Marcas acordam para público
feminino e criam comerciais sem conotação sensual, em que elas são
protagonistas. Nas redes sociais e nos
bares, grupos investem contra machismo e preconceito sobre o que é “bebida de
mulher”. Ela pede ao garçom uma cerveja. Ele escolhe um suco de laranja sem
açúcar. Minutos depois, volta o garçom apressado. Serve a cerveja a ele. A ela
entrega o suco.
A situação, vivida por esta dupla
de repórteres em um bar paulistano na última semana, é rotina para casais cujas
mulheres apreciam um trago de cerveja.
Ganhou fama recente nas redes
sociais o vídeo de um movimento chamado “We All Love Beer” (todos nós adoramos
cerveja). O filme questiona por que a voz das mulheres não é ouvida nos bares.
Na sequência, mostra confusões de
garçons que, doutrinados pelo mito de que cerveja é coisa de homem, evitam
repassar o copo etílico a mãos femininas.
Uma pesquisa da Euromonitor
aponta uma crescente disposição das mulheres brasileiras para comprar bebida
alcoólica. A parcela que afirmou consumir fora de casa com alguma frequência
subiu de 54% para 65% entre 2011 e 2013.
De acordo com a Nielsen, no
consumo específico de cerveja, elas já respondem por 35%.
NOVAS EXPERIÊNCIAS
Um mercado historicamente
machista começa a se dobrar à crescente participação de mulheres na demanda.Na
última semana, a Heineken lançou nova campanha publicitária em que põe a mulher
no papel de destaque. Até aí, sem novidade.
O que surpreende o consumidor é
que a protagonista do comercial não é o mulherão que insinua enormes seios e
glúteos em pouca roupa.
Desta vez, a personagem é uma
moça de curvas discretas, com ares de inteligência e perspicácia, capaz de
salvar o agente secreto 007, interpretado por Daniel Craig, de uma terrível
cilada.
O diretor de marketing da
Heineken no Brasil, Bernardo Spielmann, afirma que a prioridade da marca é
mostrar personagens “confiantes para se arriscarem em novas experiências”. “O
público feminino está aumentando sua participação no consumo de Heineken, que
hoje já representa cerca de 40% do nosso volume”, afirma ele.
A Ambev, que já foi alvo de
críticas por comerciais machistas diversas vezes (veja quadro abaixo), também
tenta se renovar.
Segundo a diretora de marketing
do núcleo de Antarctica, Maria Fernanda Albuquerque, a marca procura retratar a
realidade de forma mais fiel e incluir a mulher como público atuante.
Na próxima campanha, a atriz Tatá
Werneck e a cantora Gaby Amarantos irão representar quem bebe cerveja e fugir
do estereótipo de mulher sem opinião.
CONFRARIA FEMININA
Para Sergio Lage, professor da
ESPM, essa massificação do consumo feminino é relativamente nova e atrai
empresas, que “tentam romper com a velha lógica que trata a mulher como
objeto”.
“Elas estão nas redes sociais e
reagem a mensagens machistas. Muitas deixam de consumir determinadas marcas”,
afirma Lage.
Ele reconhece o esforço de algumas
marcas em aumentar o interesse e as ocasiões de consumo, se comunicar com o
público feminino e “criar valores emocionais mais efetivos”, mas não
generaliza.
“Mas ainda há marcas que preferem
bater na tecla das campanhas tradicionais e não se posicionam para atender essa
nova mulher”, diz.
O interesse feminino pelo produto
evoluiu na esteira da sofisticação do consumo por meio das cervejas artesanais
–hoje o segmento que mais cresce no setor e desafia multinacionais, como
demonstram as gigantes SABMiller e AB InBev tentando adquirir produtores
artesanais a fim de capturar tal transição.
A tendência impulsionou, nos
últimos anos, a criação de confrarias só de mulheres para harmonizar e degustar
lançamentos da bebida ou cervejas preparadas pelas próprias participantes.
“O consumo feminino cresceu nos
últimos cinco anos e há até uma discussão se a mulher tem paladar diferente e
deveria haver uma cerveja específica para ela”, diz a cervejeira Eduarda Cabral
Dardeau, fundadora da confraria FemAle Carioca.
“Não é preciso fazer cerveja com
pouco álcool para a agradá-la. Pode ser encorpada e envelhecida.”
O avanço no consumo feminino vem
acompanhado por iniciativas para criticar o modelo mais comum na publicidade.
Alex Caíres lidera o projeto de
documentário “Mulher, Cerveja e Machismo”. A ideia surgiu a partir da
personagem Verão, interpretada por uma ex-bailarina do Faustão em vídeos da
Itaipava.
“A propaganda representa a mulher
como um produto de consumo, um objeto, um fetiche, e quase nunca como consumidora
ou protagonista”, justifica.
Fonte: Folha de SP
Nenhum comentário:
Postar um comentário