A CF é proposta todos os anos para os católicos e para a
sociedade no tempo da quaresma, como um itinerário de libertação pessoal,
comunitária e social. “A Campanha da Fraternidade de 2014 é um importante
passo!”, disse a Dra Inês a ZENIT. O motivo é que “Certamente um forte trabalho
de esclarecimento e prevenção para a população ajuda que vítimas em potencial
não sejam captadas pelos criminosos”.
Para introduzir-nos no tema, ZENIT entrevistou Inês Virginia
Prado Soares, que é doutora em Direito pela PUC/SP e Procuradora Regional da
República.
Eis a entrevista.
Cara Inês, podemos acreditar nas sondagens e estatísticas
que mostram o número de pessoas em situação de tráfico humano no Brasil? Quais
são as principais formas de tráfico conhecidas?
Existem três formas de tráfico humano, que são: tráfico para
fins de exploração sexual, para fins de exploração para trabalho análogo ao
escravo e para fins de extração de órgãos. As estatísticas realmente não
representam o real número de pessoas traficadas no Brasil. Primeiro porque
muitas vítimas não se sentem na condição de vitimas, elas acreditam que
escolheram aquele caminho e que não há crime. Daí elas não denunciam às
autoridade. Depois, há poucas pesquisas sobre o tema e o estabelecimento de metodologias
para identificação do crime e das vítimas é uma tarefa que foi assumida bem
recentemente pelo governo, pela Secretaria Nacional de Justiça do Ministério da
Justiça. No mais, estatísticas são ainda muito precárias, seja porque não
abrangem os três tipos principais de tráfico de pessoas, seja porque não
engloba os diversos perfis de vítimas (potenciais, inclusive!).
Em quais ambientes é mais propício que aconteça, entre os
mais pobres, nas cidades menos privilegiadas ou também pode acontecer entre a
classe média e alta sociedade?
Não sei dizer qual é o pior, pois são formas de violência
diferentes e todas gravíssimas. O tráfico para fins de exploração sexual é o
que atinge o maior número de vítimas e há muitos relatos de atrocidades e até
de mortes. Além disso, a pessoa traficada que consegue "escapar"
sofre um grande preconceito e tem enorme dificuldade de recompor sua vida.
Como combatê-lo?
Os especialistas no assunto indicam quatro tipos de atuação:
a prevenção (campanhas educativas, como a Campanha da Fraternidade de 2014), a
repressão/responsabilização (trabalho da polícia e do Ministério Público no
combate ao crime organizado e especialmente às organizações criminosas
envolvidas com o tráfico humano), o acolhimento às vítimas (trabalho para o
poder público, mas também para a sociedade civil, inclusive para congregações
religiosas que tenham estrutura para acolher essas pessoas com a finalidade de
que não voltem a ser vítimas e também para que possam refazer suas vidas longe
da marginalidade) e o estabelecimento de parcerias (entre ONGs, entre sociedade
e poder público etc).
Como a instituição Igreja Católica poderia influenciar para
o desmantelamento das redes de tráfico de pessoas escravidão no país?
O tráfico de pessoas tem um pressuposto muito conhecido na
doutrina católica: que é ver o próximo como alguém merecedor de direitos.
Lembro o tema da Campanha da Fraternidade de 1969: "Para o outro, o
próximo é você". A Campanha da Fraternidade de 2014 é um importante passo!
Certamente um forte trabalho de esclarecimento e prevenção para a população
ajuda que vítimas em potencial não sejam captadas pelos criminosos. Além disso,
a informação permite uma mudança de olhar: de que o crime existe e que a pessoa
em situação de tráfico é uma vítima e não uma criminosa, que ela merece ser
acolhida e protegida. Assim, se uma moça foi para o exterior (ou mesmo saiu de
sua cidade para outra) porque quis e acreditou na proposta do aliciador (que
lhe parecia alguém que não lhe faria mal) e lá ela foi privada de sua liberdade
e explorada sexualmente, ela é uma vítima, nada mais que isso. Fiz referência à
Campanha da Fraternidade de 1969 e sei que tínhamos outro cenário e naquele
momento tinha um objetivo mais restrito...eram outros tempos no alcance pelos
meios de comunicação, mas penso que no tema do tráfico de pessoas, é bem
importante que os católicos lembrem que aquela pessoa em situação de tráfico
precisa que o próximo/você a ampare.
A nossa legislação penal típifica esses crimes e assegura
penas severas para os mesmos?
A nossa legislação precisa de aperfeiçoamentos para abranger
todas as ações criminosas praticadas no tráfico de pessoas. São muitas etapas e
partícipes. Mas estamos nos aperfeiçoando... No plano internacional temos um
documento da ONU, o Protocolo de Palermo, que dá as diretrizes para que cada
país trate do assunto no plano interno. Mas precisamos de leis mais rígidas,
com certeza.
Fonte: Zenit
Nenhum comentário:
Postar um comentário