Compartilhar fotos de estrias no Instagram e exibir a
barriga sem medo no Facebook. A diversidade dos corpos femininos nunca foi tão
celebrada, impulsionada por grandes mobilizações nas redes sociais. Enquanto
isso, memes e ações desconstroem princesas de contos de fadas. Mulheres do
mundo inteiro se articulam para contestar padrões caricatos de beleza e viver,
na era digital, uma nova libertação.
“Parem a loucura da beleza!”, sentencia a escritora
britânica Robin Rice num projeto difusor de imagens que simulam peças
publicitárias marcadas por um tom provocativo e irônico. “Então, se alisar o
meu cabelo, vou me dar bem na vida?”, diz uma delas, acompanhada pela foto de
uma criança com cabelo crespo. “O único relacionamento que devo ter é com a
balança?”, questiona outra, com a foto de uma mulher gorda abraçada ao
aparelho.
— A indústria estabeleceu um padrão que praticamente ninguém
pode atender. Estão usando Photoshop até mesmo nas imagens daquelas que se
dedicam a ser as mais bonitas. O que podemos dizer sobre isso? As mulheres,
independentemente de manequim, salário ou educação, têm que lutar contra
sentimentos de uma imagem corporal negativa e inadequada. Poucas conseguem
escapar — avalia Robin.
A escritora lembra que o problema se revela ainda mais grave
quando levada em consideração a forma como a realidade age sobre as crianças.
Ela lembra que muitas garotas estão sendo influenciadas pelas mães que vivem
uma baixa autoestima e “aprenderam” a conviver com a vergonha do corpo.
— Meninas em idade pré-escolar já sentem vergonha diante dos
seus colegas. Já os meninos estão apresentando problemas para criar relações
respeitosas a partir da definição do que é a beleza — observa.
Imagem da campanha “Stop the beauty madness” questiona o
alisamento de cabelos (Foto: Reprodução / Internet)
Um número crescente de ações faz barulho na internet. No
último verão do Hemisfério Norte, o Instagram foi inundado por fotografias de
garotas plus size em roupas de banho que usavam a etiqueta #fatkini, junção das
palavras gorda e biquíni. A mesma rede social abriga o perfil “@loveyourlines”
(ame suas estrias), em que duas mães começaram a reunir fotos de corpos normais.
“Somos duas mães celebrando as mulheres reais”, escreveram.
ABAIXO A DEPILAÇÃO OBRIGATÓRIA
Em terras brasileiras, um coletivo de artistas mira a
ditadura da depilação. Eles criaram o site “Pelos pelos”, em que compartilham
ensaios fotográficos que exaltam a beleza de corpos ao natural, justamente por
considerar esse um dos maiores tabus da beleza feminina aqui.
— Não quero ser considerada masculina ou desleixada só por
não me depilar. Isso, aliás, não significa não cuidar da aparência — justifica
a fotógrafa do coletivo Nubia Abe, de 28 anos.
Enquanto isso, a blogueira Jéssica Ipólito segue com o blog
“Gorda e sapatão”, que promove discussões sobre temas como racismo, opressões
sociais e defesa dos diferentes tipos de corpos. Recentemente, ela criou o
“#desafiodagorda”, em que convoca internautas a representar artisticamente o
corpo da mulher gorda. A resposta veio logo, e Jéssica tem compartilhado em seu
blog várias imagens e histórias.
— Na adolescência, minha mãe ficava me oferecendo dietas, e
eu não entendia por que tinha que fazer aquilo. A mesma coisa foi com o meu
cabelo, que, apesar de ser enrolado, passei a adolescência alisando. Só depois
comecei a refletir sobre o que estava por trás disso — ela descreve.
Uma pesquisa feita pelo Data Popular e o Instituto Patrícia
Galvão mostrou que 56% dos entrevistados, homens e mulheres, consideram que as
propagandas exibidas na TV não mostram as brasileiras reais, e 60% consideram
que as mulheres ficam frustradas quando não se veem retratadas. Mais: 51%
querem ver mais negras, e 64% pedem mais mulheres das classes populares nas
propagandas.
— A percepção dessas diferenças e da imposição de valores
sempre esteve presente entre as mulheres. A novidade é que, nos últimos anos,
as redes sociais possibilitaram a ampliação desse debate — afirma a
vice-diretora do Instituto Patrícia Galvão, Mara Vidal.
Integrante da Rede Mulher e Mídia, que articula ativistas e
organizações em defesas da mulheres, Bia Barbosa afirma que a movimentação é
importante e já surte efeitos, como a retirada de propagandas ofensivas do ar e
uma mudança de postura das empresas. Como exemplo, ela cita a redução no uso da
mulher como “atrativo” em propagandas de cervejas. Apesar disso, salienta, é
preciso muito mais:
— Esse debate ainda não chegou ao conjunto da população.
Basta chegar a uma banca e observar as capas das revistas. As pessoas continuam
criticando a Beth Faria (atriz de 73 anos) por ir à praia de biquíni.
Fonte: O Globo
Nenhum comentário:
Postar um comentário