No Brasil, o Dia das mães é aquele momento constrangedor.
Empresas, que sequer concedem licença-maternidade de 6 meses para sua
funcionária que acabou de ter um filho, passam a elogiar sistematicamente certo
tipo de maternidade que pouco têm a ver com a vida real.
Texto de Amanda Vieira.
Os discursos publicitários costumam endeusar a mãe e tendem
a reforçar o estereótipo de que a mulher só é completa com a maternidade. Nos
textos jornalísticos, abundam reportagens que exaltam as qualidades de uma
suposta super-mulher que consegue aliar carreira, cuidados com filhos e ainda
ficar lindona pro marido. Ou seja: não existe muito espaço para a expressão das
pessoas que estão em desacordo com essas idéias pré-estabelecidas.
As mães que conheço são moldadas no cotidiano. São feitas no
aqui e agora, cada mãe segundo suas circunstâncias, suas experiências, seus
desejos. Conheço mães cujos filhos moram com o pai em outro continente; que
adotaram crianças; que têm deficiências; que têm filhos com deficiência;
solteiras; homossexuais, bissexuais, transexuais; que sofrem com o preconceito
racial; que vivem nas periferias urbanas; que vivem na área rural; que vivem em
comunidades indígenas; que entregam seu filho para adoção; mães clandestinas,
que moram ilegalmente num país que não é o seu — e até as que morrem antes dos
filhos crescerem.
A lista de possibilidades de ser mãe é interminável — talvez
não tenha fim. Mas as políticas públicas deveriam ser feitas sempre buscando
dar suporte para as mais variadas formas de ser mãe. A começar pela saúde: é
inconcebível o alto número de pessoas que morrem por complicações no parto. E a
gente sabe que esse número varia com a cor da pele da pessoa e com a etnia, o
que também é inaceitável. E a gente sabe que esse número só é alto porque a
sociedade teima em obrigar mulheres a serem mães mesmo que elas não tenham esse
desejo.
As políticas públicas deveriam reconhecer, cada vez mais, as
necessidades específicas dessas diferentes mães para que elas não tenham que se
transformar em super-heroínas da noite para o dia ao se descobrirem mães. Neste
sentido, é preciso que o Estado ofereça creche pública, atendimento
especializado para pessoas com deficiências, escolas integrais, atividades
comunitárias para as crianças, licença-parental para cuidadores (e não só para
a mãe, mas para a pessoa com que ela se relaciona, mantém vínculo, compartilha
a vida).
Os empregadores (empresários) deveriam compreender que a
redução de jornada de trabalho é o caminho mais desejável para o bem estar de
todos. Não é a primeira vez que trabalhadores reivindicam redução de jornada e
não será a última vez. Os benefícios trazidos pelas novas tecnologias também
devem servir para a redução da jornada do trabalhador (e não só para ampliação
de lucros e concentração de riquezas). Muitas categorias profissionais já
adotaram a jornada de seis horas corridas — está na hora de ampliar essa ideia
e beneficiar mais pessoas.
Devemos dialogar com as mães indígenas, com as mães
estrangeiras. Que a origem ou o costume da mãe não seja um impeditivo para se
conseguir direitos básicos das mães. Também precisamos valorizar o trabalho das
pessoas que lidam com crianças. Valorizar o trabalho desenvolvido por mulheres.
Que elas não sejam obrigadas a mudar da profissão que gostam apenas porque o
“mercado” não a remunera decentemente.
As mães que eu conheço — regra geral — necessitam de tempo
para “maternar” – mas não é só isso: é a sociedade como um todo que também
precisa desse tempo para “maternar” junto a essas mães. E o Dia das Mães
deveria ser uma data para que cada cidadão pudesse avaliar o seu relacionamento
com as mães e crianças à sua volta, saber como andam as crianças dos outros e
qual é a sua contribuição a elas. Você emprega mães na sua empresa? Você sabe
quanto recebe um professor da educação infantil? Está mais do que na hora de
saber e colaborar com as mães — e não julgá-las.
—–
Amanda Vieira é mãe da Sofia. Gosta de futebol, de cinema,
de poesia, de política e de música, mas principalmente de deitar na rede e
esquecer isso tudo. Seu blog pessoal é o Empatia.
Fonte: Blogueiras Feministas
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