Perfil de casa noturna em rede
social mostra uma das mulheres (Foto: Reprodução/TV Globo)
O grupo criminoso acusado de
fazer parte da rede de uma rede internacional de tráfico de seres humanos e
favorecimento à prostituição desmontado pela Polícia Federal nesta semana agia
desde 2010 e levou para a Europa mais de 150 mulheres nesse período, segundo as
investigação.
Fantástico seguiu operação que
prendeu 15 no Brasil, Itália e Eslovênia. Vítimas tinham documentos apreendidos
quando chegavam ao destino.
O Fantástico acompanhou a
operação que prendeu 15 pessoas em Fortaleza, Itália e Eslovênia na
quarta-feira (15) e teve acesso à parte da investigação que mostra como
funcionava o esquema. Os mandados de prisão foram expedidos pela 32ª Vara da
Justiça Federal no Ceará. Na Operação Marguerita, a PF teve a parceria das
polícias da Itália, da Eslovênia e também da Interpol.
Se condenados, os envolvidos com
a quadrilha podem pegar 25 anos pelos crimes de tráfico internacional de
pessoas, associação criminosa e lavagem de dinheiro.
Prisões
A ação começou ainda de
madrugada. Em um condomínio da Avenida Beira-Mar, em Fortaleza, a Polícia
Federal prendeu os eslovenos Vito Camerník e Tíne Mótoh, suspeitos de fazer
parte da rede que explorava brasileiras na Itália e na Eslovênia. Três
italianos – Marco Paolo Villa, Flávio Frúgis e Pasquale Ferrante – também foram
presos.
Brasileiros que trabalhavam para
a quadrilha também foram presos na Itália e na Eslovênia. Com a ajuda da Interpol e dos adidos da Polícia
Federal na Embaixada em Roma, a polícia italiana prendeu três brasileiras
acusadas de fazer parte da quadrilha: Carla Sueli Silva Freitas, Dayana Paula
Ribeiro da Silva - conhecida como Paloma, e Emanuella Andrade Bernardo. Carla,
Dayana e Emanuella ainda não foram extraditadas ao Brasil.
Ilusão financeira
Em um telefonema gravado com
autorização da Justiça, Emanuella e Paloma conversam sobre a dúvida, de uma
outra brasileira, em relação ao faturamento das prostitutas da quadrilha. “Não é possível que ela não ganhe 250 euros
em dois dias. Não existe isso. Eu ganhei quase mil euros na primeira noite; por
que ela não vai ganhar? Ela é bonita como eu”, diz Emanuella na ligação.
Duzentos e cinquenta euros equivalem a cerca de R$ 820.
Cada programa custava 200 euros
(cerca de R$ 620) e a quadrilha ficava com metade desse dinheiro. Explorando 20
brasileiras, eles podiam ganhar 10 mil euros por dia (cerca de R$ 65 mil).
Para a polícia, esse dinheiro é,
na verdade, uma ilusão. “O canto da sereia é que muitas já estavam se
prostituindo aqui, então decidiam se prostituir lá porque iam ganhar em euro.
Chega lá a realidade é diferente, porque ela tem que cumprir com o que eles
determinam, de se submeter a diversas relações sexuais mesmo doente ou cansada.
Todos os dias”, explica a delegada da PF Juliana Pacheco.
Hotel onde as mulheres se
prostituiam na Eslovênia (Foto: Reprodução/TV Globo)
Esquema milionário
A investigação descobriu ainda
remessas de dinheiro movimentado pela quadrilha entre a Eslovênia, a Itália e o
Brasil. Em um único dia, por exemplo, a quadrilha recebeu em uma conta bancária
em Fortaleza R$ 1 milhão.
O esquema utilizava várias
agências de turismo. Uma delas, do italiano Marco Paolo Villa, um dos presos na
operação. Segundo a polícia, a agência financiava as passagens das brasileiras
que, depois, tinham de reembolsar o valor - se prostituindo.
“Ela às vezes vai consciente de
que vai ser explorada sexualmente, mas não de vai ter a liberdade cerceada.
Porque quando chega no local de destino os documentos são apreendidos, e ela já
chega com uma dívida enorme, de tudo que foi contraído aqui”, explica
Alessandra Xavier Nunes, que integra o Ministério da Justiça.
As brasileiras voavam em aviões
de empresas aéreas italiana que fazem voos fretados entre Fortaleza e Milão, na
Itália. De lá, viajavam 400 quilômetros de trem até Gorítza, cidade italiana
que fica na fronteira da Itália com a Eslovênia. Era na cidade eslovena de Nova
Gorítza que elas se prostituíam.
As brasileiras viviam na cidade
italiana e usavam um hotel em Nova Gorítza, na Eslovênia, para se prostituir. O
principal ponto era a boate eslovena 'Marguerita', que deu nome à operação da
Polícia Federal. Na internet, a boate é
apresentada como "um ótimo lugar pra relaxar e se divertir. A atmosfera
prazerosa é complementada por banho turco, hidromassagem e uma surpresa
quente". O site do estabelecimento diz que o horário de funcionamento é de
14h até 2h ou 4h, dependendo do dia.
A Polícia Federal diz que, na
verdade, as brasileiras trabalhavam em dois turnos e também em uma segunda
boate, a Faraon na mesma cidade eslovena. “Elas tinham que fazer no mínimo seis
relações sexuais por dia. No horário lá de 7 da noite às 3 da manhã. Terminava
lá na boate Marguerita, elas iam para a
outra boate, Faraon, e lá também teriam que manter outras relações sexuais”,
afirma a delegada. A Polícia não
divulgou a identidade dos donos das duas boates.
Foto mostra interior de boate
Marguerita, que deu origem ao nome da operação (Foto: Reprodução/TV Globo)
Imigração
De acordo com a polícia, o
primeiro problema das brasileiras era entrar na Itália. Em um telefonema,
Emanuella e Paloma, duas participantes da quadrilha falam sobre outra
brasileira. A mulher em questão tem pouco dinheiro em mãos e no controle da
imigração, para entrar na Itália, é
difícil convencer as autoridades de que está no país para fazer turismo. “Ela
tá chorando no aeroporto. Ele deu 50 euro, fia. Com 50 euro ela não entra na
Itália. Tá dando tudo errado na viagem”, comenta uma delas.
Na mesma conversa, elas mencionam
um documento chamado carta-convite. Ele é preenchido por uma pessoa que mora
legalmente na Itália quando ela convida um turista estrangeiro para visitar o
país. “E a carta de convite que tu deu a ela, da onde é?”, pergunta uma delas.
“Eu não dei, não. Ela não me pediu, não, a carta-convite”, responde a
outra. A pessoa que convida tem de
declarar ter 3,9 mil euros – ou mais de R$ 12 mil - disponíveis para o visitante, se ele precisar
de dinheiro.
Segundo as autoridades, o crime
de tráfico para exploração sexual é pouco notificado no Brasil. Os dados mais
recentes são de 2015, com 122 casos de tráfico internacional de pessoas.
“Porque ela fica com vergonha, porque ela não quer dizer que é prostituta. Isso
dificulta a investigação”, revela a delegada Juliana Pacheco.
Outro lado
Um advogado que se apresentou em
Fortaleza como amigo das brasileiras presas disse aos repórter Eduardo Faustini
que elas não se manifestariam sobre o assunto.
Todos os estrangeiros mencionados
nessa reportagem foram contatados. O advogado do italiano Flávio Frúgis negas
as acusações e diz que ele é apenas funcionários de uma empresa que vende
passagens aéreas em Fortaleza.
Também em nota, o advogado de
Tíne Mótoh diz que toas as mulheres que foram para a Eslovênia foram por
vontade própria, sabendo que iriam se prostituir e que Tíne não facilitou e nem
colaborou em nada para que eventuais investigações sejam dirigidas contra ele.
Já o advogado de Marco Paolo Villa não se manifestou.
Fonte: G1 Globo
Nenhum comentário:
Postar um comentário