Em uma decisão inédita, os ministros da 3.ª Turma do STJ fixaram em
R$ 200 mil a indenização que o pai deve pagar à filha pelos danos morais
decorrentes do abandono afetivo. A decisão cria jurisprudência, mas ela não é
vinculante - cabe ao juiz decidir em casos semelhantes.
"O cuidado é fundamental para a formação do menor e do
adolescente", afirmou a ministra relatora do recurso, Nancy Andrighi.
"Não se discute mais a mensuração do intangível - o amor -, mas, sim, a
verificação do cumprimento, descumprimento ou parcial cumprimento de uma
obrigação legal: cuidar."
A relatora disse que entre pais e filhos, além dos vínculos
afetivos, existem os legais. Ela afirmou que entre os deveres inerentes ao
poder familiar estão o convívio, o cuidado, a criação, a educação, a
transmissão de atenção e o acompanhamento do desenvolvimento sociopsicológico
dos filhos. De acordo com Nancy, essas obrigações existem tanto em relação aos
filhos biológicos quanto aos adotivos.
A ministra lembrou que a proteção ao menor e ao adolescente
está na Constituição. "Aqui não se fala ou se discute o amar e, sim, a
imposição biológica e legal de cuidar, que é dever jurídico, corolário da
liberdade das pessoas de gerarem e adotarem filhos", disse. "Em suma,
amar é faculdade, cuidar é dever."
Dor
A ministra afirmou que a filha conseguiu constituir família
e ter uma vida profissional. "Entretanto, mesmo assim, não se pode negar
que tenha havido sofrimento, mágoa e tristeza, e esses sentimentos ainda
persistam, por ser considerada filha de segunda classe", disse Nancy.
"Esse sentimento íntimo que a recorrida levará, ad
perpetuam, é perfeitamente apreensível e exsurge, inexoravelmente, das omissões
do recorrente no exercício de seu dever de cuidado em relação à recorrida e
também de suas ações, que privilegiaram parte de sua prole em detrimento dela",
afirmou.
Procurado pelo Estado, o advogado de acusação, João Lyra
Netto, não quis comentar a decisão porque não teve acesso ao acórdão. "É
uma discussão familiar, pessoal, quero conversar com ela antes de me
manifestar." Ainda cabe recurso.
Antes do STJ, o Tribunal de Justiça (TJ) de São Paulo já
tinha reconhecido a omissão do pai e fixado a indenização num valor bem maior,
em R$ 415 mil. De acordo com a decisão do TJ, o pai era "abastado e
próspero".
No entanto, os ministros do STJ concluíram que, apesar das
agressões ao dever do pai de cuidar da filha, o valor era muito alto. Por esse
motivo, eles reduziram a indenização para R$ 200 mil. Antes do TJ paulista, a
Justiça de 1ª. instância tinha rejeitado o pedido da filha.
De acordo com aquela decisão, o distanciamento teria sido
motivado primordialmente pelo comportamento agressivo da mãe em relação ao pai.
Fonte: O Estado de São Paulo
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