A questão da semana é o caso da internauta que não sente
mais nenhuma vontade de fazer sexo com o marido, mas se sacrifica em troca de
dinheiro. A prostituição não se limita às esquinas e tem uma longa história.
Na Europa, no século 15, era vista como atividade repulsiva,
mas tolerada para evitar algo pior. Acreditava-se que os jovens, usando os
serviços das prostitutas, ficavam desestimulados de praticar o estupro e
afastados da homossexualidade. As prostitutas eram cada vez mais segregadas,
além de obrigadas a usar roupas especiais, como uma capa curta e um lenço
amarelo amarrado em torno do pescoço. Em Avignon, França, eram até proibidas
por lei de tocar em frutas e pão no mercado.
Hoje a discriminação é mais sutil, mas prevalece a ideia de
que a prostituta é uma pobre coitada, que para sobreviver é obrigada a suportar
mais sacrifícios do que qualquer outra mulher. Entretanto, essa visão me parece
equivocada. Algumas das meninas de programa que entrevistei, quando escrevia “A
cama na varanda”, declararam que exercem essa atividade por prazer.
Uma delas, universitária de 23 anos, afirma ter feito essa
opção porque gosta de conhecer pessoas e também para manter sua vida sexual em
dia. Diz que não se sente usada, que escolhe sempre os clientes, na maioria
homens casados. Até pode ser. Mas seria ingenuidade acreditar que esses
sentimentos predominam entre elas; é fácil supor que a maioria não se relaciona
de forma tão positiva com a profissão.
Contudo, apesar de todas as dificuldades e frustrações que
uma prostituta pode experimentar, tudo indica que na vida de muitas mulheres
casadas as coisas não são mais fáceis. Uma pesquisa da Organização Mundial de
Saúde, nos anos 90, concluiu que os sintomas de depressão, mudanças de humor e
ansiedade são mais frequentes entre as mulheres do que entre os homens,
principalmente se estão casadas.
“O casamento tem um efeito protetor entre os homens, mas não
entre as mulheres”, afirma a OMS. São muitas as que, apesar de toda a
insatisfação e da falta de desejo que sentem pelos maridos, se esforçam para
manter o casamento. E nesses casos seus objetivos se aproximam daqueles
inerentes à prostituição, embora isso possa ocorrer por total falta de opção,
em ambas as hipóteses.
No dicionário a definição de prostituta é: “mulher que
pratica o ato sexual por dinheiro”. O número das mulheres que se veem obrigadas
a fazer sexo com o marido sem nenhuma vontade, em troca do próprio sustento, é
inacreditável. O pior é que nem podem escolher o parceiro. O filósofo inglês
Bertrand Russell já dizia, há algumas décadas, que “o casamento é para as
mulheres a forma mais comum de se manterem, e a quantidade de relações sexuais
indesejadas que elas têm que suportar é provavelmente maior no casamento do que
na prostituição”.
Mas a hipocrisia social vai mais longe. Nas culturas
patriarcais o uso do corpo da mulher em troca de vantagens é incentivado muito
antes do casamento. Quantas moças são educadas para só casar com homens que lhes
possam dar conforto e dinheiro para gastar? Quantas só aceitam fazer sexo com
um homem se antes ele pagar o jantar num restaurante caro? Quantas
universitárias, que se consideram liberadas e defendem a igualdade de direitos,
afirmam ser um absurdo dividir a conta do motel com o namorado? São muitas, mas
ninguém quer falar disso.
A prostituta é desprezada, mas não se preocupa em disfarçar
seu objetivo. Simone de Beauvoir esclarece com uma frase a diferença entre as
prostitutas e muitas mulheres casadas: “Entre as que se vendem pela
prostituição e as que se vendem pelo casamento, a única diferença consiste no
preço e na duração do contrato”.
Regina Navarro Lins é psicanalista e escritora, autora de 11
livros sobre relacionamento amoroso e sexual, entre eles o best seller “A Cama
na Varanda” e “O Livro do Amor”. Atende em consultório particular há 39 anos,
realiza palestras por todo o Brasil e é consultora e participante do programa
“Amor & Sexo”, da TV Globo. Nasceu e vive no Rio de Janeiro.
Fonte: www.reginanavarro.blogosfera.uol.com.br
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