Crianças indianas resgatadas do trabalho infantil esperam em Nova Délhi para serem levadas de volta às suas aldeias.
Ativistas e legisladores exortam o governo dos Estados
Unidos a exigir das companhias maior transparência em sua cadeia de
fornecimentos, com o objetivo de frear o tráfico de seres humanos.
Estima-se
que entre 14 mil e 17 mil pessoas por ano entram neste país contra sua vontade
ou enganadas, e que há dezenas de milhões sobrevivendo sob diferentes formas de
escravidão em todo o mundo.
“O tráfico de pessoas é uma indústria de US$ 32 bilhões,
atrás apenas do tráfico de drogas como crime organizado”, afirmou Melysa
Sperber, diretora da Aliança para Acabar com a Escravidão e o Tráfico de
Pessoas (Atest), coalizão de organizações de direitos humanos. “Entre 21
milhões e 30 milhões de pessoas estão escravizadas no mundo”, informou Sperber
em uma entrevista coletiva, no dia 27, no Capitólio, sede do Congresso
norte-americano.
A Atest se concentra no mecanismo subjacente que ampara o
trabalho forçado: a cadeia de fornecimento corporativa, isto é, todas as partes
do processo pelo qual uma empresa atende a demanda de um cliente, incluindo
fabricação, armazenamento, transporte e venda. A coalizão pede aos legisladores
que aprovem uma lei que exija das companhias que ganham mais de US$ 100 milhões
anuais a apresentação de relatórios sobre suas cadeias de fornecimento e sobre
suas práticas trabalhistas, tanto às autoridades norte-americanas como em suas
páginas na internet.
Devido à complexidade das cadeias de fornecimento mundiais,
as companhias nem sempre têm conhecimento das práticas trabalhistas coercitivas
aplicadas por seus fornecedores ou suas subsidiárias. “Descobrimos que a
vulnerabilidade ao trabalho forçado está muito generalizada em diversas
indústrias”, afirmou Quinn Kepes, gerente de programas de investigação na
Verite, organização dedicada a temas trabalhistas e a estudar as cadeias de
fornecimento. “Há um grande número de companhias com alto risco de que exista
tráfico de pessoas em suas cadeias de fornecimento”, disse à IPS.
Em geral, os empresários recorrem a intermediários
trabalhistas em todos os níveis da cadeia. Estes, submetidos a pouquíssimas
regulamentações, podem cobrar dos trabalhadores comissões exorbitantes por sua
contratação. Os intermediários também são alvo de numerosas críticas por
falsearem as qualificações dos trabalhadores que oferecem.
“A contratação de mão de obra é todo um tema se
considerarmos a construção das instalações do exército norte-americano no
Iraque e no Afeganistão”, destacou à IPS Karen Stauss, diretora de programas da
organização Free the Slaves (Libertem os Escravos), com sede em Washington. “Há
muita documentação sobre o tráfico de trabalhadores da Ásia meridional para o
Oriente Médio com a intenção de se conseguir uma construção com baixo custo”,
acrescentou.
Entretanto, mesmo dentro dos Estados Unidos há
intermediários desonestos. Em 2012, o ucraniano Omelyan Botsvynyuk foi
condenado a 20 anos de prisão por ter trazido de maneira enganosa para os
Estados Unidos vários cidadãos de seu país. Botsvynyuk e seus irmãos haviam
prometido a essas pessoas que lhes pagariam US$ 500 mensais, mas ao chegarem
aos Estados Unidos as obrigaram a limpar as instalações de importantes redes de
venda no varejo, como Target e Walmart, sem receber salário algum. Ele dizia a
esses trabalhadores não poderiam partir até pagarem suas dívidas, que chegavam
a US$ 50 mil.
Muitos empregadores ou intermediários atribuem dívidas aos
trabalhadores por usarem suas instalações ou até mesmo as ferramentas que
necessita para fazer seu trabalho. “Em alguns casos, a servidão por dívidas
ocorre com pessoas analfabetas, que não entendem como acumulam uma dívida e
seus juros. Nem mesmo são conscientes de que é uma dívida ilegal”, ressaltou
Stauss, acrescentando que o problema da extração dos chamados “minerais de
sangue” na República Democrática do Congo, depende em grande parte do trabalho
infantil.
Esses materiais são componentes fundamentais na fabricação
de bens de consumo modernos. “Vimos crianças trabalhando ali por 20 centavos ao
dia, suficiente apenas para comprar duas batatas ao voltarem para casa, após um
dia inteiro de duro trabalho manual”, detalhou Stauss, lembrando que esses
minerais são usados na fabricação de “notebooks, telefones celulares e outros
aparelhos”.
O trabalho infantil também está presente no setor
manufatureiro. Um novo estudo da universidade de Harvard descobriu 1.406 casos
específicos de exploração infantil na indústria indiana de tapetes, que exporta
a maior parte de sua produção para os Estados Unidos e outros países
industrializados. Os investigadores de Harvard estimam que 45% da mão de obra
da indústria trabalha em condições forçadas, e pelo menos um quinto dos
operários é formado por meninos e meninas.
No começo do ano o presidente Barack Obama designou janeiro
como Mês de Prevenção Nacional da Escravidão e do Tráfico de Pessoas. “Enquanto
trabalhamos para desmantelar as redes de tráfico de pessoas e ajudamos os
sobreviventes a reconstruírem suas vidas, devemos também encarar as forças
subjacentes que empurram tantos à servidão”, afirmou Obama.
Embora a lei proposta pelos ativistas não obrigue as
empresas a tomarem uma ação energética para acabar com o problema, as
organizações não governamentais acreditam que ajudará a aumentar a pressão
pública nesse sentido. Um comitê da Câmara de Representantes analisa um projeto
de lei que exige maior transparência dos intermediários que trazem
trabalhadores estrangeiros para solo norte-americano.
Essa proposta “combateria o tráfico de pessoas, o trabalho
forçado e a exploração, exigindo que os trabalhadores que chegam aos Estados
Unidos recebam informação exata sobre seu emprego, seu visto e as condições de
trabalho”, pontuou Shandra Woworuntu, ativista contra o tráfico humano. “O
projeto também assegura que não seja cobrada nenhuma comissão dos trabalhadores
e exige que a agência de contratação de pessoal esteja registrada no
Departamento do Trabalho”, enfatizou.
Fonte: Envolverde/IPS
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