O Vaticano e as religiosas encontram-se em uma tensão com
raízes históricas, sociológicas e eclesiásticas, mas uma solução poderia ser
encontrada, disse a Irmã Elizabeth Johnson.A teóloga da Fordham University
elogiou as irmãs por seu compromisso com "um diálogo sincero e
corajoso" e exortou-as a seguir em frente.
Johnson foi homenageada na sexta-feira, 15-08-2014, com o
Prêmio de Excelência em Liderança pela Conferência de Liderança de Mulheres
Religiosas (LCWR), o maior grupo de mulheres líderes religiosas do país, que
representam cerca de 80% das 51.600 irmãs nos Estados Unidos.
Tanto Johnson quanto a LCWR foram criticadas pela Igreja, e
Johnson disse às cerca de 800 irmãs ali reunidas para a assembleia anual da
LCWR que as críticas aos seus escritos e as críticas à LCWR estão interligadas.
Johnson é muito admirada pelos membros da LCWR e ela
pediu-lhes para permanecerem firmes apesar da investigação da Congregação para
a Doutrina da Fé do Vaticano que ainda está em curso.
"Eu acho que nós duas (LCWR e a teóloga) estamos presas
em uma situação adversa que não foi fabricada por nós", disse ela.
Johnson, uma irmã da Congregação de São José de Brentwood,
Nova York, é considerada uma das arquitetas da teologia feminista. Publicou
nove livros e mais de 100 artigos em revistas acadêmicas, resenhas de livros,
capítulos de livros e artigos; sua obra foi traduzida para 13 idiomas. Ela tem
um doutorado em Teologia pela Universidade Católica dos Estados Unidos e é uma
ilustre professora de teologia na Fordham.
Johnson é ex-presidente da Catholic Theological Society e da
ecumênica American Theological Society. Foi consultora do Comitê dos Bispos dos
Estados Unidos sobre as mulheres na sociedade e na Igreja. Ela foi destaque em
um calendário da Biblioteca do Congresso chamado "Mulheres que
ousam".
Ela também é controversa. Em abril, o cardeal Gerhard
Müller, prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, ordenou que, após esta
reunião da LCWR, os palestrantes em eventos do grupo deverão ser aprovados pelo
arcebispo de Seatle, J. Peter Sartain, que lidera a agenda de reformas de cinco
anos da congregação para a LCWR. Müller citou a escolha de Johnson para o
Prêmio de Excelência em Liderança como uma das razões para o mandato,
observando que Johnson foi "criticada pelos bispos dos Estados Unidos por
causa da gravidade dos erros doutrinais em seus escritos". Sartain
participou de todos os eventos públicos durante a assembleia da LCWR, exceto da
apresentação de Johnson, pois ele já estava viajando de volta a Seatle na sexta
à noite.
A diretora de comunicações da LCWR, Ir. Annmarie Sanders, da
Congregação do Imaculado Coração de Maria, disse que a assembleia direcionou os
membros do conselho para responder ao mandato, mas ela não iria dizer qual
seria essa resposta.
"Elas disseram ao conselho para tomar os próximos
passos", disse Sanders.
A declaração sobre a ação a ser tomada é esperada em algum
momento depois da reunião do conselho de segunda-feira.
Em 2011, o comitê doutrinário da Conferência Episcopal dos
Estados Unidos disse que o livro de Johnson de 2007, Quest for the Living God,
não está de acordo com a doutrina oficial da Igreja Católica.
A escolha de Johnson como palestrante, disse Müller em abril
"será vista como uma provocação bastante direta contra a Santa Sé e contra
a avaliação doutrinal" e afasta ainda mais a LCWR dos bispos.
"A partir da declaração do cardeal Müller, parece que
nem ele nem o pessoal que o está aconselhando leram o livro ou a minha resposta
por escrito feita às preocupações levantadas, mas sim canalizam o parecer da
comissão", disse Johnson aos membros da LCWR. "Mas a avaliação do
comitê sobre "Quest" é em si teologicamente falha".
Johnson reiterou sua posição de que o livro não diz as
coisas que a comissão afirma que diz e que ela não acredita nas coisas que eles
dizem que ela escreveu.
A comissão "critica as posições que eu tomo que estão
de acordo com o Catecismo da Igreja Católica, e em vários casos, relata o
oposto do que o livro realmente diz, a fim de encontrar a falha", disse
ela. "Em minha opinião, e isso é difícil de dizer, mas eu creio que tal
descuido com a verdade não é digno do magistério de um bispo".
Johnson disse que as críticas da Congregação para a Doutrina
à LCWR são semelhantes.
"As declarações da investigação expressam mais uma
insatisfação geral vaga ou uma desconfiança sobre determinados temas, e os
pareceres são feitos de uma forma que não podem ser abordados de forma
satisfatória", disse ela. Mas "a sua vontade de ficar na mesa para buscar
a reconciliação através de uma conversação sincera e corajosa é um poderoso
testemunho".
Johnson disse que, historicamente, sempre houve tensões
entre comunidades religiosas e a hierarquia, porque as primeiras estão baseadas
em uma vida radical do Evangelho e a outra está baseada na administração, que
exige ordem.
A questão também é sociológica, disse ela.
"A Igreja não começou dessa forma, mas, como
instituição, ela evoluiu para uma estrutura patriarcal, onde a autoridade é
exercida de cima para baixo, e onde a obediência e a lealdade para com o
sistema são as maiores virtudes", disse Johnson.
Por fim, disse, as tensões são eclesiásticas, porque as
religiosas implementaram a renovação solicitada pelo Concílio Vaticano II, e a
hierarquia, não.
"Certamente, a LCWR e as irmãs que a lideram estão
longe de serem perfeitas, mas elas tem cheiro de ovelhas", disse ela, sob
fortes aplausos. "A renovação pós-Vaticano II não ocorreu na Congregação
para a Doutrina da Fé".
A LCWR disse que Johnson foi escolhida por suas distintas
realizações acadêmicas, contribuições escolásticas e por seu foco consistente
naqueles que sofrem e estão passando necessidade.
"Através de seu engajamento nas questões mais difíceis
do nosso tempo e sua atenção para as violações na amada criação de Deus",
diz a declaração da LCWR sobre o prêmio, "ela trabalha incansavelmente para
a mudança em nosso mundo, mudança que está de acordo com a visão de Jesus sobre
o reino de Deus".
A irmã franciscana Nancy Schreck, que foi a palestrante
principal deste ano, disse que o discurso de Johnson foi "fabuloso".
"Ela cita as coisas de forma tão clara, mas, ao mesmo
tempo, seu compromisso com a fé é inquestionável", disse Schreck.
A irmã Maureen Fiedler, da Congregação de Loretto, elogiou a
avaliação de Johnson sobre a situação.
"Sua análise das dificuldades entre a hierarquia e o
posicionamento das comunidades religiosas foi exata, e ela mostrou isso de
muitas formas", disse ela.
Após seu discurso, Johnson recebeu uma longa ovação de pé, e
depois, dezenas de irmãs esperaram na fila para falar com ela, enquanto dezenas
de outras esperaram fora da sala para fazer pedidos das gravações de áudio do
discurso.
Johnson encerrou a conversa compartilhando uma foto da época
do apartheid de um muro na África do Sul, onde alguém tinha escrito "Hang
Mandela!" [Enforquem Mandela!]. Alguém veio e desenhou um "on"
para tornar a mensagem "Hang on Mandela!" [Aguenta firme, Mandela],
mudando completamente o significado do que tinha sido uma declaração contra o
herói antiapartheid Nelson Mandela, que ainda estava na prisão na época.
Essa criatividade, segundo ela, subverteu um insulto em uma
inspiração, uma maldição em uma bênção, a mesma criatividade pode ser usada
para mudar a situação atual.
E assim, aos membros da LCWR, ela insistiu, "On!"
[Adiante!]
Fonte: Ihu
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