Pearls Negras (ou Pérolas Negras) são Jeniffer, Mariana e
Alice, três meninas negras nascidas e criadas no Vidigal, favela do Rio de
Janeiro, que se conheceram no grupo de teatro Nós do Morro, onde tiveram aulas
de rima e conheceram a fundo o movimento hip hop.
Antes que se fale a respeito do fenômeno Pearls Negras, é
necessário retomar a longa caminhada trilhada pelas mulheres dentro do hip hop
no Brasil. “As mulheres sempre fizeram parte de todo o início do hip hop no
Brasil e infelizmente não se tem dados precisos sobre suas participações, que
se misturam com a história do início da carreira de muitos nomes conhecidos
hoje em dia. O que temos hoje são retalhos. Pedaços de vivência que fazem parte
das reportagens e de todo material bibliográfico encontrado que contam a
história na visão masculina, pelo menos neste início do movimento” – é o que
afirma Priscilla Vierros, jornalista e ativista da Frente Nacional de Mulheres
no Hip Hop no livro Perifeminas.
De fato, a história do hip hop contou com inúmeras b girls,
rappers, DJs e grafiteiras espalhadas por vários estados do país, que
introduziram a linguagem do movimento em suas comunidades e consolidaram o Hip
Hop no Brasil. Dina Di, Sharylaine, Lady Rap foram algumas das pioneiras do rap
brasileiro e que dificilmente são lembradas no corre dessa trajetória. Isso
porque a mulher que ousa cantar rap desafia a sociedade machista e acaba se
deparando com o preconceito dentro do próprio movimento. Para tentar driblar o
machismo e serem tratadas em pé de igualdade em relação aos homens, muitas
garotas assumiram uma postura considerada masculinizada, utilizando vestimentas
masculinas de modo a esconder suas formas físicas femininas.
As rappers também enfrentaram o machismo do mercado
fonográfico, que exigia um rap feminino com uma batida mais “amena” e sem letra
de protesto. Além disso, muitas delas precisaram interromper sua carreira por
conta da maternidade, já que a música ainda não lhes garantia condição
financeira compatível com suas necessidades. É por essas e outras que devemos
considerar uma grande conquista o sucesso dessas três minas do Vidigal que
reivindicam o “rap de saia”, falando sobre a vida na favela e reafirmando em
suas letras a autoestima da quebrada e da mulher negra – e que está cada vez
mais ganhando visibilidade internacionalmente.
Pearls Negras (ou Pérolas Negras) são Jeniffer, Mariana e
Alice, três meninas negras nascidas e criadas no Vidigal, favela do Rio de
Janeiro, que se conheceram no grupo de teatro Nós do Morro, onde tiveram aulas
de rima e conheceram a fundo o movimento hip hop. Mais tarde, com o
reconhecimento local, chamaram a atenção de produtores britânicos do selo
independente Bolabo Records, gravando assim a primeira mixtape do conjunto,
intitulada Biggie Apple. O Vidigal é ambiente constante em suas letras, que
mesmo marcado pelo clima de insegurança e violência policial, é, como elas
cantam em “Make it last”, o melhor lugar de se morar: apesar dos problemas que
assolam as vielas, é ali que o trio encontra amor e amizade, ambiente que as
constituíram artistas.
Além de conferir reconhecimento e visibilidade a sua
quebrada, as Pérolas Negras também fazem referência aos protestos de 2013,
politizam a temática e cobram aos (e às) governantes do país: “Mr. President” é
provavelmente um dos primeiros raps em que tanto o denunciador quanto o
denunciado da mensagem são mulheres: o povo protestando pelo bem desse país /
por favor, sua presidenta, o que é que você diz?
A reivindicação pela autoestima periférica é também marcada
pela questão feminista negra na medida em que as Pearls comemoram em suas
letras o fato de serem mulheres negras da favela: “pretinha de ferro”,
estilosa, sucesso na pista, que faz os meninos pirarem e as invejosas tremerem.
Nesse contexto surge o tema do recalque, tão característico do rap e
principalmente do funk feminino carioca.
Algumas feministas insistem em ler a ideia do recalque como
perpetuação do discurso da rivalidade histórica entre mulheres, que nos coloca
em posição de constante disputa e revanchismo. Porém, um ouvido mais atento
consegue reconhecer que muitas vezes o recalque perpassa questões de raça e
classe, pois o lado de lá da ponte têm cor e CEP: é branco e dos bairros da
elite.
Historicamente, o rap sempre polarizou com aqueles que
deslegitimam a poética da quebrada, aqueles que pertencem a mesma classe
daqueles que os oprimem cotidianamente. Bastar ouvir, por exemplo, “Hey boy”,
música dos Racionais MCs presente em seu disco de estreia “Holocausto Urbano”,
em que eles mandam o papo reto para os playboys que querem colar com eles: hey
boy,o que você está fazendo aqui / meu bairro não é seu lugar. E ainda demarcam
o orgulho pela quebrada, assim como fazem as minas do Vidigal: (…) Não tenha dó
de mim /porque esse é meu lugar/ mas eu o quero mesmo assim/ mesmo sendo o lado
esquecido da cidade/ e bode expiatório de toda e qualquer mediocridade.
Na música “O futuro” das Pearls Negras, percebemos a tensão
entre a mina da favela –“princesinha de aba reta” – e a recalcada faladora –
“barbie falsa”. Ora, quem mais desempenha o papel dessa invejosa além da
patricinha de classe média que se apropria culturalmente da estética hip hop?
Sabemos que é treta demais para as classes dominantes assistir ao sucesso do
rap e do funk, gêneros musicais do gueto, o que explica a predileção do mercado
mainstream em lançar figuras embranquecidas, como a Anitta. Algo semelhante
aconteceu na década de 1990, quando, no auge dos Racionais, a indústria
fonográfica lançou Gabriel, o pensador, rosto branco e de classe média, com
letras inofensivas e desprovidas da postura considerada agressiva do rap.
Ainda, sobre o recalque, as Pérolas arrematam a letra com crescemos na favela e
mandamos rimas concretas e sou negra, tenho beleza e mando meu flow.
Empoderamento mil.
Resta-nos ainda compreender porque as Pearls Negras
despertam mais o interesse do mercado gringo do que o da nossa mídia, que
apesar de reconhecer e eleger boas figuras masculinas do rap que vieram da
periferia, como Emicida e Criolo, é incapaz de fazer o mesmo com as minas.
Felizmente a internet colaborou para transformar em parte a configuração do
cenário do rap das minas, projetando vários nomes de talento do movimento que
aos poucos ganham a cena do nosso mercado. Muita treta pros machistas de
plantão.
Algumas fontes:
Fonte: http://blogueirasnegras.org/
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