Movimento social fez "grafitaço" para apagar nome exposto na lista das "mais vadias" que circula em escolas de SP (Daia Oliver/R7)
Moda entre alunos da periferia de
SP, "TOP 10" circula na internet e até dentro das escolas.
Uma lista chamada "TOP
10", que circula entre alunos de escolas públicas nas periferias de São
Paulo, já motivou tentativas de suicídio de pelo menos 12 garotas desde o ano
passado no Grajaú, Parelheiros e Embu das Artes, segundo apuração da reportagem
do R7 com os movimentos sociais que fazem atendimento às garotas.
Os alunos montam rankings
classificando dez meninas como "vadias". Os nomes circulam pelo
WhatsApp, vídeos no Youtube, Facebook e até cartazes colados no interior das
escolas. Cada colégio tem sua lista e alguns alunos as divulgam semanalmente.
As escolhidas que ficam mais de uma semana no ranking vão subindo de colocação.
Desde que a lista começou, há quase um ano, a rotina dessas meninas se
transformou em uma espécie de prisão e condenação sem que nada tivessem feito.
Grupos ativistas tentam reverter a situação das vítimas e conscientizar os
adolescentes do crime que estão cometendo.
Os estudantes pegam fotos das
redes sociais para montagem ou se utilizam de imagens de nudez que as meninas
mandaram para algum namorado que repassou para os colegas. A lista tornou-se conhecida
não só entre os alunos, mas também nos bairros, depois que muros com
xingamentos às vítimas foram pichados. No Jardim Castro Alves, no Grajaú, zona
sul da capital, “S. L. Puta Top 10” ficou exposto por meses até que foi apagado
por um "grafitaço" promovido pelo movimento social "Mulheres na
Luta".
Algumas vítimas conversaram com o
R7, mas preferiram não se identificar. T. P., de 15 anos, é uma das garotas que
tiveram o nome divulgado em uma lista no Grajaú. Ela afirma que estava em casa,
no Jardim Varginha, quando uma amiga a avisou do "TOP 10".
— De um dia para o outro, todo o
bairro me conhecia e me apontava como piranha. Eu estava em 6º lugar no
"TOP 10" com o argumento de que eu me achava e pagava de gostosa na
escola. Depois, minhas amigas saíram no "TOP 10 Dá a b...... para o
namorado e deixa o c... para os moleques na rua”. Pior foram as minhas amigas
que eram lésbicas e os pais não sabiam e fizeram uma lista disso. Todo mundo
ficou sabendo. Quem quer ir para a escola depois disso?
Ela afirma ainda que frequentava
uma igreja evangélica e passou a sofrer preconceito no local depois que outros
integrantes ficaram sabendo.
— Eu tive que parar de ir até na
igreja, porque perguntaram como eu era evangélica e estava numa lista dessas.
Só que eu não fiz nada para estar nela. Eu não tenho culpa.
Nem mesmo os pais sabiam o que se
passava com as filhas. A dona de casa I.M., do bairro Barragem, em Parelheiros,
conta que a filha, de 14 anos, ficou uns dois dias chorando trancada no quarto
e não queria ir para a escola.
— Ficamos desesperados porque
ninguém entendia nada. Depois soubemos que ela estava nesse "TOP 10"
falando que ela era mais rodada que pneu de caminhão. Tivemos que conversar
muito, dar muita atenção para animá-la e fazer com que retornasse para a
escola. Ela ainda sofre porque anda na rua e tiram sarro dela.
Elânia Francisca, do coletivo
Mulheres na Luta, conta que o movimento passou a prestar apoio às meninas
expostas, incluindo as que tentaram suicídio, e a orientá-las. Ela afirma que o
movimento busca fazer ações para explicar sobre sexualidade aos adolescentes.
— Nós percebemos que essas
meninas eram questionadas pela família porque estavam em uma lista. Como se
elas fossem culpadas disso. Existe também a questão da rivalidade feminina, uma
vez que muitas listas do "TOP 10" são feitas por outras meninas. Nós
estamos oferecendo todo o apoio a essas meninas expostas, mas queremos ir mais
além. Queremos falar sobre a sexualidade com os adolescentes e ensinar a
questão do respeito, do companheirismo, do sexo. De que uma menina que enviou
uma foto em um momento de intimidade não deve pagar por isso pelo resto da
vida.
Iniciativas
O R7 esteve no Grajaú para
acompanhar a ação de grafite para apagar os nomes e xingamentos dos muros. Os
moradores falaram sobre os problemas do bairro e que veem o "TOP 10"
como o reflexo da falta de cuidados do Estado com a educação, cultura e lazer
nos bairros. A moradora Juciele Cristina, mãe de uma menina que estuda em uma
escola pública do bairro, afirma que é comum que as relações sexuais aconteçam
cada vez mais cedo, com pouca informação.
— Ninguém fala sobre sexualidade
com as crianças daqui. Elas aprendem com as letras de funk, com o coleguinha
que também aprendeu errado, por isso não sabem respeitar o outro. Aqui não temos
lazer, convivemos com uma constante violência policial, com bailes funk
frequentados por crianças, com descaso do Estado. O "TOP 10" é só um
dos problemas atuais. Temos muitos.
Sidineia Chagas, do movimento
Escritureiros, diz que os problemas do Grajaú são os mesmos de Parelheiros,
onde o grupo atua. Ela afirma que estão tentando uma aproximação com os
adolescentes para falar sobre o "TOP 10". Atualmente, seis meninas
estão em atendimento depois de integrarem listas. Elas apresentaram depressão e
evasão escolar.
— A gente sabe que nem camisinhas
os meninos querem usar. Estamos chamando a comunidade para conversas sobre o
assunto e queremos que essas meninas expostas tenham sua auto-estima de volta.
Que consigam ver a vida com otimismo depois de uma coisa terrível dessas.
Listas "TOP 10" do ABC
Paulista, Minas Gerais, Paraná e Rio de Janeiro também circulam pela internet.
Existe um "TOP 10" dos meninos, mas ele é visto como um
"prêmio" pelos eleitos. Os garotos são "pegador do Grajaú"
ou "Come 12 em duas horas", reproduzindo uma cultura machista que
vitima as meninas. Os adolescentes relataram que as escolas não fazem uma
orientação específica sobre o assunto. Apenas retiram cartazes que
eventualmente são colados nas paredes das unidades.
Fonte: Noticias R7
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