Bispo do Marajó denuncia o caso e
é ameaçado de morte. “Já vi uma mãe que levava uma menina de 10 anos para uma
dessas balsas. Depois um homem aparecia com R$ 2,40 e um pequeno balde com
vísceras de porco ou de boi. Isso é o que vale uma menina em algumas regiões do
Marajó".Homem suspeito de abusar sexualmente das meninas confessou
o crime.
A cidade de Melgaço fica no
arquipélago do Marajó, a 290 km e Belém. Apesar da aparente proximidade
geográfica, o município é separado da capital por um abismo econômico: a cidade
tem o pior Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) do país, e seus 26 mil
habitantes convivem com o problema alarmante da exploração sexual que atinge
crianças.
Nos rios de Melgaço, como o
Tajapuru, o principal da região, crianças e adolescentes usam canoas para se
aproximar das balsas que fazem o transporte de cargas entre Belém e Manaus. A
princípio, essas meninas entram nas embarcações para vender açaí, farinha,
palmito, entre outros produtos. Mas em muitos casos, acabam fazendo programa em
troca de dinheiro, comida e até combustível.
bispo dom José Luis Azcona
O bispo dom José Luis Azcona é
quem denuncia a situação. Ele vive na região há trinta anos e já testemunhou
casos em que as crianças se ofereceram aos ocupantes das balsas com o
consentimento da própria família. ‘’Já vi uma mãe que levava uma menina de 10
anos para uma dessas balsas. Meninas que se chamam ‘balseiras’. Depois um homem
aparecia com R$ 2,40 e um pequeno balde com vísceras de porco ou de boi. Isso é
o que vale uma menina em algumas regiões do Marajó'', disse.
Abuso e intimidação
Duas meninas de sete anos de
idade, que moram em Melgaço, foram abusadas pelo vizinho, que também é
considerado suspeito pela polícia de violentar uma terceira criança do bairro
em que mora. Ele está preso e à disposição da Justiça.
Em depoimento, uma das crianças
disse que o homem ofereceu bombons e pirulitos para ela, levando ela e mais
duas crianças para a casa dele. Quando uma das crianças disse que ia contar a
situação para o pai, o homem a ameaçou de morte.
Para a polícia, o homem assumiu
que manteve relação sexual com as três garotas. Inconformada, a mãe de uma das
crianças, que prefere não se identificar, lamenta. “Não consigo acreditar que
isso aconteceu com a minha filha. Isso não é gente. Ele é um monstro”, disse.
Filhos de balseiras
Nas palafitas do Tajapuru, muitas
se tornam mães aos 13, 14 anos. “Não nego o que aconteceu. Daquela ali o
primeiro marido dela era, era de balsa”, diz uma das meninas.
Uma jovem que engravidou de um
caminhoneiro que viajava na balsa conta o que aconteceu com ela. “A gente tinha
levado limão e mais um negócio. Aí eu peguei e ofereci. Ele falou que queria
ficar comigo, falou que eu era bonita...
Aí eu falei que ficava com ele e entrei para o camarote dele".
Ao ser indagada sobre a
frequência com que isso acontece, a menina disse: “Acontece muito".
Crimes e ameaças
Manter relação sexual com menor
de 14 anos é crime de estupro de vulnerável, com penas que variam de 8 a 15
anos de prisão. Também é crime a exploração sexual de crianças e adolescentes.
A pena é de 4 a 10 anos de prisão.
Para o delegado Rodrigo Amorim, a
polícia atua não só na questão da repressão, mas também de conscientização dos
balseiros e caminhoneiros que trafegam no rio a não dar carona para crianças e
adolescentes.
Segundo o bispo Azcona, falta
empenho as autoridades para combater o problema da ilha. De tanto denunciar a
situação de violência sexual, ele conta que já foi até ameaçado de morte.
"Eu sou consciente de que podem me matar, mas eu não posso tolerar mais
que este fenômeno tão triste aconteça diante da minha cara".
O governo do Pará afirma que
investiga as denúncias e que oferece proteção aos que lutam contra a exploração
sexual no Marajó. Para Jorge Bittencourt, presidente do Propaz o governo vem
dando esse suporte.
“Atendemos todos os atores da
sociedade, como Dom Azcona e outras pessoas que estão no arquipélago para
manter a integridade deles. Todas as denúncias são encaminhadas para a
secretaria de segurança e é repassada para nossas unidades nos municípios do
arquipélago do Marajó. São diversas operações, e também trabalhos nas áreas
social e de prevenção", conclui.
Fonte: Globo
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