A jornalista Ana Carolina Nunes
ajudou o Metrô de São Paulo a criar uma campanha contra o assédio às mulheres
nas estações e nos vagões.
“Desespero”. Foi isso que a jornalista Ana
Carolina Nunes, de 24 anos, sentiu ao ouvir as notícias de abuso sexual no
metrô, no ano passado.Todos os dias, o metrô atende mais de 4 milhões de
pessoas. Dessas, 55% são mulheres. Os registros de abuso e tentativa de estupro
nas dependências do metrô subiram de 65, de janeiro a agosto de 2014, para cem,
no mesmo período deste ano. Moradora do bairro da Saúde, na Zona Sul de São
Paulo, Ana circula pela cidade sobre trilhos. E assim como muitas – se não a
maioria – das usuárias do metrô paulista, a jornalista já passou por situações
semelhantes às das mulheres do noticiário. “É uma coisa que todo mundo sabe que
acontece. Toda mulher que anda de transporte público, se não passou por isso,
conhece alguém que já passou”, afirma.
A jornalista Ana Carolina Nunes
ajudou o Metrô de São Paulo a criar uma campanha contra o assédio às mulheres
nas estações e nos vagões (Foto: Edu Lopes/Click de Gente/ÉPOCA, Produção
Daniele Verillo, Makeup Adilson Vital)
A experiência no mestrado em
Políticas Públicas ajudou Ana a montar um plano de comunicação para o metrô,
alertando sobre o assédio contra mulheres no transporte público. Com a ajuda da
amiga Nana Soares, Ana apresentou um projeto que prevê a divulgação da campanha
nos trens e estações do metrô, além do aprimoramento dos canais de denúncia e
treinamento dos agentes. Hoje, frases como “Você não está sozinha. Estamos
juntas contra o abuso sexual” estampam cartazes e monitores dos vagões. Mas até
chegar aos passageiros – mais de um ano depois que foi protocolado – o projeto
de Ana passou por muitos departamentos até ser finalmente implementado, em
agosto deste ano.
“O processo de convencimento não
foi árduo, mas existia uma resistência inicial em reconhecer que o problema era
deles”, afirma. “Eles nunca saberiam o quão grave era esse problema a partir do
que é notificado oficialmente. Nos casos de violência contra a mulher, é ela
quem, na maioria das vezes, é tida como culpada pelo abuso que sofreu”, diz.
Não raro, Ana era uma das poucas mulheres nas inúmeras reuniões com o metrô.
“Esses espaços são extremamente masculinos. Quando você avisa que tem um monte
de mulher sendo abusada dentro do serviço deles, parece coisa de outro mundo”,
afirma.
Ana demorou em se reconhecer
feminista. Foi na faculdade que resolveu abraçar o nome. “Fui me descobrindo
feminista a cada situação que tolhia minha liberdade”. Na adolescência, Ana
resolveu por em xeque o estereótipo feminino: andava descabelada, sentava de
perna aberta, praticava esportes e falava abertamente sobre sexo. Quando alguém
lhe dizia que aquilo não era coisa de menina, tinha a resposta pronta: “Esse é
meu jeito e eu não vou mudar quem eu sou”, dizia.
Vítima e testemunha de assédios
sexuais no transporte público, Ana decidiu enfrentar o tabu que é o direito da
mulher ao próprio corpo. “"As mulheres podem votar e trabalhar, mas não
usar o metrô porque podem ser violentadas. Não posso ir à balada com a roupa
que eu quiser porque posso ser agarrada por um homem que acha que tem direito
sobre meu corpo”, Para Ana, a igualdade entre homens e mulheres só acontecerá
se cada vez mais mulheres ocuparem e disputarem os espaços – sejam eles no
mercado de trabalho, na política, na universidade, na rua. E é dessa mudança
que Ana quer fazer parte.
Fonte: Revista Época
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