Uma egípcia,Mona Eltahawy, aborda a "Primavera árabe" do ponto de vista da guerra
dos sexos. Em seu ensaio, Eltahawy escreve que as mulheres ainda não se beneficiaram dela e que a revolução feminina começará “quando a cólera contra os agressores nos palácios presidenciais se voltar contra os opressores em nossas ruas e lares”. Para ela, disse, a revolução só terá sucesso se for“social”, “sexual” e “moral”.
Mona Eltahawy disse abertamente que com seu ensaio “Why do
they hate us?” [Por que eles nos odeiam?], publicado no número de Maio/Junho da
Revista Foreign Policy, “queria ‘mijar’ sobre o maior número de pessoas
possível”.
A reportagem é de Hajer Naili e está publicada no sítio
espanhol Rebelión, 02-06-2012. A tradução é do Cepat.
Em um ato acadêmico sobre a revolução egípcia que aconteceu
na terça-feira passada na Universidade de Columbia, a colunista norte-americana
de origem egípcia disse que esperava que muitas pessoas se sentissem ofendidas
com sua premissa de que existe um patriarcado egípcio hostil às mulheres. O
“eles” do título alude aos varões egípcios e o “nos”, às mulheres árabes.
“Basta lê-lo para se dar conta de que estou sendo claramente
provocadora, porque utilizo uma linguagem muito agressiva. Sou escritora há 20
anos, por isso sei o que faço”, disse.
Acrescentou que o que na realidade a surpreendeu foi “a
resposta tão positiva” que teve, pois inclusive uma ativista saudita havia se
oferecido para traduzir seu artigo para o árabe para que as mulheres de seu
país tivessem a oportunidade de lê-lo.
A jornalista foi presa no dia 24 de novembro do ano passado
durante os protestos da Praça Tahrir no Cairo. Esteve presa durante 12 horas,
nas quais, segundo declarou, foi física e sexualmente agredida. Quebraram-lhe o
braço esquerdo e a mão direita. A notícia da sua prisão correu como pólvora
pela internet quando ela mesma tuitou que “estava sendo agredida durante sua
prisão no Ministério do Interior”.
Em seu ensaio, Eltahawy escreve que as mulheres ainda não se
beneficiaram da revolução e que a revolução feminina começará “quando a cólera
contra os agressores nos palácios presidenciais se voltar contra os opressores
em nossas ruas e lares”.
“Temos que eliminar o Mubarak que está em nossas cabeças”,
reiterou Eltahawy durante o ato acadêmico da Columbia em referência a Hosni
Mubarak, que abandonou o poder em fevereiro de 2011 após 18 dias de protestos.
“Devemos nos livrar do Murabak que está em nossas cabeças, em nosso quarto, e
do Mubarak em nossas ruas”.
O artigo suscitou grande afluência de comentários no Twitter
de Eltahawy, que goza de um amplo seguimento.
Seus detratores argumentam que, embora seja inegável que
exista opressão contra a mulher, sua análise é simplista e irresponsável, já
que utiliza argumentos “orientalistas” para difamar a cultura árabe e, com
isso, favorece os planos neocoloniais do “homem branco”.
Alguns blogueiros de origem árabe – homens e mulheres de
países diversos – questionaram o fato de que Eltahawy fale por eles.
Gigi Ibrahim, uma destacada blogueira e ativista da
revolução egípcia, disse que o ensaio era “vergonhoso”. Samia Errazzouki, uma
escritora norte-americana de origem marroquina, escreveu uma refutação
intitulada “Querida Mona Eltahawy, tu não nos representas”. A jornalista e
ativista Mona Kareem pediu no seu blog aos meios de comunicação ocidentais que
ressaltassem as vozes de outras mulheres para que se mostre um retrato mais
preciso do “feminismo árabe”.
Eltahawy rechaçou as críticas que a acusam de ter negado o
compromisso das mulheres árabes. “As mulheres completarão a revolução iniciada
por um homem chamado Mohamed Bouazizi na Tunísia quando se auto-imolou”,
insistiu. “Quando digo que as mulheres completarão a revolução estou
reconhecendo explicitamente seu compromisso”.
Afirmou para o público presente que uma revolução trata da
liberdade e da dignidade e que não haverá revolução autêntica se não se
abordarem os problemas de gênero. “Há hierarquias de opressão”, insistiu
Eltahawy. “Se levantarmos uma a uma as camadas da opressão, está claro que
Mubarak oprimia todo o mundo, homens e mulheres, mas por debaixo dessas
camadas, a sociedade oprime as mulheres e é aí que chegamos à autêntica
revolução”.
Quando lhe perguntaram pelo auge do islamismo no Egito e
pela importância da Irmandade Muçulmana no parlamento, Mona Eltahawy questionou
a mistura entre religião e política por considerar que seria prejudicial para
as mulheres. “Não fizemos uma revolução para que uma moça de 14 anos possa se
casar no Egito. Fizemos uma revolução pela liberdade e pela dignidade e se essa
liberdade e essa dignidade não se aplicam a mais da metade da sociedade, não é
uma revolução”, concluiu.
Para ela, disse, a revolução só terá sucesso se for
“social”, “sexual” e “moral”.
Em seu ensaio, também oferece exemplos de opressão das
mulheres em outras partes do Oriente Próximo, desde o Iêmen, onde “as meninas
de 12 anos morrem ao dar à luz sem que isso impeça a prática dos casamentos com
meninas”, até a Arábia Saudita, onde “uma sobrevivente de uma violação em grupo
foi sentenciada à prisão por entrar num carro de um homem que não era de sua
família e só se livrou dela graças ao indulto real”.
Fonte: Ihu
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