que procuravam uma
oportunidade para refazer a sua vida, depois de terem sofrido a rejeição social
pela sua vinculação à prostituição. Atualmente, a situação não mudou demasiado;
tornou-se mais complexa com o surgimento do tráfico de pessoas com fins de
exploração sexual, os movimentos migratórios e um certo conceito nas cidades,
onde se quer esconder aquilo de que não se gosta. É por isso que afirmamos que
as intuições fundacionais continuam plenamente em vigor; o que muda são as
respostas que vão dirigidas à melhoria da qualidade de vida das mulheres, ao
exercício dos seus direitos como cidadãs e à insistência face a uma transformação
social.
Foi nomeada superiora geral das Oblatas num momento em que a Igreja é
convidada a sair para as periferias… É uma chamada que também assumem?
Creio que não é demasiado atrevido dizer que, pelo trabalho
que realizamos, em ambientes de prostituição, estamos sempre nas periferias.
Talvez seja justamente necessário que sair dessa ocultação, desmontando os
estereótipos e sensacionalismos, para dar o passo para reconhecer «a pessoa»
para além da atividade que exerce e fomentar um debate corajoso, no âmbito
social e político. Mas, é claro que para fazê-lo de maneira coerente,
responsável e com credibilidade, temos de manter a cumplicidade com as mulheres
que vivem esta realidade no dia-a-dia e continuar acompanhando as suas vidas
ali, onde os seus recursos mais escasseiam e os seus direitos são prejudicados.
Falando de periferias, a Irmã Lourdes Perramon era alma do Lloc de la
Dona em Barcelona. Sentirá falta do seu trabalho e dedicação a este projeto?
Sim e muito! Foram 20 anos muito enriquecedores e custa
sempre deixar aquilo que te preencheu e fez feliz. Mas, ao mesmo tempo, sei que
a aprendizagem será muito válida no meu serviço atual e, embora não possa estar
no dia-a-dia dos projectos sociais, continuarão a ser o meu «motor» e
referência. A nossa vida religiosa não pode perder nunca de vista que está ao
serviço de uma missão e o desejo é que esta nos configure, também no que
implica os cargos institucionais de animação e de governo.
Qual é o estado atual da Congregação?
A Congregação está presente em 15 países, com uma
diversidade de respostas, de acordo com a realidade e culturas diferentes.
Creio que é um momento de renovação, a partir das diretrizes do próprio
Capítulo Geral, mas também pelo momento social e eclesial e, sem fazer segredo,
parece-me que, na medida em que façamos este processo e se mostre, de maneira
simples e compreensível, a dimensão mais humana e, ao mesmo tempo,
transcendente da própria vida religiosa, pode interpelar e suscitar um certo
interesse nas pessoas mais jovens que procuram formas concretas de viver o
seguimento a Jesus, partilhando-o em comunidade e junto aos que mais o
necessitam.
Como mulher e como jovem com uma certa autoridade na Igreja… sente-se
indo contra a corrente? Qual deve ser, hoje, o papel da vida religiosa feminina
na Igreja e no mundo?
Felizmente, na nossa sociedade plural têm lugar muitas e
diferentes «correntes» e não creio que a vida religiosa vá contra. Parece-me
que se trata de caminhar unidos e somar, com tantos grupos dentro e fora da
Igreja, que desejamos uma Igreja mais evangélica e uma sociedade mais justa.
Talvez o que falta seja estabelecer alianças e dar a conhecer os pequenos
espaços de esperança que tentamos construir, para que saindo do anonimato,
motivem outras pessoas e se tornem mais sólidos e abrangentes.
Fonte: www.irmasoblatasdoredentor.pt
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