A renúncia de Bento 16 ocorre num momento difícil para a
Igreja Católica. No Ocidente, a instituição enfrenta a estagnação no número de
católicos, bem como a queda no número de padres.
Enquanto isso, o avanço das igrejas evangélicas, sobretudo
na América Latina e na África, limita o crescimento de congregações católicas,
as quais também sofrem ameaças em regiões onde a intolerância religiosa é
comum.
Bento 16 rejeitou pedidos por um debate a respeito do
celibato de clérigos católicos e confirmou o veto à comunhão de católicos
divorciados que voltam a se casar.
Leis liberais sendo votadas em diversos países ocidentais
também desafiam a igreja. Bento 16 disse que as rígidas posições da Igreja
Católica em temas como aborto, eutanásia e homossexualidade "não são
negociáveis" - ortodoxia que alienou muitos católicos de orientação mais
liberal.
Além disso, o próximo papa terá, entre as suas tarefas, a de
reconstruir a confiança sobre uma instituição que tem sido, nos últimos anos,
alvo de centenas de denúncias de abusos sexuais perpetrados por padres contra
menores.
O próximo papa terá, enfim, de lidar com vários temas.
Confira abaixo alguns dos principais desafios que ele deve enfrentar:
Gerenciar o Vaticano
O recente vazamento de documentos do Vaticano, pelo mordomo
do papa, revelou que a Cúria - o governo central da igreja - é uma instituição
com graves problemas.
Para o analista de Vaticano Clifford Longley, a instituição
parece repleta de disputas entre "fações rivais". "E há acusações
de corrupção em altas esferas", diz ele.
"A reforma do Vaticano, que só começou nas beiradas,
ainda tem um longo caminho a percorrer. A descentralização é imperativa. Seu
sucessor tem uma tarefa enorme e pouco invejável."
Serão necessários sistemas de supervisão para garantir que
casos de corrupção sejam detectados e punidos e para dar transparência às
transações financeiras do Vaticano.
Leis igualitárias
"A questão que se sobrepõe às demais é a crescente
pressão sobre católicos por conta de leis de igualdade sendo debatidas no
Ocidente", diz o analista de catolicismo Austen Ivereigh.
Leis de casamento homossexual estão em pauta na França e no
Reino Unido; agências católicas de adoção foram fechadas no Reino Unido; nos
EUA, estão em curso batalhas legais entre instituições católicas e Estados, por
conta de igualdade sexual. Tudo isso afeta profundamente a igreja no Ocidente,
diz Ivereigh.
"Leis de igualdade, como as que permitem o casamento
entre pessoas do mesmo sexo, tornam cristãos e organizações religiosas
vulneráveis a processos judiciais e acusações de preconceito."
Para o analista, essas leis podem ter o efeito de
marginalizar católicos e a presença da igreja na vida pública.
Casos de abuso sexual
Bento 16 chegou a comentar sobre a vergonha da igreja por
conta dos "crimes inenarráveis" cometidos por sacerdotes pedófilos e
pediu desculpas às vítimas que conheceu durante suas viagens.
Mas muitos críticos opinam que o Vaticano foi (e ainda é)
muito lento, muito relutante e muito tímido na admissão e na investigação das
acusações de abusos sexuais.
O novo papa terá como tarefa dar sequência à punição dos
criminosos e garantir que as mudanças introduzidas por Bento 16 sejam
implementadas - em especial as orientações de proteção à infância, que devem
ser cumpridas pelos bispos católicos.
"O próximo papa terá que fazer mais no que diz respeito
à proteção das crianças", opina à BBC David Clohessy, diretor-executivo da
Rede de Sobreviventes de Abusados por Padres.
"Ele deve parar de pedir desculpas e, em vez disso,
rebaixar bispos que continuam a encobrir crimes horrendos. E ele deve insistir
em que sacerdotes atuem em conjunto com autoridades seculares para elaborar e
aprovar leis mais fortes contra o abuso de crianças pelo mundo."
O papel das mulheres
Bento 16 admitiu a lentidão da igreja em promover mulheres
dentro da instituição, sobretudo em cargos administrativos.
Em 2007, ele declarou que, enquanto Jesus escolheu 12 homens
como apóstolos, "entre os discípulos muitas mulheres também foram
escolhidas. Elas tiveram um papel proativo no contexto da missão de
Jesus".
Apesar disso, porém, ele rejeitou a ordenação de mulheres e
fez, no ano passado, um duro discurso criticando a "desobediência" de
reformistas.
Ainda que algumas mulheres tenham ascendido na hierarquia do
Vaticano, outras consideradas "difíceis" foram expulsas da
instituição, diz Gemma Simmonds, diretora do instituto britânico Religious
Life.
Também causou polêmica o cerco, em 2012, a um grupo de
freiras americanas que, na interpretação do Vaticano, desafiou a doutrina da
igreja em temas como homossexualismo e celibato. Para o padre jesuíta Drew
Christiansen, acadêmico visitante no Boston College, essa foi uma das falhas do
pontificado.
"O contraste entre o tratamento (dado às freiras) e
dado a padres pedófilos causa escândalo", opina.
É amplamente aceita a ideia de que é necessária uma mudança
cultural dentro do Vaticano, e espera-se que o novo papa promova mulheres em
cargos gerenciais altos na Cúria.
Tensões interreligiosas
A proteção a cristãos perseguidos ao redor do mundo, em
especial em áreas conturbadas do Oriente Médio, da Ásia e da África, deve ser
um grande tema de preocupação para o novo papa.
O atual êxodo de cristãos da Terra Santa vão dar mais
relevância à abordagem do próximo papa em suas relações com judeus e
muçulmanos.
Bento 16 foi apenas o segundo papa a entrar em um local
sagrado islâmico, quando visitou a Mesquita Azul de Istambul, em 2006, e rezou
com muçulmanos.
Essa tentativa de aproximação não foi bem vista em alguns
círculos muçulmanos, especialmente por ter ocorrido pouco tempo depois de o
papa ter citado um imperador bizantino do século 14 que chamara o profeta Maomé
de "diabólico e desumano".
O sucessor de Bento 16 terá o desafio de dialogar com o
islã, que avança na Ásia e na África, em locais onde o catolicismo tem uma
grande base de fiéis.
Bento 16 irritou os judeus ao dar andamento ao processo de
canonização do papa Pio 12, apesar de críticas de que este teria feito vista
grossa diante do Holocausto, durante a Segunda Guerra Mundial.
O atual papa também causou ira em alguns representantes da
Igreja Anglicana, por ter estimulado os insatisfeitos com o anglicanismo a se
converter ao catolicismo.
Em geral, as relações com anglicanos e judeus parecem estar
apaziguadas. Mas o novo papa terá que ter cuidado ao estender a mão ao mundo
muçulmano, sob o perigo de alienar judeus e parecer condescendente com o
extremismo islâmico.
Congregações menores
e menos padres
Há 1,2 bilhão de católicos no mundo, uma grande parcela
deles (42%) na América Latina. A Europa, coração histórico do catolicismo, é
atualmente casa de apenas um quarto dos católicos.
Entretanto, Bento 16 pareceu não se incomodar com o declínio
numérico, mirando uma igreja menor, porém mais fiel.
Para seu sucessor, será essencial consolidar essa mudança de
posição da igreja dentro da sociedade. À medida que a igreja se afasta das
instituições oficiais, ela terá que dar apoio aos seus seguidores e lideranças,
diz Austen Ivereigh.
Ao mesmo tempo, a igreja deve continuar a garantir que
tirará proveito das tecnologias modernas para espalhar sua mensagem.
A nomeação de Greg Burke, correspondente em Roma da Fox
News, para o cargo de conselheiro, em 2012, sinalizou a adoção de uma
estratégia de comunicação mais moderna no Vaticano. Além disso, o papa abriu
uma conta no Twitter.
É esperada de seu sucessor uma abordagem igualmente
entusiasmada à tecnologia.
Fonte: BBC Brasil
Um comentário:
A Igreja Católica passa por um período crítico em sua trajetória multi-secular.O novo papa precisa estar preparado para liderar com sabedoria as centenas de milhões de católicos espalhados por todo o mundo.Não se pode deixar de mencionar que o mundo de hoje não é o mesmo de um século atrás. A nossa sociedade capitalista e consumista representa características que são um desafio para aqueles que têm a Bíblia como um livro de inspiração Divina .A sociedade capitalista de nossos dias promove o individualismo e ,porque não dizer,o egoísmo .Presenciamos a manifestação do hedonismo.Há um busca desenfreada pelo prazer. As pessoas são impulsivas e imediatistas.Ninguém quer reconhecer que os sofrimentos ,as dificuldades ,as decepções ,fazem parte da vida .Não há espaço para as atitudes de renúncia e o ser mais solidário com o próximo.Infelizmente é esse o mundo em que vivemos.
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