"Somos contra a violência, não temos rancores contra
ninguém. Por trás do nosso sorriso, há lágrimas, e o nosso sarcasmo é uma
reação ao caos". Na última carta do cárcere, há poucos dias, as ativistas
russas do "Pussy Riot" reivindicam com orgulho a sua batalha.
A
partir de hoje, as três meninas enfrentam o processo sob a acusação de
"atos de vandalismo". Na realidade, a culpa delas é de ter cantado no
dia 21 de fevereiro, a poucos dias da eleição, uma oração rock dentro da igreja
de Cristo Salvador, em Moscou.
A reportagem é de Anais Ginori, publicada no jornal La
Repubblica, 30-07-2012. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
"Mãe de Deus, livra-nos de Putin", era o refrão.
Maria Alekhina, Nadezhda Tolokonnikova e Yekaterina Samutsevich, presas em
março, correm o risco de pegar até sete anos de prisão. Em favor da sua
libertação, mobilizaram-se estrelas como Madonna e Sting, e também intelectuais
como Salman Rushdie.
Com os seus rostos de jovens rebeldes, as "Pussy
Riot" são os últimos ícones de uma contestação no feminino, agora
globalizada. Da Primavera Árabe às manifestações estudantis no Chile, dos
grupos dissidentes no Irã e na China à oposição cubana, o protesto é cada vez
mais feminino. Não se trata, como antes, de ser porta-voz de reivindicações feministas,
ao menos não apenas isso. As jovens que jogam a luva de desafio contra as
ditaduras fazem isso em nome de direitos e liberdades universais.
Elas navegam pela onda da internet, muitas delas são
blogueiras, mas sabem sair às ruas, entrar no jogo fisicamente, usando o
próprio corpo (veja-se o grupo ucraniano Femen que desfila de topless).
Mulheres contra. Com força e coragem, assim como e mais que os homens. O
exemplo que vale para todas é o de Aung San Suu Kyi, que optou por sacrificar
tudo, afetos e família, em nome da sua batalha democrática.
A líder da oposição birmanesa aceitou passar grande parte da
sua vida na prisão, forçando finalmente o regime dos generais birmaneses a
ouvir algumas das suas demandas. Já não é mais uma exceção. O Nobel da Paz de
2011 foi para três mulheres: a iemenita Tawakkul Karman e as duas liberianas
Leymah Gbowee e Ellen Johnson-Sirleaf.
Claro, são casos diferentes. Johnson-Sirleaf foi eleita
presidente do seu país, trabalhando pela reconciliação depois da guerra civil, enquanto
Karman e Gbowee permaneceram apenas como dissidentes. Mas todas representam,
segundo o Comitê de Oslo, a "luta não violenta em favor da segurança das
mulheres e do seu direito de participar no processo de paz".
Um outro rosto feminino que coaliza protestos e
manifestações é o de Yulia Tymoshenko, líder da oposição na Ucrânia, presa há
um ano. Muitos são os apoios internacionais que ela recebeu, até agora sem
resultados. Antes ainda, havia a franco-colombiana Ingrid Betancourt,
sequestrada pelos guerrilheiros das FARC e libertada somente depois de seis
anos.
Passionais, rebeldes, revolucionárias. Para cada uma dessas
mulheres, há a tentação de dar rótulos fáceis, embora nenhuma delas se pareça.
Nada liga a estudante Camila, que com o seu belo rosto tornou famosas as
demandas do movimento chileno pela defesa da educação pública, com a cubana
Yoani Sánchez, que denuncia em seu blog os abusos do regime castrista.
Muitas vezes, heroínas por acaso, como Neda, a menina
iraniana morta há três anos e que se tornou símbolo da oposição contra o regime
dos aiatolás. Além dos resultados políticos, de fato, o protesto no feminino
tem um forte impacto comunicativo. Os vídeos online das "Pussy Riot",
com os seus blitz coloridos e punk contra Putin, Medvedev e outros poderosos de
Moscou, são muito mais clicados do que qualquer comunicado ou site da oposição
russa. A sua aparição no julgamento, transmitido ao vivo, se tornará mais uma
ocasião de mobilização.
Haveria tanta atenção da mídia se, no lugar das três graciosas
jovens, houvesse jovens meninos imberbes? "Não basta um rostinho bonito
para levar às ruas um milhão de estudantes e pais, e ter o apoio da maioria dos
chilenos", respondeu há alguns meses Camila Vallejo Dowling, 23 anos,
quando estava no auge da sua notoriedade.
Mas há também quem decidiu explorar essa vantagem.
"Antes, marchávamos normalmente, e ninguém nos ouvia. Por isso decidimos
tirar a roupa", contam as ativistas ucranianas do Femen, que transformaram
a nudez em um ato de militância política.
Elas lutaram (em vão) contra a prostituição e os bordéis
organizada no país em vista das disputas europeias de futebol. Eles foram para
as ruas de Kiev sem camisa, às vezes só de calcinha, sem se importar se fazia
frio.
Loiras, magras, belíssimas. Uma militante do Femen se jogou
em cima do patriarca da Igreja Ortodoxa Russa, Kirill, como um gesto de
solidariedade com as "Pussy Riot". "Fora daqui!", gritou a
mulher, de jeans e peito nu, apoiada por um grupo de nacionalistas. Ela também
foi presa por "atos de vandalismo".
Há alguns meses, a blogueira egípcia Aliaa Magda Elmahddy
postou no Twitter um autorretrato em que aparecia em preto e branco, com
meias-arrastão e uma flor vermelha nos cabelos. Ela queria denunciar assim a
dupla ameaça que as mulheres da Primavera Árabe sofrem: a dos militares e a dos
integralistas islâmicos. Na Tunísia, onde a revolução contra as ditaduras
também começou, uma outra ativista, Hanane Zemali, se desnudou na rede contra o
machismo e o retorno da sharia. Outras meninas seminuas marcharam pelas ruas de
Jerusalém, desafiando os ultraortodoxos. A artista dissidente chinesa Ai Weiwei
se fotografou rodeada por quatro mulheres. Todas vestidas, com as mãos sobre as
suas partes íntimas e um sorriso irônico.
O corpo feminino voltou a ser o meio e a mensagem. A arma
pacífica a ser jogada contra a opressão e a injustiça. Sempre foi assim, basta
lembrar a lenda de Lady Godiva, esposa do conde de Coventry, que cavalgou nua
para obrigar o seu marido a renunciar o enésimo tributo. E, no século XIX, o
pintor Delacroix retomava Marianne como alegoria da Liberdade guiando o povo
(detalhe na figura acima), uma guerreira com os seios parcialmente descobertos.
Passaram-se quase dois séculos, mas o fascínio da mulher
revolucionária, aquela que se insurge, está intacto.
Ou, melhor, na civilização das imagens, tornou-se talvez
ainda mais forte. Com as suas minissaias coloridas e aquele nome malicioso, as
"Pussy Riot" já são um símbolo. A Anistia Internacional pediu a sua
libertação, declarando-as presas políticas. Para elas, organizam-se
abaixo-assinados, sit-in em frente às embaixadas, shows de rock. Três jovens
desarmadas, indefesas, mas muito sexies contra o todo-poderoso e viril Putin.
Jamais subestime a força de um ícone.
Fonte: Ihu
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