Na noite do último sábado, um
barco com cerca de 700 imigrantes, virou ao sul da ilha italiana de Lampedusa,
no Mar Mediterrâneo. Ainda na última semana, na quarta-feira, 400 imigrantes se
afogaram num incidente semelhante, desta vez perto da costa da Líbia. O primeiro ministro da Itália, Matteo
Renzi, fez um apelo à União Europeia por novas ações para lidar com a questão
do tráfico de pessoas na região.
Essas travessias, em sua maioria,
acontecem em condições precárias, comandadas por traficantes de pessoas, que
colocam os imigrantes em embarcações pequenas e apertadas.
Diante da situação, o premiê
italiano pediu uma reunião de emergência dos líderes europeus para debater
novas ações para resolver a questão e pediu solidariedade das outras nações
para combater o tráfico de pessoas, "uma praga em nosso continente".
"É inimaginável que diante
de uma tragédia como essa, não haja o sentimento de solidariedade que a Europa
já demonstrou em outras situações", disse.
"Nós pedimos para não sermos
abandonados sozinhos nessa questão. Não tanto com relação à emergência no mar,
mas principalmente com relação a combater o tráfico de seres humanos."
Alguns políticos italianos
chegaram a pedir um bloqueio naval na região, mas o primeiro ministro disse que
isso só ajudaria os contrabandistas, pois não haveria mais navios para resgatar
os imigrantes.
'Escravidão do século 21'
Matteo Renzi destacou a Líbia
como o principal problema, porque é lá o ponto de partida de cerca de 90% dos
imigrantes que chegam à Itália pelo mar.
O premiê pediu que a União
Europeia tomasse novas atitudes para combater o problema que é a
"escravidão do século 21", segundo ele.
Ainda de acordo com Renzi, a
questão não é ter mais barcos de resgate na região, mas sim impedir novos
barcos com imigrantes de saírem da costa.
Só neste ano, as estimativas
apontam que mais de 1.500 imigrantes teriam morrido na travessia.
Em meio à crise política na
Líbia, contrabandistas de pessoas se aproveitam para usar o país como um ponto
de partida para os barcos que transportam imigrantes que fogem da violência ou
das dificuldades econômicas na África e no Oriente Médio.
Reação
"O que está acontecendo
agora tem proporções épicas. Se a Europa e a comunidade internacional continuar
a fazer vista grossa…seremos todos julgados da mesma maneira que a história
julgou a Europa quando ela fez vista grossa ao genocídio deste e do século
passado", disse o primeiro ministro de Malta, Joseph Muscat, disse à BBC.
Outros líderes europeus também se
manifestaram sobre a tragédia no Mediterrâneo. O primeiro ministro da Espanha,
Mariano Rajoy, reforçou o apelo do premiê italiano para que atitudes sejam
tomadas.
"É a enésima vez que vemos
outra tragédia acontecer no Mediterrâneo…palavras não vão mais adiantar
nada."
O presidente do Parlamento
Europeu, Martin Schulz, disse que "a Europa pode fazer mais e precisa
fazer mais."
"É uma vergonha e uma
confissão de fracasso a forma como muitos países fogem da
responsabilidade", completou.
O Secretário de Relações
Exteriores do Reino Unido, Philip Hammond, afimou que "o mundo está
horrorizado com a terrível perda de vidas" e que a grande prioridade agora
seria combater as "gangues criminosas que estão lucrando com o tráfico dessas
pessoas."
A União Europeia tem sido
criticada por sua falta de ação desde que encerrou a operação de resgate Mare
Nostrum - sistema de patrulhamento designado especificamente para o socorro a
embarcações ilegais cruzando o Mediterrâneo - no ano passado. Alguns membros da
União Europeia disseram que eles não poderiam pagar por ela e se mostraram
preocupados de que a própria operação poderia estar incentivando mais
imigrantes a fazerem a travessia.
Agora, a União Europeia organiza
um controle de fronteiras mais limitado, na operação chamada Triton, com o
patrulhamento e o socorro da região sendo feitos em menor escala.
Comandante do Alto Comissariado
das Nações Unidas para os Refugiados (UNHCR, na sigla em inglês), Antonio
Guterres, disse: "O desastre confirma o quão urgente é restaurar uma
operação forte de resgate no Mar Mediterrâneo."
O presidente da União Europeia,
Donald Tusk, já cogita a possibilidade de chamar uma reunião de emergência com
membros do grupo para discutir a questão. Ele se manifestou sobre o assunto
pelo Twitter dizendo que falou com o primeiro ministro de malta, Joseph Muscat,
e "irá continuar as conversas com líderes da União Europeia sobre como
aliviar a situação".
Resgate
Até o fim deste domingo, 24
corpos haviam sido encontrados e 28 pessoas haviam sido resgatadas.
Segundo a UNHCR, a tragédia pode
ficar marcada na história como a maior perda de vidas já registrada em uma
travessia para a Europa.
De acordo com relatos, os
imigrantes caíram no mar quando correram para um dos lados da embarcação ao
avistarem um navio na região – todos foram para o mesmo lado para chamar a
atenção do navio, mas o peso concentrado acabou virando o barco.
Um dos sobreviventes, que está no
hospital Cannizzaro na Catânia, disse que havia cerca de 950 pessoas na
embarcação, mas essa informação ainda não foi confirmada. Segundo ele, muitos
estavam trancados no convés e não tinham permissão para sair.
De acordo com a UNHCR, barcos de
imigrantes teriam levado 13.500 pessoas em águas italianas somente na última
semana. No ano passado, um número recorde de 170 mil imigrantes fez a travessia
para chegar à Itália. Milhares morreram na viagem.
Presidentes, primeiros ministros
e até o Papa já se manifestaram sobre a tragédia no Mediterrâneo e descreveram
o quão horrorizados ficaram com as incontáveis mortes. Eles reforçaram o
discurso de que algo precisaria ser feito imediatamente para acabar com isso.
Mas será que os discursos
emocionantes e poderosos irão levar a uma nova abordagem da União Europeia para
combater a crise dos imigrantes, incluindo o envio de mais navios para as
buscas e resgates?
As divergências entre os 28
membros da União Europeia ficaram claras no ano passado, quando a Itália
encerrou suas operações de busca e resgate depois de terem conseguido retirar
mais de 100 mil pessoas do mar.
A União Europeia substituiu essa
operação por outra bem menos controlada por sua agência de gestão de
fronteiras, Frontex, que tem um terço do orçamento e uma fracção da mão-de-obra
utilizada pela marinha italiana.
Desastres recentes com imigrantes no Mediterrâneo
Outubro de 2013: Mais de 360
pessoas, a maioria de eritreus e somálios, morreram quando o barco afundou
próximo à Lampedusa.
Setembro de 2014: Pelo menos 300
imigrantes naufragaram em Malta, quando traficantes de pessoas empurraram o
barco depois que as pessoas à bordo se recusaram a mudar para uma embarcação
menor. Sobreviventes disseram que era um "assassinato em massa".
Fevereiro de 2015: Pelo menos 300
imigrantes teriam se afogado quando quatro botes entraram em apuros depois de
deixarem a Costa da Líbia com condições climáticas muito ruins.
Abril de 2015: Cerca de 400
imigrantes se afogaram quando o barco deles virou na costa da Líbia
Abril de 2015: Cerca de 700
imigrantes teriam se afogado após o barco ter virado próximo à Lampedusa.
Fonte: BBC Brasil
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