Anitta: aos 20 anos, mudança radical por meio de cirurgias.
Brasil ocupa segundo lugar no ranking de operações plásticas, atrás apenas dos
EUA
A indústria da beleza e da moda parece tentar se redimir das
acusações de influenciar meninas e mulheres a ficarem insatisfeitas com seu
corpo. Exemplos que parecem inovadores discutem a imagem feminina na
publicidade, mas estão sob suspeita: seria só uma tendência de marketing
passageira ou uma mudança real? Para entrar nesta discussão, projeto
fotográfico mineiro mostra o corpo feminino desmistificado, confira
Anitta: aos 20 anos, mudança radical por meio de cirurgias.
Brasil ocupa segundo lugar no ranking de operações plásticas, atrás apenas dos
EUA
Rede de lojas norte-americana propõe fuga dos padrões
estéticos em suas vitrines e campanhas publicitárias. Na Ásia, vídeo de
lingerie ressalta beleza da mulher desvinculada de seus atributos físicos. No
Brasil, comercial de pomada abre caminho para retratar novos arranjos
familiares. Será que a imagem feminina na publicidade está realmente mudando?
No encerramento do chamado "mês da mulher", ouvimos comunicólogos no
Brasil e na França para saber se há ventos promissores de mudança ou se temos
apenas 'brisas' de empresas que desejam atender a demandas de grandes grupos
sociais.
A quantidade de exemplos que tentam fugir ao padrão - tanto
na propaganda quanto em filmes, fotografias e projetos artísticos - encontrados
na pesquisa para produção desta reportagem chega a ser surpreendente. Vamos
começar com um dos vídeos da campanha mais recente da empresa Wacoal, cujo
slogan atual é: 'Toda mulher foi criada para ser linda. Linda por dentro'. O
vídeo tem legendas em português:
A empresa tem origem japonesa, mas controla filiais em
vários países. A unidade tailandesa produziu três curtas em que tenta
explicitar o significado de beleza sem se apoiar em padrões estéticos. E ainda
aponta o machismo em sociedades tradicionais (neste caso, o preconceito contra
uma mãe solteira), sem desconectar-se da marca, que vende roupas íntimas. Logo,
há um jogo de palavras com o conceito de 'beleza interior'.
Em contraste com a ideia expressa no vídeo, o Brasil
consagrou-se nos últimos anos como o campeão das cirurgias estéticas, atrás
apenas dos Estados Unidos. Entre 2009 e 2012, o número de cirurgias no país
cresceu 120%. E o número de intervenções em adolescentes entre 14 e 18 anos
aumentou 141% de 2008 a 20012, segundo dados da Sociedade Brasileira de
Cirurgia Plástica (SBCP).
Alguns especialistas atribuem esse quadro à influência dos
padrões inalcançáveis propagados pela publicidade e também pela indústria do
entretenimento. Um dos exemplos apontados por essa corrente de pensamento é a
cantora Anitta, de 20 anos, que nesta semana foi notícia pela série de
plásticas a que se submeteu no rosto e no corpo. Há dois anos, ela já havia
passado pelas primeiras intervenções cirúrgicas e, apesar do sucesso na
carreira musical, não estava satisfeita. “Agora não tenho defeitos”, disse em
entrevista ao programa Fantástico.
A pesquisa ‘Representações das mulheres nas propagandas na
TV’, realizada pelo Data Popular e Instituto Patrícia Galvão, em maio de 2013,
apontou que 56% dos entrevistados, homens e mulheres, consideram que as
propagandas na TV não mostram as brasileiras reais. A invisibilidade da mulher
negra também foi destacada - 80% dos entrevistados consideram que as
propagandas televisivas mostram mais mulheres brancas, enquanto 51% gostariam
de ver mais negras nos comerciais. A maioria também gostaria de ver mais
mulheres com cabelos crespos/cacheados na publicidade, mas 83% consideram que
veem mais modelos com cabelos lisos.
Criticado, portanto, por pesquisas, ativistas e pessoas
comuns, o mercado da moda e da beleza tenta se redimir. Este filme, feito pela
Dove (marca de higiene pessoal da Unilever que, mesmo sob acusações de
hipocrisia, se esforça nas ‘campanhas pela real beleza’), aponta como a
indústria doutrina as crianças, desde bem pequenas. Com imagens muito fortes, o
vídeo termina com a frase: “fale com sua filha antes que a indústria da beleza
o faça”. As legendas não são necessárias, confira:
Confira agora um vídeo que resume o ano de 2013 considerando
a forma como as mulheres são exploradas comercialmente na grande mídia. As
imagens indicam que a visão sexista e excludente em relação à beleza ainda está
longe de ser superada. Embora o filme mostre também os motivos de comemoração -
a Revista Time trouxe, na capa, Malala Yousafzai, a adolescente paquistanesa,
hoje com 16 anos, baleada na cabeça em 2012 por lutar pelo direito feminino à
educação em seu país – a peça destaca os estereótipos negativos:
Sobre a pergunta inicial desta reportagem – ou seja, se as
iniciativas de mudança da imagem da mulher são estratégias passageiras ou
vieram para ficar - Carlos Camargo de Mendonça, professor do Curso de
Comunicação da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e pós-Doutor em
Comunicação pela Universidad Complutense de Madrid, explica que a publicidade
é, na verdade, conservadora. Não é ela que promove a revolução. “Quem coloca
dinheiro na campanha quer retorno. Então a aposta é, geralmente, nas tendências
e comportamentos mais consolidados. Se algo novo chega à propaganda, ou mesmo a
uma novela, por exemplo, é porque já percorreu um longo caminho na sociedade. Quando
uma campanha publicitária ou estratégia de marketing surge com algo muito novo,
é porque existe um ‘caldo cultural’ que permite isso”, resume, acrescentando
que a vanguarda em publicidade costuma limitar-se a questões estéticas e de
linguagem.
No Brasil, pelo menos, um dos fatores que pode estar
contribuindo para mudanças nos meios de comunicação é a emergência de novos
mercados consumidores. Grupos excluídos de grande parte do consumo agora têm
poder de compra e exigem uma interação maior com a marca, com as lojas. “Se
anteriormente muitas campanhas tratavam o cliente como único, homogêneo, hoje a
lógica deve contemplar múltiplos perfis. E aqui entram também as questões de
gênero, que remetem a um grupo – o das mulheres – mas significam a inclusão de
vários outros”, detalha Mendonça.
Por mais que a imagem de uma mulher forte apareça, ainda
assim a ideia de ‘ter um companheiro’ frequentemente surge como uma conquista
feminina importante. “Em uma sociedade repleta de casos de violência contra a
mulher, o padrão na publicidade ainda é o de fragilizar o corpo feminino, usar
esse corpo excessivamente e impor limites estéticos”, critica o professor. “Só
que, se você parar para pensar, ninguém é feio. Padrão, cada um cria o seu”,
completa.
Campanha de cervejaria com a socialite norte-americana Paris
Hilton foi banida das telas brasileiras após denúncia contra a objetificação da
mulher
O professor conta que o corpo masculino só começou a ganhar
algum destaque na propaganda nos anos 70, com imagens de homens mais jovens e
‘belos’; e não apenas no papel de pais. Parte das feministas, na época, encarou
a mudança como “finalmente o corpo do homem também está sendo explorado
comercialmente”. No entanto, a exploração da imagem feminina cresceu ainda
mais.
A forma como a mulher é representada está intimamente ligada
a uma sociedade que também não aceita a igualdade em outros campos. Daí a
dificuldade da publicidade brasileira em se comunicar com o público
homossexual, por exemplo. Os exemplos das empresas que tentam avançar nesse
sentido se contam nos dedos. A pomada Nebacetin fez, em 2008, uma campanha com
o conceito – as famílias mudam, o cuidado não – e incluiu um casal homossexual
no comercial de televisão.
A Unimed de Santa Catarina também incluiu um casal gay em
seus anúncios de planos familiares. Em São Paulo, a construtora Tecnisa fez
peças publicitárias específicas, porque constatou uma fatia de 30% em seus
mercado potencial formada por homossexuais, que não só compravam os
apartamentos, mas investiam até 80% do valor total do imóvel em decoração e
valorização. “Ainda na época do governo FHC, houve uma campanha emblemática
pelo uso da camisinha que incluía os homossexuais jovens. O comercial recebeu
duas denúncias junto ao Conselho Nacional de Autorregulamentação
Publicitária (Conar) e foi o que bastou
para a campanha ser retirada do ar. A campanha de prevenção teve sua dimensão
social reduzida por causa disso”, lembra Mendonça.
Se a sociedade, seja francesa ou brasileira, ainda prefere o conservadorismo, há que se lembrar que existe um duplo sentido – a mídia e a publicidade impõem padrões, mas também são obrigadas a mudar esses padrões quando a sociedade demanda. “Mas o objetivo final continua sendo o consumo,o objeto do desejo, ou seja, aquilo que deve ser uma projeção, um ideal, algo inatingível, pois logo que se tem um produto, já se pretende ter outra coisa. E assim por diante. A publicidade está imersa nessa lógica do consumo. Acho difícil que ela se conforme com coisas "reais", construtivas, emancipadoras, pois vai sempre tentar vender o ideal e buscar uma relação de ‘dependência’ dos consumidores”, avalia.
Enquanto isso, a luta por mudanças não segue apenas para que as mulheres sejam livres e não tenham que seguir padrões estéticos dominantes – que fazem até mal à saúde e trazem sofrimento emocional -, mas principalmente para que as mulheres tenham mais espaços no mundo do trabalho e do poder, pertencendo a diversos padrões físicos e origens étnicas.
No filme abaixo, 'Maioria Oprimida', a francesa Eleonore Pourriat propõe um retrato de como seria uma sociedade em que os papéis mais simples do cotidiano são invertidos – os homens sofrem, nas imagens, os mesmos constrangimentos diários que uma mulher. “Eu queria ser tão realista quanto assustadora”, disse a diretora. A versão original teve mais de oito milhões de visualizações. Veja, com legendas em português.
Fonte: www.sites.uai.com.br
Nenhum comentário:
Postar um comentário